Índios Kariri lutam por reconhecimento da tribo

Escrito por Redação ,
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Evento histórico marca a reorganização do povo Kariri, com encontro regional dos pertencentes à tribo

Crato. Pela primeira vez os índios Kariri se reúnem com estudiosos, no Crato, para debater o processo de reconhecimento, bem como a criação de uma entidade que possa defender seus interesses. Hoje está sendo debatida a definição de um estatuto para se criar uma associação. O I Encontro dos Índios Kariri foi iniciado na manhã de ontem, no Sítio Poço Dantas, distrito de Monte Alverne, situado na zona rural do município do Crato.

A pequena comunidade com cerca de 50 famílias remanescentes dos índios Kariri, povos considerados desaparecidos, passam primeiramente por um processo de auto-reconhecimento. Esse trabalho vem sendo feito a partir da descoberta da presença da comunidade de Poço Dantas por uma índia, Rose Kariri, hoje residente em São Paulo. Ela esteve recentemente na região à procura de seus familiares e a primeira providência foi ir até um cartório para verificar os registros de nascimento de pessoas com o sobrenome Kariri.

Esse processo de auto-reconhecimento não tem sido fácil, conforme o assessor técnico do Instituto Ecológico e Cultural Martins Filho (IEC), da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Regional do Cariri (Urca), Alexandre Lucas. Segundo ele, várias instituições estão envolvidas nesse trabalho, passando até pelos educadores indígenas, dentro do resgate das tradições. “Essas pessoas têm que se declarar como índios”, diz o assessor.

Em se tratando dessa aceitação, a alegria da comunidade é visível. Desde os mais velhos, a exemplo de José Kariri da Silva, de 76 anos. “Sempre soube que era índio e tenho orgulho disso”, afirma com alegria, ao falar do uso do nome do seu povo até no Shopping Cariri.

Com os estudos, a questão indígena toma corpo na região do Cariri e índios estão em processo de organização e fortalecimento de sua identidade. O objetivo dos trabalhos iniciais vem contribuir para o resgate da história e agilização do reconhecimento antropológico pela Fundação Nacional do Índios (Funai), além de discutir outras questões pertinentes a essa faixa da população, como: educação indígena, territorialidade e políticas públicas.

Sala de aula

Além dos Kariri do município, vieram os representantes indígenas de São Benedito e está sendo mantidos contatos com índios de Crateús. Na cidade do Crato já existe uma sala de aula indígena. Recentemente os índios estiveram participando do III Encontro dos Índios Kariri, na Aldeia Carnaúba, em São Benedito, além de participar da audiência pública realizada na Assembléia Legislativa do Ceará, em Fortaleza, no dia 26 do mês passado.

O trabalho de assessoria pedagógica está sendo prestado por meio da universidade. A Secretaria de Educação do Município mantém a sala de aula indígena com fornecimento de material e pagamento da professora. Os Kariri ainda contam com o apoio da Secretaria de Cultura, Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Casa Lilás, Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher Cratense, Rede Educação Cidadã (Recid) e também da Associação Cristã de Base (ACB).

Identificação da comunidade

Para Alexandre Lucas, o importante dentro de todo esse trabalho é manter uma respeitabilidade aos índios, para que não haja exploração da imagem do povo. “No Brasil existem políticas públicas direcionadas aos povos indígenas, e esses direitos, a partir do reconhecimento, o povo Kariri terá”, diz o assessor, ao salientar a importância dos trabalhos desenvolvidos em torno do processo de identificação da comunidade. Tanto que Elias Kariri diz que agora as pessoas residentes nas proximidades de Poço Dantas também acham que são da mesma etnia. Neguim Tapuia Kariri, de São Benedito, também participa do encontro. Ele afirma que, em seu município, antes a própria população tinha dificuldade de aceitar o seu povo. Hoje, as pessoas vêem com naturalidade. Ele é da Aldeia Carnaúba II e destaca a necessidade de ter seus direitos respeitados.

No seu município, localizado na zona norte do Estado, são 32 famílias de índios Kariri que também aguardam o reconhecimento da Funai.

O que eles pensam
Indígenas são remanescentes na região

'O processo de reconhecimento dos índios no Cariri é muito importante. A idéia estabelecida pelos poderes, principalmente com a imposição dos europeus, é que os índios no Nordeste deixaram de existir desde o século XIX e o aparecimento desses povos remanescentes, mesmo miscigenados, é uma prova do resgate dessa cultura. Os índios Kariri tinham uma língua própria, que não era o tupi, e sim um dialeto travado, daí o preconceito. Os povos indígenas estão reivindicando o que lhes foi tirado.'
Aline Brussons
Pesquisadora da Língua Portuguesa

'Estou vendo esse reconhecimento como uma forma de valorização do meu povo. É necessário para os benefícios chegarem na comunidade de Poço Dantas, onde há muitas famílias de índios. Minha tia, Nilza Kariri, 72anos, é uma das mais antigas. Ela sempre falava muito dos nossos costumes. Somos Kariri através do meu pai. Estamos resgatando a cultura para o reconhecimento agora. Então, tem muita gente agora que quer ser índio Kariri.'
Elias Kariri da Silva
Índio

Elizângela Santos
Repórter

Mais informações:
Instituto Ecológico e Cultural Martins Filho (IEC)
Cel. Antônio Luis, 1161, bairro Pimenta, Crato
(88) 3102.1200