Simulação de tremor de terra será feita no Sertão Central

O procedimento envolverá mais de 500 famílias de três cidades do interior cearense, tendo como objetivo orientar os moradores, afetados ou suscetíveis ao risco, para que saibam como proceder durante os abalos sísmicos

Escrito por Redação , regiao@verdesmares.com.br

Nos últimos quatro meses, mais de 1.600 abalos sísmicos foram registrados em três cidades do Sertão Central cearense: Quixeramobim, Madalena e Boa Viagem. O número equivale a cerca de 80% do total de tremores de terra verificados ao longo de 2018 em todo o Estado. 

Diante do alto índice de abalos concentrado em somente uma única localidade, a Defesa Civil do Estado, em conjunto com os órgãos dos três municípios, vai simular, neste mês, uma ocorrência sismológica, com o objetivo, segundo o chefe do núcleo de sismologia da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Ceará (Cedec), Francisco Brandão, “é treinar os moradores das comunidades afetadas, ou suscetíveis ao risco, a se protegerem no momento dos abalos sísmicos”. Mais de 500 famílias participarão do processo. 

O treinamento tem ainda outros dois propósitos. Um deles, conforme explica o assessor técnico da Defesa Civil de Quixeramobim, Marcos Machado, é angariar recursos financeiros com o Governo Federal que serão destinados aos reparos dos imóveis mais afetados pelos tremores. Para conseguir o aporte, cada Defesa Civil precisa elaborar um Plano de Contingência, cuja simulação é um dos pontos requeridos, segundo Machado. 

O valor destinado a cada município depende da quantidade de imóveis danificados. O terceiro objetivo da simulação é unir os profissionais das três cidades inseridas no perímetro do epicentro e criar Núcleos de Defesa Civil Comunitários (Nudecs). A implantação do órgão facilitaria o auxílio mútuo em eventuais tremores de maior magnitude. 

O geofísico Eduardo Menezes, do Laboratório Sismológico (LabSis) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), classificou a simulação como imprescindível, “pois o movimento das pedras no subsolo deve continuar na região”. Entretanto, ele ressalta não ser possível prever quando ou onde os tremores vão ocorrer. “Justamente por isso é tão importante aprender a conviver com o fenômeno, saber encará-lo”, acrescentou Menezes. 

Segundo o especialista do LabSis da UFRN, esses tremores ocorrem devido a falhas geológicas que estão constantemente em atividade sismológica. “Acontecem milhares e milhares de tremores, mas só uma pequena parcela é perceptível ao ser humano”, pontua Menezes.

Danos 

Apesar de nenhum dos abalos, neste ano, ter ultrapassado a ordem de 4 graus na escala Richter, o engenheiro civil e mestre em Estruturas pela Universid<CW-7>ade Federal do Ceará (UFC), Paulo Souza Miranda, destaca que os riscos na região decorrem devido às condições em que muitos imóveis foram erguidos. 

“Edificações executadas com poucos cuidados construtivos, característica de grande parte das edificações do Sertão Central cearense, podem apresentar consideráveis problemas quando submetidas a vibrações geradas por abalos da ordem de 4,5 graus na escala Richter”, pontua Paulo Souza Miranda. Dentre as mais de duas mil pessoas que vão participar da simulação, está a agricultora Maria Valderes Rodrigues, residente no distrito de Passagem, na zona rural de Quixeramobim. A residência em que ela mora, com o marido e os filhos, “foi danificada duas vezes só nos últimos três meses”, conforme explica. 

Nos tremores anteriores, ambos de magnitude inferior a 3 graus, os danos foram minimizados, no entanto, fica uma incógnita quanto ao futuro. “Toda vez que essa coisa acontece, a gente fica assombrada, e sempre vem a preocupação se vai acontecer mais vezes e mais forte, de tremer ainda mais, de derrubar tudo. Dessa última vez foram apenas as telhas, fazendo muito barulho. O chão também estremeceu bastante. A gente ficou assustada. As orações são diárias”, descreve, com preocupação a agricultora. 

O medo da agricultora parece ser uníssono dentre os moradores que sentiram a “terra tremer”, como eles gostam de descrever os episódios dos abalos sísmicos. O também agricultor Joaquim Luiz Mendonça, morador do Distrito de Quieto, na zona rural de Madalena, recorda os momentos de “terror” que ele e sua família viveram nos últimos meses. 

“A primeira vez foi há uns quatro meses, foi assustador, ninguém sabia o que fazer quando ouvimos as telhas se baterem. Depois do susto, pensávamos que tinha acabado, mas meses depois veio outro e depois, outro. O nosso maior medo é que a terra trema cada vez mais forte a derrube a casa, construída com tanto sacrifício”, lamenta. Mesmo o Brasil não estando localizado em região de borda de placas tectônicas, o engenheiro civil Paulo Souza Miranda avalia que medidas precisam ser tomadas para prevenir perda de vidas humanas e evitar que os anseios como os de Joaquim Mendonça sejam concretizados. 

“Mesmo com a evolução dos estudos na área sísmica, não existem métodos confiáveis de previsão de terremotos. A única maneira de diminuir o risco sísmico e as perdas potenciais associadas é melhorar a capacidade resistente das edificações às ações sísmicas. São necessárias condutas que envolvam monitoração, estudos e pesquisas possibilitando a caracterização das ações sísmicas e o nível de vulnerabilidade das edificações”, explica Miranda.