Vaqueiras ganham mais espaço em vaquejadas

Tradicionalmente praticado por homens, o esporte ganha adesão de mulheres - mesmo que a contragosto

Escrito por Nícolas Paulino - Repórter ,
Legenda: Na 2ª Vaquejada do Complexo Franskim Pedro, que ocorreu nesse fim de semana, 10% dos participantes, como Thaynar, eram mulheres
Foto: Foto: Kleber A. Gonçalves

Sob as pernas, um amontoado de músculos e pelos de meia tonelada respira forte, ansioso pela corrida. Nos fundos da arena, uma portinhola se abre liberando as rápidas pernadas bovinas. As esporas das botas atiçam, na pele dos cavalos, a perseguição na terra fofa permeada de sulcos deixados pelas ferraduras. À frente, duas linhas brancas de cal se aproximam: é tempo de agarrar a cauda do bicho e tentar projetá-lo ao chão. Dos alto-falantes, um "Valeu boi" ou "Zero" marcam a performance do montador - ou da montadora, figura que tem se tornado mais comuns em campeonatos amadores e profissionais de vaquejada.

A força do braço para derrubar o boi - cultivado com muita malhação - em nada deixa a dever a um homem, diz a vaqueira Marina Pereira, 31, natural de Redenção. Ela foi uma 90 das mulheres (cerca de 10% dos competidores) a se inscreverem na 2ª Vaquejada do Complexo Franskim Pedro, que ocorreu no fim de semana, em Maranguape. Cerca de 70 mil pessoas passaram pela atração durante quatro dias, segundo a organização.

Investidas

Dos eventos, Marina sempre entendeu; afinal, passou dez anos acompanhando as investidas do marido, também vaqueiro, nos parques de vaquejada. "Um dia, decidi parar de ficar apenas dormindo no caminhão e aprender também", sorri com a pele curtida de sol.

"É uma coisa que tá no sangue mesmo. Nos treinos, eu nem derrubo boi, mas quando chego aqui, bate um negócio em mim e 'pá!'", descreve.

Outra vaqueira a por o talento à prova é a "princesa" (título concedido por votação após desfile) Thaynar Carvalho, 22, cujos olhos verdes refletem a obstinação de quem encarou o próprio pai para fazer valer sua vontade. "No começo, ele dizia que eu podia me acidentar. Hoje, não tem torcida maior", afirma.

As "corridas de boi" ela intercala com a rotina pesada de estudante de Medicina Veterinária, que só dá trégua em alguns fins de semana - momentos de fazer o que gosta, mas, também, de escutar piadinhas como "lugar de mulher é na beira do fogão", "vai pra casa" ou "tem logo um menino pra ver se se aquieta".

A resposta, Thaynar tem na ponta da língua: "A gente mostra no 'Valeu boi' que a gente pode tanto quanto eles", confessa a bicampeã feminina da Vaquejada de Itapebussu.

Prêmios

"Temos a maior premiação oferecida à categoria feminina no Ceará, que é de R$10 mil", destaca o diretor de provas e organizador do evento, Teógenes do Amanari, enfatizando o incentivo à participação das mulheres nas disputas. A terceira edição da Vaquejada, inclusive, já está marcada para o mês de outubro, com premiações totais de R$350 mil.

Quem deve encarar a competição (assim como fez na segunda) é o vaqueiro Carlinhos Timóteo, do Haras Tavares, de Croatá. Ele dedica cerca de 25 fins de semana por ano para competir, vivendo num trailer-casa com outros vaqueiros e tratadores.

Ao contrário de Marina Pereira, a mãe dele não aprendeu a montar e a correr boi, mas a conviver com a ausência dos homens da família, habituados a dois dias em casa e ao resto da semana na estrada, rumo aos novos campeonatos. "O que faço é por amor", sintetiza Carlinhos.

Enquete

Do que você mais gosta nas vaquejadas?

"A vaquejada é um esporte que eu também pratico, eu corro e gosto muito. Tem muita adrenalina envolvida. Fora que, na arquibancada, eu fico observando o que os outros vaqueiros estão fazendo. Então, é que nem futebol. Você entendendo, fica mais fácil".

Roberto Chaves. Comerciante

"Pra mim, é uma coisa de sangue: meu pai corre e eu corro também. Muitas mulheres estão seguindo os pais e namorados, mas também estão criando coragem. Hoje em dia, nós estamos tomando novos espaços em muita coisa, não só na vaquejada".

Tássia Amorim. Microempresária