Covid-19: pesquisa aponta bairros mais vulneráveis no interior do Ceará

Estudos do IFCE e Unilab mapeiam o avanço da doença em cidades do Cariri e no município de Redenção. A partir de diversos eixos, as análises fornecem informações para que o poder público implemente ações específicas

Escrito por Redação , regiao@svm.com.br
Legenda: Segundo o estudo do IFCE, a Vulnerabilidade Epidêmica Potencial do bairro João Cabral, em Juazeiro do Norte, é 'Muito Alta'

Universidades do mundo inteiro têm direcionado seus profissionais em pesquisas que possam minimizar os impactos da pandemia da Covid-19. No interior do Estado não é diferente. O campus de Juazeiro do Norte do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) está mapeando as regiões com maior vulnerabilidade da doença no Cariri. Trabalho semelhante acontece em Redenção, no Maciço do Baturité.

No IFCE, o grupo de pesquisa de Mecânica dos Solos, Pavimentação e Geotecnologias (LMS&P), com o apoio da cartografia, mapeia áreas em Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, o chamado triângulo 'Crajubar', que reúne uma população estimada de aproximadamente 460 mil pessoas.

Iniciado em abril, o estudo busca desenvolver um índice de vulnerabilidade epidêmica a partir de indicadores socioeconômicos e demográficos, que poderá apontar quais áreas terão maiores impactos com a doença.

O professor e coordenador do trabalho, Antonio Ribeiro, explica que este índice de vulnerabilidade surge a partir de uma variável que utiliza dados do último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), além de informações do Estado e das próprias prefeituras. Entre os fatores estão saneamento, renda, idade, habitação, pavimentação, índice de escolaridade, número de coabitações, acesso à saúde, número de desempregados, entre outros. "Selecionamos as variáveis que a gente entende que são importantes", explica.

Os indicadores utilizados são distribuição de renda; pessoas em situação de pobreza ou extrema pobreza; densidade populacional; domicílios sem abastecimento de água e banheiro; ausência de infraestrutura urbana; e densidade domiciliar. Com estas informações, foi criada o Índice de Vulnerabilidade Epidêmica Potencial (IVEP). Em Juazeiro do Norte, os bairros Frei Damião e João Cabral apresentam um índice 'Muito Alto'. Já no Crato, o mesmo resultado aparece no Sítio Barro Branco, no bairro França Alencar e nos distritos de Monte Alverne e Santa Fé. Por último, em Barbalha, causa preocupação o distrito de Caldas e o bairro Mata dos Limas.

A partir deste trabalho, Antonio acredita que os resultados poderão ajudar o poder público e as pessoas a tomarem decisões. "Isso é uma ferramenta. A gente mostra: 'Aqui está o problema. É onde temos que atacar'", acredita. Um estudo semelhante foi feito na China, onde foram registrados os primeiros casos.

O vice-prefeito de Crato e coordenador do Comitê Municipal de Combate à Covid-19, André Barreto, afirmou que o acompanhamento relativo à localização dos casos tem sido feito, mas, por enquanto, a atuação acontece de forma padrão em todo o território cratense. "A gente age como se o vírus estivesse espalhado em todo o Município. As medidas são as mesmas. A rigor, não pode fugir disso, porque existe a subnotificação. Trabalhamos como se todos fossem potencialmente transmissores, independentemente do bairro", completa. A equipe de reportagem tentou contato com as secretarias de Saúde de Barbalha e Juazeiro do Norte, mas não teve retorno até o fechamento desta matéria.

A Universidade Regional do Cariri (Urca) também realiza pesquisa de vulnerabilidade, mas amplia seu olhar para a Região Metropolitana do Cariri, que possui a nove municípios. O estudo foi feito a partir de opiniões expostas por seus moradores, obtidas por meio do preenchimento de questionário eletrônico.

A partir de eixos temáticos, mescla o perfil socioeconômico, as pessoas do grupo de risco e o comportamento, assim como a compreensão da importância do isolamento domiciliar e outras medidas de prevenção. Em Redenção, no Maciço do Baturité, cerca de 66% das áreas da cidade são periféricas, consideradas mais vulneráveis à Covid-19. É o que aponta um mapeamento produzido pelo grupo de pesquisa e extensão "Diálogos Urbanos", da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira.

O levantamento considera, ainda, outras vulnerabilidades nas áreas Praça do Obelisco, Alto Cassiano, Centro Comunitário, Boa Fé e Alto da Boa Vista, Centro Principal e Franja Periurbana, levando em consideração seis variáveis: densidade demográfica acima da média; número de moradores sem abastecimento de água; concentração de pessoas acima de 60 anos; alta circulação e aglomeração de pessoas; concentração de moradias estudantis; e centralidades e periferias.

O coordenador do grupo de pesquisa, professor Eduardo Gomes Machado, avalia que as periferias são áreas urbanas mais precárias e onde a população tem mais dificuldade em cumprir o isolamento social. Dos sete locais de alta vulnerabilidade, apenas dois não estão na periferia da cidade.

"A maioria dos bairros não agrega equipamentos privados e públicas, não possue infraestrutura urbana adequada e concentra, em sua maioria, moradias de risco", avalia. No caso de Redenção, por exemplo, todos os equipamentos de saúde, exceto um, se localizam nas centralidades. Além disso, é preciso levar em consideração outras variáveis.

"Nas periferias se situam um contingente maior de pessoas com dificuldade de realizar a quarentena, como trabalhadores autônomos, o que aumenta o risco de contaminação já que temos um domicílio em que pelo menos uma pessoa está saindo de casa", avalia o professor. "São casas com poucos cômodos e muita gente. Outro agravante é que nestes bairros periféricos reside uma grande parcela de idosos e estudantes".  

Risco Ampliado

Na região periférica de Boa Fé e Alto da Bela Vista, no setor sul da cidade, quase metade da população é de idosos (49,92%), considerada mais vulnerável à Covid-19. Já no Alto Cassiano, bairro com maior número de pessoas sem água encanada (166), outro critério de vulnerabilidade, 46,97% da população local tem mais de 60 anos.

Embora os dados de moradores sem água correspondam ao Censo de 2010, "esse número segue o parâmetro que permanece hoje", assegura Machado.

A falta de água, segundo Eduardo Machado, gera maior dificuldade em lidar de modo sanitário mais satisfatório com a pandemia.

O professor conta que a pesquisa, que deve ser replicada em outras cidades, objetiva "estimular e fundamentar ações da universidade, da sociedade civil e da sociedade política, buscando minimizar o espalhamento do vírus". Apesar disso, Redenção ainda não iniciou ações específicas.