Vereadora assume sem ganhar nenhum voto

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Para favorecer o pai, Rita de Cássia desistiu da candidatura. Mantida como suplente, assumiu em julho passado

Palmácia. Dona-de-casa, casada, mãe de um casal de filhos, jeito tímido de falar, Rita de Cássia Campelo seria apenas mais uma cearense nascida no Interior que mora na Capital se uma seqüência de acasos do destino não a transformasse em uma personagem peculiar da política cearense. No último dia 29 de julho, ela assumiu uma das nove vagas de vereador na Câmara Municipal de Palmácia. Detalhe: sem ter recebido nenhum voto nas eleições realizadas em 2004.

Primeiro acaso: Nascida no distrito de Gado dos Ferros, Rita é filha de Clementino Campelo Neto, ex-prefeito, na década de 70, do município situado no Maciço de Baturité. Em 2004, o patriarca conclui o sétimo mandato seguido de vereador. Mesmo com o envolvimento do pai, a filha jamais tentara concorrer a qualquer cargo político. Se conformava em pedir votos para ele.

Segundo acaso: após se candidatar a vereador pela oitava vez, em 2004, Clementino é acometido por uma grave doença e teme não restabelecer a saúde a tempo. Rita é lançada, então, como candidata.

Terceiro acaso: Clementino se recupera da doença e volta à disputa. Apesar de já ter registrado a candidatura, Rita decide fazer campanha para o pai, mais uma vez. Temiam que uma divisão dos votos fizesse com que nenhum dos dois se elegesse: “Teve uma pessoa que veio dizer que iria votar em mim e eu pedi que ele votasse no meu pai”. Contam que, na década de 80, houve casos de empate nas eleições para vereador em Palmácia, ficando o cargo para o político mais velho. Um voto poderia ser decisivo. Assim, Rita decide não votar em si mesma. A estratégia dá certo; o pai é eleito.

Quarto acaso: apoiado na Resolução 22.610/2007, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Ministério Público Eleitoral pede a cassação de quatro vereadores de Palmácia, por infidelidade partidária. De maio a julho deste ano, o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE/CE) condena Marcelo Simião da Silva, José Vagner Rebouças, Francisco Ribeiro Passos e o próprio Clementino Campelo (que recorreu e aguarda novo julgamento).

Com a saída de Rebouças, em 18 de junho, uma vaga é aberta no PSDB. Em casos de infidelidade partidária, a legislação determina que a vacância seja preenchida por um suplente da mesma legenda. Mas o primeiro suplente, José Moisés Andrade Filho, também saíra do partido. A única suplente do PSDB é Rita. O recém-empossado presidente da Câmara, José Gilson Macambira Filho, recebe a explicação, do TRE, de que somente Rita poderia assumir a vaga. A falta de votos não é problema, visto que ela herdara os 51 votos de legenda do PSDB em 2004.

Para Gilson, que também é diretor da União dos Vereadores do Ceará, o fato é inédito. “Vamos inscrevê-la no ‘Guiness Book’”, diz, referindo-se ao Livro dos Recordes. Mas, segundo o TSE, já houve casos do tipo no Brasil. O TRE não soube informar se o mesmo já aconteceu no Ceará, pois o órgão não acompanha mudanças durante as legislaturas. Enquanto isso, Rita diz que já prepara dois projetos para a cidade.

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Antônio Lourenço
Funcionário público
'Acho que isso é um absurdo. Como é que você pode ser representante do povo sem ninguém ter votado em você?'

Alzira do Nascimento Gaspar
Dona-de-casa
'Quando a gente faz as coisas pensando nos pais da gente, tudo dá certo. O destino fez a sorte chegar até ela.'

ÍCARO JOATHAN
Repórter