A empresários cearenses, Sérgio Moro defende reformas e Lava Jato

O ex-ministro questionou a capacidade reformista do Governo, negou qualquer interferência política na Lava Jato e defendeu operação que vem sendo alvo de investidas por parte da PGR e do Supremo Tribunal Federal

Escrito por Flávio Rovere ,
Legenda: Sérgio Moro deixou o Governo Bolsonaro em abril deste ano, em meio à pandemia no País
Foto: AFP

Responsável pela maior crise interna do Governo Bolsonaro até agora, o ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, tem evitado declarações mais contundentes sobre a gestão que integrou por um ano e quatro meses, mas invariavelmente expõe o motivo que o levou à turbulenta saída em 24 de abril. "No campo da agenda anticorrupção, me parece esse compromisso um tanto quanto ausente", disse sobre o Governo Federal. Ex-juiz da Lava Jato, Moro tratou de defender o "legado" da operação e disse que estão fazendo "questionamentos absurdos" sobre a força-tarefa.

Durante pouco mais de uma hora e meia, ele conversou ontem com representantes do Lide Ceará, grupo de lideranças empresariais que vem organizando debates com personagens do cenário político nacional, e defendeu mudanças com a aprovação de reformas, mas questionou a disposição do Governo em fazê-las. "Tenho minhas dúvidas se Brasília tem esse espírito reformista", criticou, defendendo uma reforma tributária "que não seja só agregar carga tributária ou fazer simplificações singelas" e uma reforma administrativa com um "choque de meritocracia", mas que não "vilanize" o servidor público no País.

Segundo Moro, um importante termômetro do ímpeto reformista do Governo em relação à agenda anticorrupção é a PEC 199/19, em tramitação na Câmara, que pode permitir a prisão em segunda instância, implicando, inclusive, novos aliados de Bolsonaro. "Ele tem uma excelente relação com o Congresso, tem o controle ali do Centrão e, querendo, consegue aprovar essa PEC com facilidade", afirmou.

Lava Jato

Mesmo afastado da magistratura, Sérgio Moro ainda vê a trajetória como juiz sendo alvo de questionamentos que podem ter peso em seu futuro próximo. Enquanto a Lava Jato vem tentando resistir a reveses da Procuradoria-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal (STF), ambos com repercussões importantes em prováveis pretensões políticas, Moro sai em defesa da operação que o lançou nacionalmente como personagem midiático. "Eu decidi todos os casos da Operação Lava Jato com base na lei e nas provas", disse o ex-juiz, que deve ter, nos próximos meses, o pedido de suspeição em relação ao processo do tríplex de Lula julgado pelo STF.

No início do mês, o Supremo já decidiu tirar a delação de Antônio Palocci do processo em que o ex-presidente é acusado de receber vantagens indevidas da Odebrecht. Divulgado às vésperas do primeiro turno de 2018, o depoimento do ex-ministro é apontado como indício da ingerência de Moro no cenário eleitoral, expediente que ele negou. "Jamais tive qualquer intenção de realizar decisões de cunho político-partidário", diz. "Não fui eu que fiz a Lava Jato. Não foram os procuradores, não foram os policiais. Foi um conjunto de ações, e que envolveram o próprio Supremo Tribunal Federal. Foi uma construção coletiva de algo que orgulhou o país", defendeu Moro, que se disse de "consciência tranquila" em relação ao caso.

Pretensões

Em relação ao Poder Judiciário, o ex-juiz se disse mais "conservador" quanto à mentalidade reformista. Segundo ele, as críticas sobre suposto protagonismo exagerado vêm da inércia dos demais poderes "Esse empoderamento do Judiciário é, principalmente, ao meu ver, decorrente de uma certa fragilidade do Congresso e do Executivo, que não conseguem assumir o papel de liderança que lhes cabe".

Frequentemente questionado sobre pretensões eleitorais, Moro tem se esquivado de alimentar conjecturas. Segundo ele, a prioridade é com a atividade que vai colocar como atual no currículo. "Meu reposicionamento vai ser no mercado privado, tão logo, evidentemente, acabe essa quarentena. Não estou com a visão política de futuro, do que vou fazer, especialmente lá em 2022", confessou.

Constantemente motivo de colisão com Bolsonaro enquanto esteve no Governo, a pandemia, segundo Moro, expôs problemas que o Brasil precisa resolver com urgência. "Acentuou defeitos e confusões institucionais do País. Ela veio acentuar o que temos de errado, que é o nosso sistema institucional relativamente disfuncional e caótico", ponderou o ex-juiz.