Em 30 anos, Câmara de Fortaleza investigou prostituição, iluminação pública e carteiras de estudante
Diário do Nordeste mostra o histórico de Comissões Parlamentares de Inquérito realizadas pelo Legislativo fortalezense desde a redemocratização
A Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor) tem em curso, desde junho, quando foram instaladas, três Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). As instâncias em atividade investigam os serviços de transporte por aplicativo, o fornecimento de energia elétrica pela Enel Ceará e a operação da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) no município. Mas, num passado recente, onze outros colegiados foram criados para apurar indícios de irregularidades pelo Legislativo fortalezense.
No raio de investigações tocadas desde 1988, quando da redemocratização do País, estão, dentre outras temáticas, a prostituição infantil, o turismo sexual, a má aplicação da Taxa de Iluminação Pública (TIP) e a confecção de carteiras por entidades estudantis da Capital cearense. No somatório de investigações promovidas estão 11 registros, conforme indicou a Casa Legislativa ao atender a um pedido enviado pelo Diário do Nordeste por intermédio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
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De acordo com o levantamento, as Comissões Parlamentares de Inquérito foram tocadas entre 1993 e 2001. Do quantitativo, três delas não tiveram os relatórios finais localizados pela equipe responsável pelo arquivo da CMFor. Ao todo, seis têm registros de que tiveram desfechos apontando irregularidades ou recomendações aos órgãos competentes. As demais, ao fim dos trabalhos, não foram conclusivas quanto a presença de irregularidades.
No intervalo apurado, a estatal que antecedeu a Enel, a Companhia Energética do Ceará (Coelce), e a própria Cagece foram investigadas pelos legisladores municipais. A perda de relatórios finais e informações relevantes dos arquivos, como alegado pela própria CMFor, marcam o período.
Primeiras investidas
A primeira delas foi aberta em junho de 1993, para apurar denúncias sobre irregularidades técnicas e administrativas do então Instituto de Pesos e Medidas (IPEM) de Fortaleza. Não foram localizadas nos arquivos informações sobre quem protocolou a CPI ou o desfecho dela. A ata da primeira reunião indica que a presidência foi do então vereador João Pinheiro e a relatoria ficou a cargo de Emanuel Teles.
No mesmo ano, em outubro, foi instalada a CPI voltada para investigar a prostituição infantil no município. Também não foram encontradas informações sobre a autoria da iniciativa. A presidência foi da então vereadora Rosa Fonseca e a relatoria de Durval Ferraz, segundo os documentos disponíveis. O desfecho não foi informado porque, pelo que argumentou a Câmara de Fortaleza, o relatório final não foi encontrado.
Em agosto de 1995, uma nova investigação voltou a acontecer no Legislativo de Fortaleza, para apurar denúncias contra o Instituto de Previdência do Município (IPM). Por falta de informações, a Câmara Municipal não descreveu quem protocolou o requerimento da comissão. Arquivos do Diário do Nordeste, entretanto, mostram que a provocação veio de Chico Lopes.
O presidente da CPI do IPM foi o General Francisco Batista Torres de Melo e o relator foi Idalmir Feitosa. Findada em novembro daquele ano, o relatório final da CPI concluiu pela prática de atos de improbidade administrativa e pelo encaminhamento das provas para o Ministério Público estadual.
Quase dois anos depois, em maio de 1997, a então vereadora Luizianne Lins apresentou um requerimento para que fosse aberta uma CPI que investigasse o desvio de verbas destinadas às escolas particulares pela Cooperativa dos Educadores do Ceará (Copece). Carlos Mesquita presidiu os trabalhos do colegiado e a autora da proposição foi a responsável pela relatoria. Apesar disso, a Câmara informou que o relatório de Luizianne Lins não foi encontrado, apenas o substitutivo, de autoria do então membro Marcus Teixeira. No documento, Teixeira indicou que não houve irregularidades nas condutas investigadas.
Ainda em 1997, foi a vez de denúncias de falsificação de carteiras estudantis servirem de estopim para uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito na Casa Legislativa, aberta em outubro. O requerimento foi assinado por vários vereadores, sem indicação do requerente, pelo que disse o levantamento enviado para a reportagem. Francisco Lopes foi o presidente da comissão e Amilton Gomes o relator.
Constam no relatório final da CPI das Carteiras Estudantis dez recomendações, entre elas o indiciamento das entidades que descumprissem a legislação que versa sobre o lucro pela emissão dos documentos, a suspensão do repasse financeiro para instituições envolvidas em irregularidades, o indiciamento da UEPE pelo descumprimento de solicitações da instância, o não reconhecimento de entidades envolvidas ilicitamente com políticos e acusadas de desviarem recursos.
