Ex-PM do Ceará acusado de homicídio e inocentado deve ser reintegrado à corporação, decide Justiça
O Estado chegou a recorrer alegando independência da instância administrativa
O juiz da Vara da Auditoria Militar do Ceará decidiu que o ex-policial militar Francisco Antônio Martins Militão seja reintegrado com urgência aos quadros da Polícia Militar do Ceará (PMCE). Francisco foi excluído da Corporação em 2012, enquanto estava sob acusação de um crime de homicídio.
Em 2018, Militão foi inocentado na esfera criminal pelo assassinato ocorrido em julho de 2011, em Paraipaba, tendo como vítima Francisco Carlos Cunha Rodrigues. No entanto, em 2012 o então agente da Segurança Pública do Ceará foi demitido, após o fim do Processo Administrativo Disciplinar (PAD), que decidiu que o "autor é culpado das acusações e está incapacitado de permanecer nas fileiras da corporação".
A defesa do ex-PM entrou com pedido de reintegração na Justiça do Ceará. De acordo com decisão recente publicada no Diário da Justiça Eletrônico (DJE) dessa segunda-feira (9), Militão deve ser reintegrado no prazo de até 15 dias à PMCE, "na mesma situação da época da exclusão".
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Consta na sentença que caso o Estado não cumpra com a decisão judicial, pode ficar sob pena de multa diária no valor de R$ 500, por dia de descumprimento, limitados a 60 dias.
O advogado do ex-PM, Leonardo Feitosa Arrais, diz ter recebido a decisão determinando a reintegração “com naturalidade e senso de dever cumprido”.
“A justiça foi restabelecida por completo, primeiro com a absolvição por ausência de autoria perante conselho de sentença do tribunal do júri, e agora com a sua reintegração aos quadros da Polícia Militar do Estado do Ceará na mesma situação da época da exclusão. Durante todo esse tempo de processo restou prejudicado um militar exemplar que carregou a pecha de militar demitido, dificultando sua vida no seio da sociedade por aproximadamente 14 anos”, disse o advogado.
Militão negou ter participado do crime e disse que na data do homicídio estava lotado em outra cidade do Ceará. Os jurados decidiram pela absolvição “por negativa de autoria”.
Romildo Ferreira Pessoa é o segundo acusado pelo homicídio de Francisco Carlos. Ele alega ter agido em legítima defesa. O júri segue pendente.
ESTADO RECORREU
O Estado do Ceará defendeu a prescrição "de fundo de direito" afirmando que o autor foi demitido em agosto de 2012 e que, assim, "a presente demanda se encontra devidamente prescrita, pois só poderia ter sido veiculada dentro do prazo de cinco anos, contado do ato de administrativo e a presente ação só foi ajuizada em 10/09/2018, logo, a pretensão de reintegração aos quadros da Polícia Militar do Estado do Ceará está prescrita".
"O Estado relatou ainda sobre a independência da instância administrativa e da ausência em trânsito em julgado da sentença. Afirmando que, em relação ao argumento do requerente sobre a absolvição pelo tribunal do Júri, mesmo se tratando de prática de crime funcional, cuja figura delitiva eventualmente esteja delineada no estatuto administrativo como infração, não está a administração obrigada a aguardar o desfecho do processo penal que o acusado eventualmente respondesse".
O Ministério Público do Ceará (MPCE) se manifestou pela procedência do pedido da defesa e disse entender que seria incompatível e incoerente que a instância administrativa chegue a um resultado diferente da esfera penal.
De acordo com o juiz Roberto Soares Bulcão Coutinho, este caso não é de prescrição, "pois como bem ressaltou o autor, estamos defronte de um fato novo, ou seja, a absolvição criminal, havendo a necessidade de analisar a incidência da decisão criminal perante a situação funcional do autor".
"Vale destacar que há possibilidades no direito brasileiro de reflexo da decisão criminal em âmbito administrativo. Logo, é de entendimento geral que tal situação deve ser analisada pelo poder judiciário. Com isso, afasto a incidência da prescrição no presente caso, pois o lapso se inicia com o trânsito em julgado da sentença criminal"
O magistrado acrescenta que a independência das instâncias não é absoluta, repercutindo na decisão administrativa "o reconhecimento da esfera penal de negativa de autoria, não ocorrência do fato e excludentes de ilicitudes".