Primo de Maria de Araújo espera justiça

Escrito por Redação ,
A polêmica religiosa do ´Milagre de Juazeiro´ tem entre os expectadores a figura de um parente da beata Maria de Araújo

Crato. O aniversário de nascimento do Padre Cícero está sendo lembrado no âmbito das comemorações do chamado “Milagre de Juazeiro”. Durante uma missa, no dia 1º de março de 1889, Padre Cícero ministrava a comunhão aos fiéis, quando a hóstia teria se transformado em sangue na boca da beata Maria Magdalena do Espírito Santo de Araújo, conhecida como Maria de Araújo.

O fato repetiu-se dezenas de vezes e o povo crédulo achou que se tratava de um novo derramamento do sangue de Jesus, sendo, portanto, um milagre, mais tarde aceito também pelo Padre Cícero e outros sacerdotes da redondeza. As toalhas com as quais limparam a boca da beata, ficaram tintas de sangue e rapidamente passaram a ser objeto da curiosidade do povo.

Assim, o povoado, antes insignificante, passou a ser alvo de grande visitação popular, pois todos queriam ver os panos manchados de sangue. A história do milagre se espalha em todo o Nordeste. Era o início das grandes romarias que hoje, segundo cálculo da Igreja Católica, reúnem dois milhões de devotos por ano.

O fato terminou numa polêmica questão religiosa, ainda hoje não resolvida. Dentro da Igreja, ou mais precisamente no seio do clero, o chamado Milagre de Juazeiro foi tratado como fato natural, superstições vãs, evoluiu para embuste até que, em 1989, 100 anos depois, a psicóloga Maria do Carmo Pagan Forti define o fenômeno como uma espécie de aporte. O pretenso milagre deixou seqüelas irreparáveis nos familiares e amigos da beata, a partir do Padre Cícero que, segundo o padre Azarias Sobreira, mandou abrir uma sepultura na Igreja do Socorro para enterrar a beata. Em 1930, o túmulo foi destruído e os restos mortais da beata foram enterrados em local ignorado.

Apontada como vilã de uma “guerra santa”, o nome de Maria de Araújo ressurge agora como protagonista de um fenômeno religioso que mudou a história de Juazeiro.

Entre os seus parentes mais próximos, está o escritor Raimundo Araújo que, como revisor de três jornais do Nordeste, sofreu calado as acusações que eram feitas contra sua prima nas redações. Hoje, com 72 anos, Araújo acompanha, com “humildade franciscana”, o restabelecimento da imagem de Maria de Araújo.

Autor de 13 livros, entre os quais “O Centenário de Nascimento do Padre Azarias Sobreira”, “Juazeiro Anedótico”, “Padre Cícero do Juazeiro e Juazeiro do Padre Cícero”, “Mulheres de Juazeiro e Suco de Jiló”, “Resgatar é Preciso”, Araújo afirma que, “depois do Padre Cícero, Maria de Araújo é a figura mais importante de Juazeiro do Norte”.

“Ela era negra, analfabeta e pobre. Estes predicados contribuíram para um julgamento desfavorável a sua personalidade”, diz Araújo, acrescentando que, apesar das perseguições e dos preconceitos , ele não guarda nenhum ressentimento. “Meu sentimento”, destaca, “é de saudade e muito respeito”.

Ato covarde

“As pessoas que injuriaram a beata já morreram, estão perdoados, eu não sou de guardar rancor de ninguém, mesmo porque o ódio faz mal”, afirma. Considerou, entretanto, um ato covarde o fato da beata ter sido torturada, na Casa de Caridade do Crato, com 12 pancadas de palmatória.

Ao ser indagado sobre a veracidade do milagre, Araújo cita o filósofo chinês Confúcio, quando afirmou: “Tolo é aquele que acredita em tudo e 100 vezes tolo aquele que não acredita em nada”. A citação de Araújo vem acompanhada da esperança de que um dia a história fará justiça com a sua prima que, na verdade, segundo afirma, foi vítima de uma época marcada por polêmica.

Sobre a possibilidade de beatificação de Maria de Araújo, o escritor responde com uma interrogação. “Quem sabe?”. Depois de um silêncio, complementa: “Ela foi esquecida durante muito tempo. Agora, já temos cinco livros sobre ela, que está se reabilitando paulatinamente”.

ANTÔNIO VICELMO
Repórter