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CPIs consecutivas
A extinta Coelce — substituída atualmente pela Enel Ceará — também foi investigada, em 1998, por conta da CPI que se debruçou na aplicação do dinheiro proveniente da cobrança da TIP. O requerimento que deu início para a comissão foi apresentado ainda em 1997, pelo vereador Carlos Mesquita. O mesmo parlamentar presidiu os trabalhos e Sérgio Novais tocou a relatoria.
Na conclusão da CPI da TIP, em março, foi constatada a falta de controle da Prefeitura quanto aos recursos da taxa e falta de prestação de contas pela companhia de eletricidade, a falta de necessidade da cobrança (por conta de um superávit mensal), irregularidades quanto a cobrança, a utilização indevida do dinheiro para pagamento de iluminação de estádios de futebol e serviços de poda e manutenção de rede de alta tensão, além de uma omissão da Coelce na determinação da receita proveniente do juro da multa de mora imputada aos consumidores.
Alguns dias depois, em abril daquele ano, uma nova CPI movimentou o Plenário da Câmara Municipal de Fortaleza. Desta vez, a atenção do Parlamento se voltou para o Mercado Central, depois que permissionários do entreposto denunciaram problemas no local. Não há informações acerca do protocolamento, mas Chico Lopes assumiu a presidência da comissão e Luizianne Lins foi a relatora.
Luizianne, em seu relatório, apresentado em maio, indicou que a Prefeitura de Fortaleza, por construir o equipamento, é quem deve resolver a situação dos permissionários prejudicados. Recomendou ainda que a gestão municipal realizasse um sorteio com a presença dos locatários do mercado, que realizasse adequações, reformas e intervenções para promover acessibilidade aos clientes, bem como a realização de campanha publicitária para divulgar o Mercado Central.
A Cagece foi alvo de outra CPI, em maio de 1998. A comissão teve como objetivo apurar o contrato firmado pela concessionária e a Hydrosistem Engenharia. A autoria do requerimento que resultou na investigação foi coletiva, de diversos vereadores. Quem presidiu o colegiado foi Luizianne Lins e a relatoria foi de Sérgio Novais.
De acordo com o relatório de Novais, publicizado em junho de 1998, foram encontradas irregularidades quanto a terceirização da manutenção e operação de uma região do município de Fortaleza, quanto ao descumprimento da legislação pela Cagece e pelo Governo do Ceará e quanto a um possível faturamento por parte de uma empresa contratada pela companhia. Houve uma série de recomendações à Prefeitura, ao Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE-CE), ao Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) e à própria Câmara Municipal.
As três últimas CPIs
Denúncias acerca do Frigorífico Industrial de Fortaleza (Frifort) — extinto pelo Executivo municipal em 1999 — motivaram mais uma CPI em 1998. Não foi informado quem protocolou o pedido de abertura. Francisco Lopes e Nelson Martins foram, respectivamente, presidente e relator da comissão. Não foi comunicado pela Câmara o desfecho, o último documento identificado no arquivo é a ata de uma reunião realizada em junho daquele ano, dando por encerrada a fase de esclarecimentos e concedendo dez dias para apresentação do relatório final.
A última CPI de 1998 foi a que averiguou supostas irregularidades na compra de remédios e gás medicinal pelo Instituto Doutor José Frota (IJF). A CMFor não informou quem protocolou, mas ela foi aberta em novembro e teve Carlos Mesquita na atribuição de presidente e Heitor Férrer como relator.
Apesar das denúncias, o relatório de Férrer acusou que não houve irregularidade administrativa que pudesse ser imputada à administração ou à superintendência do IJF quanto à compra do oxigênio e que, com relação aos medicamentos, a gestão da unidade de saúde agiu de maneira regular e legal. A CPI foi encerrada em fevereiro de 1999.
A prostituição foi tema de uma segunda comissão de investigação, que atuou especificamente no turismo sexual. Aberta em setembro de 2001, atendendo a uma iniciativa de Luizianne Lins, a comissão foi presidida por Agostinho Moreira e teve a própria autora como relatora.
Os trabalhos foram concluídos em março de 2002. Como constou no relatório final, foram identificadas, entre outros achados, redes de agenciamento, locais de prática da atividade e, a partir disso, houve recomendações aos órgãos competentes para a promoção de políticas públicas e a tomada de medidas que pudessem punir estabelecimentos envolvidos com a prática.