Pioneiro em Terapia Comunitária Integrativa, Projeto 4 Varas completa 30 anos
Há 30 anos, o projeto auxilia população na cura do sofrimento e no resgate da autoestima
Escrito por
Redação
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Dores ocultas, perdas não superadas. Tristezas até então guardadas no coração. Foi envolto a estes e tantos outros sofrimentos, num cenário onde a violência e a falta de políticas públicas denotavam insegurança e precariedade, que nasceu a Comunidade 4 Varas, no Pirambu. Foi naquele dezembro de 1987, sob o frescor de um cajueiro, que começaram as Terapias Comunitárias Integrativas, e o sofrimento que parecia não ter solução, deu espaço para a cura e o resgate da autoestima.
Essa história teve início quando Airton Barreto, advogado sensível aos Direitos Humanos, oferecia atendimento jurídico a trabalhadores recém-demitidos de uma antiga fábrica que havia fechado as portas por motivos de falência. Por não receberem indenização, os funcionários saquearam a fábrica e resolveram ainda somar forças para, juntos, reivindicarem os direitos que deveriam ser assegurados. Nesse contexto, Airton Barreto assumiu a causa com o objetivo de ajudar essas pessoas desamparadas pela lei.
Ao vê-los reunidos embaixo do cajueiro, lugar onde a categoria passou a frequentar constantemente em busca de garantias trabalhistas, o padre francês Henri Marie Le Boursicaud, morto há 15 dias, sugeriu um nome para aquele movimento: Comunidade 4 Varas. Em paralelo, muitos outros nomes disputavam levar o título, mas foi a proposta do religioso que levantou os aplausos de quem estava presente no local. Isso porque, após indicar o nome que simbolizaria a luta e a união daqueles trabalhadores, o Padre justificou a escolha.
À época, ele contou que um senhor com idade avançada, já bem perto de morrer, reuniu os quatro filhos e pediu para que cada um deles pegasse uma vara e a quebrassem posteriormente. Com facilidade, todos tiveram êxito no que o pai havia proposto. Em seguida, o homem juntou as quatro varas e também fez o mesmo pedido, mas nenhum deles conseguiu quebrar. A lição dessa tarefa, conforme o padre, era a de que, se os irmãos continuassem unidos, ninguém os venceria.
Método
No momento em que prestava atendimento aos funcionários, o advogado percebeu o sofrimento pelo olhar e pelas palavras ditas ou retraídas. Segundo a coordenadora de gestão da Comunidade 4 Varas, Cristina Alencar, eram “doenças da alma”. “Eles relatavam medo de andar de ônibus, insônia, estresse e muitas outras coisas. Doutor Airton viu que não eram patologias, e sim, doenças da alma”, explica. A partir de então, o advogado encaminhou os casos para o irmão, Adalberto Barreto, professor, médico e psiquiatra, que começou a atender os moradores com alunos de medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Numa perspectiva humanizada, onde o uso de medicações para o tratamento é deixado em segundo plano, Adalberto Barreto instituiu o método de Terapia Comunitária Integrativa. “Esse método ajuda as pessoas a superarem os problemas sem ser necessário medicalizar com psicotrópicos. O projeto ajuda na medida em que oferece um espaço para acolher esta dor da alma por conta dos conflitos e da crise”, explica o psiquiatra.
Popularmente, o projeto leva o nome de 4 Varas, mas também atende por Movimento Integrado de Saúde Mental Comunitária (MISMEC-CE). Quem procura o serviço, é submetido a massagens anti-estresse, yoga, quiropraxia, acupuntura e participa de atividades de resgate da autoestima. Juntas, estas práticas tornam o método um espaço de cura e partilha.
Cura
O sucesso da Comunidade pode ser aferido pelos números contabilizados: em 30 anos de existência, mais de 2 milhões de atendimentos já foram realizados. Mesmo em tratamento, a design de moda francesa Sophie Devoine, 20, comemora os resultados. “Quando eu fiz a terapia, eu meio que me libertei, porque entendi que o que acontecia comigo eram problemas de outras pessoas, e não um problema meu. Então ela me ajudou muito a descobrir quem eu sou e porque eu estou aqui. Agora eu estou muito agradecida, estou muito feliz de estar aqui”.
Pelas mãos da massoterapeuta Lili Freitas, muitas dores da alma já foram saradas. O que era escuridão, tornou-se luz. Alívio para uns, gratidão para outros. Contudo, a especialista explica que o motivo para tantos resultados positivos está na força de cada um dos pacientes que trazem para si, a vontade de superar o problema. “O meu trabalho é todo voltado para energia. É o tocar, é o abraçar, é o olhar no olho. Eu sempre digo que eles podem contar comigo para tudo”, revela, emocionada.
Serviço
Fora do projeto 4 Varas, o Movimento Integrado de Saúde Mental Comunitária promove, nesta terça-feira (30), um Ciclo de Palestras com o tema “Dialogando com meus órgãos”. Conforme Adalberto Barreto, “será uma oportunidade para que as pessoas acometidas destas enfermidades possam receber informações importantes de como elas podem ajudar psiquicamente seu tratamento”.
Local: Espaço Conceito Engexata (Rua Antônio Justa, 2732 - Meireles)
Horário: 19h30
Inscrições: (85) 99624.1373
Valor: R$80