Justiça manda PF prender gestores do meio ambiente
Secretários do Estado e Município e servidores do Ibama são acusados de conceder licenças ambientais irregulares
A Polícia Federal deflagrou, na manhã de ontem, em Fortaleza e São Paulo, simultaneamente, a ´Operação Marambaia´, com o objetivo de combater irregularidades na concessão de licenças ambientais, por parte de órgãos municipais, estaduais e federais, em benefício de grupos empresariais do ramo de imóveis.
Quatro mandados de prisão temporária e outros 14 de busca e apreensão foram cumpridos pelos ´federais´, resultando na prisão da secretária municipal de Meio Ambiente , arquiteta Daniela Valente Martins; do superintendente do Ibama no Ceará, Raimundo Bonfim Braga, mais conhecido como ´Kamundo´; do titular da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), Herbert Vasconcelos Rocha; e do chefe do escritório do Ibama, em Aracati, Antônio César Rebouças.
Todos, com exceção do superintendente do Ibama, foram presos em Fortaleza. Raimundo Bonfim foi detido em São Paulo, na noite de terça-feira. Segundo nota divulgada no fim da manhã, pela PF, os quatro presos, e outras pessoas indiciadas, estão sendo investigados pelos crimes de tráfico de influência, prevaricação, corrupção ativa e passiva, violação do sigilo funcional, além de crimes ambientais.
As prisões em Fortaleza aconteceram no começo da manhã. Os mandados foram expedidos pela 11ª Vara da Justiça Federal, que também determinou o imediato afastamento do cargo dos servidores do Ibama investigados. Desde as cinco horas, 80 policiais federais - sob o comando do delegado federal Cláudio Joventino - foram mobilizados para cumprir os mandados de prisão e de busca e apreensão, na Capital, Região Metropolitana e no Interior. Muitos documentos foram recolhidos nos órgãos ambientais e nas sedes de construtoras e imobiliárias.
Durante toda a manhã, diversas autoridades municipais e estaduais estiveram na Superintendência da PF, entre elas, o procurador geral do Município, Martônio Mont´Alverne. “A secretária Daniela Valente desenvolve um trabalho sobre o qual não paira nenhuma suspeita”, declarou Martônio.
DECISÃO
À noite, juiz manda soltar secretária e superintendente
Por volta das 22 horas, a secretária Daniela Valente (Semam) e o superintendente Herbert Vasconcelos Rocha (Semace) foram libertados. O pedido de habeas corpus foi acatado pelo juiz substituto da 11ª Vara da Justiça Federal, Ricardo Ribeiro Campos, permanecendo na sede da PF somente o chefe do escritório de fiscalização do Ibama, em Aracati, Antônio César Rebouças.
O advogado de Rebouças, Leandro Vasques, informou ao Diário do Nordeste que seu cliente poderá também ser liberado ainda hoje. Para tanto, ele já havia redigido o pedido de habeas corpus.
Leandro Vasques criticou a prisão das quatro pessoas. “O sentimento que todos os advogados tiveram é de que as prisões foram absolutamente desnecessárias, traumatizantes e drásticas.”
Acareação
Para o advogado, a Polícia Federal poderia ter utilizado outros mecanismos legais se o objetivo dela era tão somente confrontar os depoimentos e versões dos investigados. “Poderia ser convocada uma acareação simultânea, entre todos os investigados, para que suas versões fossem analisadas e possíveis contradições ou conflitos esclarecidos. Todas as pessoas presas são primárias, de bons antecedentes, têm residência fixa e ocupações definidas. Não precisava terem sido submetidas a este terrorismo, de serem arrancadas de casa, na presença de suas famílias, para prestar esclarecimentos”, lamentou.
