Famílias infratoras seguem no poder

Em Pacajus, antes do prefeito ser afastado, o pai, a mãe e o avô dele também o foram, mas continuam sendo eleitos

Na Região Metropolitana de Fortaleza, o Município de Pacajus tem visto membros de uma mesma família chegarem ao poder e serem afastados do cargo em um ciclo que não prenuncia um fim. Desta vez, após ser alvo de denúncia do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), o atual prefeito, Flanky José Amaral Chaves (PP), foi afastado do cargo no último dia 14 de setembro, por 180 dias, para responder a uma ação civil pública por improbidade administrativa. A prática de ilicitudes que soa "hereditária", então, levanta debate sobre o que contribui para que famílias ou grupos de infratores perpetuem-se no poder. Antes, o pai, a mãe e o avô de Flanky também já haviam sido afastados do cargo quando prefeitos do mesmo Município.

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Na avaliação de cientista político entrevistado pelo Diário do Nordeste, olhar para o caso, portanto, é deparar-se com fatores diversos que contribuem para que famílias de infratores perpetuem-se no poder. O promotor de Justiça que conduziu a investigação que culminou no afastamento do prefeito pacajuense, por sua vez, promete acompanhar os desdobramentos da ação e espera que a decisão judicial em primeiro grau seja mantida e o processo seja encerrado "o mais rápido possível".

O afastamento de Flanky Chaves, eleito em 2016 para o primeiro mandato à frente da Prefeitura de Pacajus, é resultado do cumprimento de uma decisão liminar da juíza Ricci Lobo de Figueiredo Filgueira, em ação civil pública ajuizada pelo MPCE, por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Pacajus. Além dele, o pai, o ex-prefeito José Wilson Alves Chaves, também do PP, e outras 14 pessoas são denunciadas na ação.

Investigação

De acordo com o Ministério Público, uma análise de auditoria realizada pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), bem como gravações, depoimentos, documentos e processos de pagamento apontaram indícios de que o prefeito e o pai dele, associados a servidores públicos e empresários, coordenaram um esquema permanente para cometer ilícitos em detrimento do Município de Pacajus.

A investigação foi conduzida pelo promotor de Justiça Iuri Rocha Leitão. Segundo ele, o esquema tinha o objetivo de direcionar contratos do Município, ao arrepio da legislação, visando a beneficiar ilicitamente particulares indicados, acarretando dano ao erário do Município e gerando enriquecimento ilícito de particulares, por meio da contratação de serviços sem qualquer coleta de preços, sem projeto de execução e mediante sobrepreço (superfaturamento). As ilicitudes atingem contratos e aditivos cujo valor global representa o montante aproximado de R$ 2.129.239,06.

"A investigação iniciou quando servidores públicos começaram a noticiar ao Ministério Público que o senhor José Wilson, que até está condenado e com os direitos políticos suspensos, estava dentro da Prefeitura realizando determinações diretas com funcionários, como se estivesse exercendo o cargo de fato", lembra o promotor. Segundo Iuri Rocha Leitão, ainda no final de janeiro último, o MPCE emitiu uma recomendação ao prefeito, "informando que o pai dele está condenado por improbidade administrativa e não poderia estar tomando essa ingerência".

O prefeito teria negado qualquer prática do tipo, mas o que chegou à Promotoria é que, depois disso, Flanky e o pai resolveram fazer reuniões com secretários na casa de José Wilson, dificultando, assim, fiscalizações do TCM e do MPCE.

A influência do patriarca na administração do eleito já havia sido sinalizada em agosto de 2016 pelo próprio José Wilson, quando, em entrevista à rádio local FM Montemor 95,1, colocou-se como pré-candidato a prefeito de Pacajus pelo PP, mas afirmou que, caso "problemas jurídicos" que estavam sendo "solucionados" não fossem julgados a tempo, seu grupo político teria como plano B alguém da própria família.

Denúncias

Na mesma entrevista, José Wilson citou a esposa, Maria Helena Amaral Chaves, e os filhos, Flanky Chaves e Júnior Chaves, como alternativas à candidatura barrada. Foi o que aconteceu. Prefeito de Pacajus por três oportunidades (1994-1995; 1997-2000; 2001-2004), José Wilson, segundo Iuri Rocha Leitão, é réu em "vários processos" na 2ª Promotoria de Justiça de Pacajus, por atos ilícitos como perseguição de servidores, promoção pessoal com dinheiro público, contas desaprovadas e danos ao erário do Município. Condenado por improbidade administrativa, ele está com direitos políticos suspensos e, por isso, não pode ser candidato.

O pai dele, Expedito Chaves Cavalcante (PP), por sua vez, foi cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em dezembro de 2003, por denúncias de corrupção eleitoral. Antes, em junho daquele ano, ele foi afastado do cargo pela Câmara Municipal por denúncias de improbidade administrativa, mas quatro dias depois foi reintegrado ao posto por decisão judicial.

À época, Expedito assumiu a Prefeitura na condição de vice do filho, que havia sido afastado do cargo em 2001. A mãe do atual prefeito afastado, Maria Helena, também comandou a Prefeitura de Pacajus entre 1989 e 1990, sendo igualmente alvo de denúncias e afastamento. Hoje, ela é chefe de gabinete da gestão do filho, Flanky Chaves.

População

Ao analisar o caso, o promotor Iuri Rocha Leitão opina que a perpetuação da família no poder decorre de fatores relacionados à Justiça, mas também à população. "A Justiça, de fato, não tem o tempo da política. Ela tem uma série de procedimentos, de passos a serem observados para garantir o contraditório e a ampla defesa, e com o tempo realmente vem uma decisão um pouco demorada", reconhece.

Segundo ele, contudo, chama a atenção no caso de Pacajus que, "nas ações que foram propostas, você não pode dizer que houve inércia do Ministério Público ou do Judiciário, tanto que hoje ele (José Wilson) está condenado e com os direitos políticos suspensos", mas, apesar disso, o grupo político segue com "legitimidade popular" nas eleições. "A população permanece flagrando ele, bem como os familiares, então é um fenômeno até difícil de explicar", considera.