Como funcionava o esquema de manipulação de apostas esportivas que teve jovens presos em Fortaleza
Suposta organização criminosa movimenta milhares de reais e reúne dezenas de pessoas no Brasil. A defesa dos presos rebate a prisão em flagrante e a decretação da prisão preventiva
A prisão em flagrante de quatro jovens, no bairro Meireles, em Fortaleza, na última quarta-feira (18), revelou à Polícia um suposto esquema criminoso de manipulação de apostas esportivas, que movimenta milhares de reais e reúne dezenas de pessoas no Brasil. A Justiça Estadual decretou a prisão preventiva do grupo, na quinta (19).
Conforme documentos obtidos pelo Diário do Nordeste, uma equipe do Batalhão de Policiamento Turístico (BPTUR), da Polícia Militar do Ceará (PMCE), se deslocou para um posto de combustíveis, localizado entre a Avenida Abolição e a Rua Osvaldo Cruz, para apurar uma denúncia de que um grupo se encontrava no local para manipular maquinetas de cartão e sacar valores no caixa eletrônico, com frequência.
Ao chegar no local, os policiais viram seis jovens. Dois deles fugiram em motocicletas. Mas quatro, que estavam em um carro, foram abordados e flagrados na posse de uma maquineta de cartões, um cartão de crédito no nome de outra pessoa, dinheiro e blocos de anotações. A composição policial deu voz de prisão aos irmãos Abimael Lucas Bastos Pina, de 23 anos, e Felipe Cauã Bastos Pina, 19, além de Carlos Eduardo Nogueira Feitosa, 19, e Kayron Victor Maciel Lopes, também 19.
Os suspeitos confessaram, em depoimento prestado no 2º Distrito Policial (2º DP), da Polícia Civil do Ceará (PC-CE), que integram um grupo que obtém dinheiro a partir de apostas em resultados esportivos, os quais eles sabem previamente, antes das partidas. Sem especificar, disseram que são jogos de vários esportes, que ocorrem no Brasil e em outros países.
Os cearenses receberiam ordens de um homem que mora no Rio de Janeiro e captavam "clientes" que também quisessem lucrar com o esquema. Esses "clientes" deixavam seu dinheiro na mão dos apostadores, que eram responsáveis por fazer as apostas. Na maioria das vezes, o grupo acertava e lucrava. Mas, às vezes, também perdia.
era a renda média mensal de um suspeito preso (cerca de R$ 4 mil por semana), segundo o seu depoimento à Polícia. Ele afirmou que ficava com 5% do lucro de cada aposta bem sucedida. O cliente ficava com 15%. E o restante era dividido entre o grupo que liderava o esquema criminoso, sediado principalmente no Rio de Janeiro.
O grupo foi autuado em flagrante no 2º DP por lavagem de dinheiro e associação criminosa. Felipe Cauã já respondeu por ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas quando era adolescente. Enquanto os outros suspeitos presos não têm antecedentes criminais.
A defesa dos suspeitos presos, representada no flagrante e na audiência de custódia pelo advogado Taian Lima, afirmou que "é de causar estranheza a autuação por lavagem de dinheiro e associação criminosa sem que houvesse sequer investigação pregressa ou em curso. Com os quatro jovens não foi encontrado absolutamente nenhum material ilícito ou indicativos de fraude. Portanto, a prisão é ilícita desde a sua gênese".
A Polícia Civil do Ceará aprofundará a investigação, para descobrir o tamanho do esquema criminoso, se há outros participantes, quanto de dinheiro movimentou e como a quadrilha sabe dos resultados. Para isso, a delegada plantonista já enviou o Inquérito Policial para a delegada titular do 2º DP, com sugestão de analisar as imagens disponíveis, enviar os celulares para perícia e localizar e ouvir as pessoas que constavam como proprietárias de documentos, cartões e veículos envolvidos na ocorrência.
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'Prejuízos em nível nacional e internacional', diz juiz
A 17ª Vara Criminal - Vara de Audiências de Custódia converteu a prisão em flagrante dos quatro suspeitos em prisão preventiva, em audiência de custódia realizada na última quinta-feira (19).
Apesar de ponderar que os suspeitos possuem qualidades favoráveis à soltura (como primariedade, ocupação lícita e endereço certo), o juiz considerou que a manutenção da prisão era a forma de "garantir a ordem pública".
O magistrado justificou que "os acusados de maneira audaciosa, sofisticada e premeditada formaram uma organização criminosa de âmbito nacional, com divisão de tarefas e com o intuito de cometerem diversos crimes de estelionato na utilização de contas para realizarem apostas que já sabiam antecipadamente dos resultados, ocasionando prejuízos em nível nacional e/ou até internacional, bem como na prática de lavagem de dinheiro de vultuosas quantias em nome de terceiros e causando prejuízos incalculáveis para os apostadores e as bancas de apostas".
O advogado Taian Lima também rebateu a decisão judicial de decretar a prisão preventiva: "Trata-se de uma verdadeira teratologia do judiciário alencarino, que merece urgente reparação. Todos são primários, ostentam bons antecedentes e possuem condições de responder o processo em liberdade. Ao final, será provada a inocência”.
[Atualização: 22/01/2024, às 10h26] Após a publicação da reportagem, os advogados Rayssa Mesquita e Teodorico Menezes Neto, entraram em contato com a reportagem para informar que assumiram a defesa dos quatro jovens para acompanhar o Inquérito Policial e o processo criminal. Em nota, a defesa afirma que "repudia veemente a narrativa fática apresentada, ressaltando que não houve nenhuma investigação prévia por parte da polícia no presente caso e que todo o exposto é pautado em meras suposições. A defesa dos acusados esclarece que acompanhará todo a persecução penal para ao final demonstrar a inocência dos acusados".