Coronavírus: Deputados analisam projeto que reduz mensalidade em instituições privadas de ensino

Em momento de pandemia e paralisação das aulas no Ceará, responsáveis por alunos pedem a revisão dos contratos com as instituições de ensino

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(Atualizado às 12:41, em 24 de Abril de 2020)
Legenda: A comissão vai se reunir por videoconferência
Foto: Foto: José Leomar

A Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Assembleia Legislativa do Ceará deve discutir e votar, nesta sexta-feira (24), projeto que prevê a redução do valor das mensalidades em instituições de ensino no Estado. A autoria da matéria é do deputado Nezinho Farias (PDT) com a participação de vários parlamentares. Se aprovada, a expectativa é de que ela vá a plenário na próxima semana.

A movimentação dos deputados ocorre em meio à demanda de pais e mães de alunos que enfrentam dificuldades para manter o pagamento das mensalidades em cenário de pandemia. Muitos deles, segundo parlamentares, perderam os empregos ou tiveram os salários reduzidos. A pauta atinge, além dos contratos do ensino infantil, fundamental e médio, o ensino superior. As aulas estão suspensas há mais de 30 dias.

De acordo com o líder do Governo, deputado Júlio César Filho (Cidadania), que é um dos autores da proposta, a matéria é baseada no direito do consumidor. Ele explica que "a partir do momento que o serviço é suspenso (por consequência da covid-19), o consumidor não pode pagar o mesmo valor de quando ele tava funcionando". O projeto foi apresentado às instituições de ensino privado através de representantes em reunião.

O Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon), órgão do Ministério Público do Ceará, emitiu recomendação pedindo que instituições e clientes entrem em um acordo. O órgão sugere a manutenção das aulas, mesmo que à distância, e uma revisão nos valores dos contratos.

Escalonamento

O texto que os deputados estão definindo envolve uma proposta de escalonamento no percentual de redução dos valores. O ensino infantil deverá receber a maior parcela de desconto. 

De acordo com o deputado Marcos Sobreira (PDT), um dos coautores da proposta, a intenção do legislativo é buscar justiça em meio a um cenário de incertezas.

"A gente busca conceder desconto nas mensalidades das escolas particulares, de uma forma que não prejudique a unidade escolar, mas que corresponda aos anseios dos consumidores. Não é justo que o consumidor pague o valor integral", argumentou o parlamentar.

Segundo o deputado, nos casos em que o aluno já tem desconto da instituição, deve prevalecer o maior percentual em comparação ao que for definido em lei. No nível superior, quando existe a possibilidade de ensino à distância, ou seja, com menos perdas em relação ao calendário, o desconto deverá ser o menor entre os outros níveis de ensino.

Reclamações

Em ofícios encaminhados às direções de escolas na Capital, responsáveis por alunos pedem a revisão em até 50% nos valores pagos mensalmente. A principal queixa é a queda nos rendimentos nesse momento de pandemia e isolamento social.

"Nesse período, os custos da instituição de ensino reduzem substancialmente, vez que não haverá a utilização dos espaços comuns pelos alunos, tais como, salas de aula, biblioteca, laboratório, quadras, auditórios, e de toda a infraestrutura de pessoal e apoio que regularmente teriam, impactando na diminuição dos gastos escolares, redução esta que, equitativamente, deverá ser repassada na mensalidade escolar", diz um trecho de uma carta encaminhada a uma escola de Fortaleza.

Em outro registro, assinado por mães e pais a outra instituição privada, as reclamações também pedem maior transparência e comunicação entre as partes. "O que queremos é, de fato, uma postura de empatia e de solidariedade para com todos nesse momento tão delicado. Ficar em silêncio não é algo que nós como clientes desejamos ver da instituição educacional que nos ajuda no direcionamento da educação dos nossos filhos", reforça o ofício.

Crise

De acordo com o deputado Julio César, "não se justifica as instituições usarem o projeto como motivo ou desculpa de querer demitir o funcionário". Ele defende a possibilidade de compensação "com aquilo que ela (instituição) está deixando de gastar com a interrupção das atividades, como conta de luz, insumos, alimentação dos servidores... Fora os incentivos que as empresas estão recebendo do Governo Federal".

O líder do Governo cita ainda a suspensão do pagamento do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) às escolas de pequeno porte no Ceará. "Estamos tentando fazer uma justiça com a falta do serviço", reforça. 

Ensino privado

Em entrevista ao Diário do Nordeste, nesta sexta-feira (24), o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Ceará (Sinepe-CE) argumentou que o projeto discutido pela Assembleia Legislativa é inconstitucional e que não deve receber o aval da Comissão de Constituição e Justiça da Casa. 

Segundo o professor, em reuniões com deputados nos últimos dias, foram feitas sugestões para a crise, como, por exemplo, análise de situações individuais e concessão de descontos às famílias mais vulneráveis financeiramente, e que foram as mais atingidas com o cenário de pandemia.

De acordo com o presidente da entidade, o sindicato já incentiva as escolas a atender às famílias nessa situação. "Estamos olhando caso a caso. Boa parte das escolas está com aulas remotas, ninguém foi demitido, as despesas são as mesmas. As escolas já começaram a atender caso a caso as famílias mais agravadas na sua renda", disse.

Segundo Airton, mesmo com o texto do projeto "inconstitucional", a entidade tentou fazer sugestões à matéria que tramita na Assembleia, mas, segundo ele, a contribuição foi ignorada pelos parlamentares. "Fomos enganados. O sentimento da nossa categoria é que esse tempo todo (de discussão e reuniões) fomos feitos de bobos. O texto que tem lá não tem nada do que nós discutimos", criticou.

O sindicado cobrou ainda a redução de impostos para a categoria por parte do Governo do Estado. Ele argumenta que muitas unidades se endividaram para o ano que vem em razão da pandemia e da queda na receita também por conta do aumento no número de inadimplentes.

Discussão nacional

Além do Ceará, pelo menos oito unidades da Federação estão discutindo ou já aprovaram matérias com conteúdo similar ao que está sendo proposto na Assembleia. É o caso de Minas Gerais, Rio de Janeiro (aprovada na CCJ), Distrito Federal (aprovado), Pernambuco, Paraná, São Paulo (aprovada na CCJ), Pará (aprovado) e Paraíba.