Votações polêmicas do Governo na Assembleia deixam arestas

Reforma da Previdência gerou momento de tensão entre deputados aliados do governador Camilo Santana, rendendo votos contrários de alguns. Apesar das divergências, interlocutores veem saldo positivo na relação com a base

Escrito por Letícia Lima , leticia.lima@svm.com.br
Legenda: Sessão da Assembleia para a votação final da Previdência estadual, na última quinta-feira
Foto: Foto: José Leomar

A ampla base aliada do governador Camilo Santana (PT) na Assembleia Legislativa, formada por 38 dos 46 deputados estaduais, de diferentes posicionamentos ideológicos e interesses, entrou em choque em algumas votações ao longo deste ano. A reforma da Previdência estadual, aprovada na semana passada, trouxe à tona divergências internas e deixou arestas. Apesar dos conflitos, a avaliação de governistas é de que a base permanece sólida.

O fato é que o apoio da base foi colocado à prova na votação da Previdência estadual que, em geral, é um tema amargo e gera desgaste perante o eleitorado. Os partidos, principalmente PT e PCdoB, foram os mais questionados, em razão de suas bandeiras e posicionamentos críticos à reforma previdenciária que foi aprovada no Congresso.

Divergências

A militância dessas siglas não poupou as bancadas de representantes na Assembleia da pressão para votarem contra. Augusta Brito (PCdoB), por exemplo, foi praticamente emparedada pelas bases partidárias, no entanto, após emendas - mudanças no texto - articuladas com o governo estadual, ela acabou votando favorável.

Já o colega de bancada, deputado Carlos Felipe, foi crítico da reforma da Previdência desde que chegou à Casa e votou contra as propostas em Plenário. Nos bastidores, deputados da base taxaram a posição do parlamentar como "política", afinal, dizem alguns, todos que estão no "grupo" sofreram com o "ônus" da votação.

Carlos Felipe, inclusive, fez um discurso "emocionado", na tribuna da Assembleia, durante a votação, anunciando que não iria mais se candidatar ao cargo. Ele sabe da chateação dos colegas. Era visível o desgaste na base.

"Eu acho que se tivesse tido um diálogo melhor... O Governo arca com um desgaste muito grande e sua base. Acho que muitos deputados se esforçaram para tentar melhorar, mas houve desgaste".

A bancada do PT também não escapou da pressão. Uma semana antes da votação, no evento de posse do novo diretório municipal de Fortaleza, com a presença da presidente nacional, Gleisi Hoffmann, apoiadores protestaram contra a reforma e contra Camilo, que é do Partido dos Trabalhadores. Uma corrente nacional do partido endossou as críticas ao governador.

Vira página

Em meio às contradições, petistas retiraram apoio ao pedido de urgência na tramitação de uma das propostas e votaram contra esse pedido para outra. A postura também foi mal vista por aliados da base, que deram "a cara a bater". Mas, no Plenário, os deputados do PT acabaram votando a favor, alegando que, em conjunto com a base, aprovaram emendas para suavizar as regras.

Mesmo assim, a bancada petista evitou falar sobre o assunto, publicamente, e alguns não esconderam nos bastidores que queriam "virar essa página". Elmano de Freitas, líder do PT na Assembleia, disse que o debate será feito com as bases sobre o posicionamento, mas não vê prejuízos para a legenda.

"Ao contrário, a base política do governador se mostrou muito sólida, em um tema muito adverso, diria inclusive, várias questões envolvem constrangimento, mesmo assim a base foi muito leal ao Governo e ao mesmo tempo altiva no sentido de lutar pelas mudanças, mas foi muito solidária".

Ciente das dificuldades com apoiadores e partidos, o governador Camilo atuou, nas vésperas da votação, ligando para, pelo menos, sete deputados. Ele agradeceu ao trabalho dos aliados e reforçou o empenho da equipe econômica em aprovar mudanças sugeridas por eles.

Constrangimento

No entanto, essas divergências provocam questionamentos internos. Dra. Silvana (PL) criticou votos contrários "do grupo". "Uma coisa é motivo ideológico, outra coisa é você pegar uma bandeira que durante o seu mandato não é sua. Acho falta de ética com o seu grupo, porque a Previdência se não fosse votada ia falir", disse, em referência ao voto de Felipe.

Silvana, é bom lembrar, estava no Plenário durante votação do pedido de urgência em uma das propostas da Previdência e não votou. A mudança nas aposentadorias foi o projeto do Governo do Estado que, neste ano, mais constrangeu a base. Além de Carlos Felipe, David Durand (Republicanos) votou contra a reforma.

Mas teve outros momentos ao longo do ano que projetos de lei, desta vez, apresentados por parlamentares, dividiram a base. Entre eles o projeto de autoria de Elmano, que queria incluir a Parada pela Diversidade Sexual no calendário de eventos do Estado, e outro, de Silvana, para conceder o título de cidadã cearense à ministra da Mulher, Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves.

Os dois projetos envolviam "pauta de costumes" e colocaram em lados opostos deputados do grupo governista, de vertente conservadora e ligados a partidos de esquerda. Outro embate travado na base aliada foi durante a tramitação de um projeto de lei assinado pela bancada do PT, que punia atos de discriminação religiosa.

Saldo final

A bancada religiosa da Casa classificou a iniciativa como "perseguição religiosa". Nessa queda de braço, os parlamentares chegaram a um acordo e os petistas retiraram o projeto. Em outros momentos, entretanto, o Governo teve que entrar em cena para tentar conciliar os interesses dos membros da base.

"O posicionamento da nossa liderança é sempre tentar amenizar as tensões e liberando a bancada. A nossa bancada é muito grande então nós temos que respeitar o limite até onde cada parlamentar pode ir. Buscamos o diálogo e tentando deixar a base alinhada, levando suas demandas ao Poder Executivo".

Entre uma e outra polêmica, o saldo final, avalia o assessor de Relações Institucionais do Estado, Nelson Martins, um dos responsáveis pela articulação política do Governo, é positivo. "Aprovamos de 2015 a 2019, na Assembleia, 605 mensagens. Todas com ampla maioria. Às vezes, acontece uma divergência ou outra é natural, não tem problema nisso. O que nós temos é muito o que agradecer e reconhecer a grande contribuição que a base aliada tem dado ao Governo. Não temos nada o que reclamar".

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