PROTAGONISTAS
Autoridades detidas na operação
Herbert Vasconcelos Rocha
Gestor da Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Estado (Semace), foi detido em sua residência e levado para a sede da PF, sob a acusação de vários delitos, entre eles, prevaricação e tráfico de influência
Daniela Valente Martins
Titular da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Semam), é investigada sob suspeita de conceder licenças ambientais irregulares para empreendimentos na orla marítima de Fortaleza, especialmente na Praia do Futuro
Raimundo Bonfim Braga
Superintendente do Ibama no Ceará, foi detido pela PF, ainda na noite de terça-feira passada, no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. É acusado de diversos crimes, como prevaricação, corrupção e tráfico de influência
FAVORECIMENTO
Licenças para grupos locais e estrangeiros
Conforme a Polícia Federal, as concessões irregulares de licenças ambientais favoreciam empreendimentos de grupos nacionais e estrangeiros na Praia do Futuro (em Fortaleza), Pecém (em São Gonçalo do Amarante), Cumbuco (Caucaia), Aracati, Guaramiranga e, ainda, no Município de Crateús.
Em entrevista na sede da Polícia Federal, para detalhar a ´Operação Marambaia´, o superintendente da instituição, delegado Aldair da Rocha, disse não ter dúvidas dos crimes cometidos pelos acusados e confirmou que a apuração incluiu interceptação e quebra de sigilo telefônico.
Rocha revelou que as investigações foram iniciadas em maio passado, a partir de denúncias de fraudes no escritório do Ibama, em Aracati. “Com o aprofundamento do trabalho, a PF descobriu o conluio dos agentes públicos do meio ambiente das três esferas de governo no Ceará”, afirmou.
Na semana passada, a PF decidiu encaminhar à Justiça Federal os pedidos de prisão e buscas para colher as provas julgadas necessárias contra a ´cúpula ambiental´ no Estado.
Segundo relato do superintendente da PF, o primeiro a ser preso foi o chefe estadual do Ibama, Raimundo Bonfim Braga. Ele foi apanhado, ainda na terça-feira, por agentes da PF, no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, quando se preparava para retornar a Fortaleza.
Ficou solto
Raimundo Braga deveria chegar ainda na noite de ontem a Fortaleza, sob escolta de agentes da PF. Na manhã de ontem, 80 agentes prenderam, em suas casas, o titular da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), Herbert Rocha; a titular da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semam), Daniela Valente; e o chefe do escritório do Ibama em Aracati (litoral Leste), Antônio César Rebouças.
Até a noite passada, a movimentação de agentes e peritos era intensa na Superintendência da PF, no Bairro de Fátima. A prisão temporária era de cinco dias, mas à noite, dois dos acusados foram liberados por ordem da Justiça.
Apesar da insistência dos jornalistas presentes na entrevista coletiva, o superintendente da PF não revelou os nomes de outras pessoas que estão sendo investigadas e que deverão também ser indiciadas.
Aldair também não citou os nomes de empresas e empreendimentos imobiliários investigados. Ainda assim, vários nomes foram especulados nos corredores da PF, mas nenhum confirmado na coletiva.
BUSCA E APREENSÃO
Funcionários silenciam sobre a ação policial
A movimentação dos policiais federais que participaram da ´Operação Marambaia´, na Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Semam) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) aconteceu entre seis e oito horas, conforme servidores do órgãos
Uma viatura da Polícia Federal, um veículo Vectra, permaneceu parado no estacionamento da Semace, na Rua Jaime Benévolo, até por volta das 10h30. Nos três órgãos, no entanto, reinou o silêncio absoluto. Aparentemente, o expediente seguiu normalmente.
No Ibama, uma assessora identificada como Talita disse que não sabia informações sobre as pessoas presas ou objetos apreendidos. Na recepção da Semam, a mesma situação se repetiu. Já na Semace, a assessoria de imprensa do órgão disse que as informações seriam repassadas pela coordenadoria de imprensa do Governo.
Os agentes federais chegaram no Ibama, na Avenida Visconde do Rio Branco, por volta das 6 horas, conforme o frentista do posto de combustível vizinho. Segundo o frentista, não houve tumulto e no local estavam apenas as viaturas. Na Semace, cuja sede está na Rua Jaime Benévolo, os comerciantes do entorno também disseram que os policiais federais chegaram às 6 horas, mas também sem tumultos.
Na Semam, a reportagem apurou que o mesmo quadro dos outros órgãos se repetiu, mas nenhum funcionário quis comentar como ocorrera a abordagem dos policiais federais, nem revelar o que eles haviam apreendido ali.
Nathália Lobo / Paola Vasconcelos
Repórteres