Quem é o culpado da crise? O que dizem as pesquisas de opinião

Escrito por Pedro Barbosa ,
Pedro Barbosa é cientista político e diretor técnico do Instituto Opnus de Pesquisa
Legenda: Pedro Barbosa é cientista político e diretor técnico do Instituto Opnus de Pesquisa

A crise econômica na qual o Brasil encontra-se mergulhado tem várias faces como o desemprego, aumento do endividamento e da taxa de juros, mas, sem dúvidas, a alta generalizada dos preços é a que mais tem impactado a vida da maior parte da população e, pela relevância que possui, o tema tem sido tratado nas recentes pesquisas de opinião, que trazem interessantes dados sobre a percepção dos brasileiros acerca da situação atual. As pesquisas tomam uma dimensão ainda mais importante num contexto em que observamos uma guerra de narrativas quanto à responsabilidade sobre a crise.

Do lado do governo federal, atribui-se a culpa a fatores externos, fora de seu controle, elencando-se três motivos/inimigos principais: a guerra na Ucrânia, a Petrobras e os governadores dos estados, pela adoção de medidas restritivas durante a pandemia e, atualmente, por não reduzirem as alíquotas do ICMS. Do lado oposto, temos a narrativa que coloca o governo federal no centro da crise, acusando-o de ineficiência na tomada de medidas para mitigá-la, bem como de ser o grande responsável pelo aumento dos preços dos derivados de petróleo, uma vez que o governo é o acionista majoritário da Petrobras e, inicialmente, foi quem definiu a atual política de preços. Observando as pesquisas recentes, vemos que a opinião dos brasileiros está, de fato, dividida, porém, com um peso maior da responsabilidade recaindo sobre a figura do presidente.

Segundo pesquisa do instituto FSB, 94% dos brasileiros consideram que o país está em crise econômica e 42% da população aponta o governo atual como principal responsável pela situação econômica do país, enquanto 25% culpam a pandemia e 21% os governos passados. 

Em pesquisa de maio do instituto Poder Data, quando perguntados diretamente sobre a inflação, 42% dos entrevistados afirmaram que Jair Bolsonaro seria o principal responsável pelo aumento dos preços, enquanto apenas 18% culpam diretamente os governadores. Também foram apontados como responsáveis a pandemia, a guerra na Ucrânia, a Petrobras e as empresas em geral.

Além da percepção sobre o cenário atual, as pesquisas também têm investigado acerca das expectativas para o futuro. Em março, o Datafolha apontou que, neste início de ano, os brasileiros ficaram menos otimistas quanto à melhora da situação econômica pessoal e do país em comparação com dados de dezembro do ano passado. O otimismo com a melhora econômica pessoal caiu 9 pontos percentuais e o otimismo com a melhora econômica do país caiu 15 pontos.

Novamente, vemos dados desafiadores para um presidente que busca a reeleição, uma vez que não apenas a população enxerga que o país está em crise, mas a maioria também não acredita que as coisas irão melhorar num futuro próximo. Com o agravamento da crise econômica, reforça-se a tese de que a economia dará o tom desta eleição e este embate não acontecerá apenas na disputa presidencial, mas também nos estados.

O projeto de lei que diminui a alíquota do ICMS sobre diferentes setores da economia aprovado nesta última semana na câmara dos deputados azedou ainda mais uma relação que já não era nada boa entre o presidente Bolsonaro e os governadores estaduais. Para o presidente, trata-se de uma oportunidade de matar 2 coelhos com uma cajadada só: em primeiro lugar, se aprovado no senado, o projeto permitirá uma diminuição de preços em setores importantes e que o presidente vem sendo cobrado, como combustíveis e energia elétrica e, em segundo lugar, a medida esvazia parte dos cofres dos governadores estaduais em pleno ano de eleição, muitos dos quais são adversários políticos do presidente e aliados de candidatos opositores.

Hoje, o projeto de diminuição do ICMS parece ser a principal trincheira da guerra de narrativas em torno da responsabilidade sobre a inflação: caso seja aprovado, a diminuição de preços naturalmente ajuda a aliviar a insatisfação com o presidente, por outro lado, caso seja rejeitado, fica reforçada a tese de Bolsonaro de que os governadores se recusam a ajudar a resolver o problema, pelo contrário, são parte dele, aproveitando-se do momento de alta dos preços para inflar suas arrecadações.

Contudo, como vimos pelos resultados das pesquisas mais recentes, até o momento, a percepção da opinião pública nesse tema tem sido mais desfavorável ao presidente. É importante observar que, mesmo que saia fortalecido desse embate, hoje Bolsonaro tem como principal adversário não os governadores, mas Lula que, pelas circunstâncias, tem vantagem quando a disputa se dá no tema da economia.

Em primeiro lugar, durante o mandato de Lula, ainda que o contexto do Brasil e do mundo fossem bastante diferentes de hoje, o fato é que o país experimentou uma combinação de crescimento econômico e distribuição de renda que rendeu ao petista altos índices de aprovação. A memória dessa época e a criação de uma esperança de que ela voltará têm sido a principal estratégia de sua campanha até agora.

Em segundo lugar, como estão há muitos anos fora do poder, atribuir a Lula ou aos governos do PT a responsabilidade sobre a situação econômica atual do país tem se mostrado um esforço desafiador. Dessa forma, a pauta anticorrupção segue como a principal arma de Bolsonaro contra Lula, mas está claro que ela não tem a mesma força que teve em 2018, uma evidência disso é o desastre da pré-candidatura a presidente de Sérgio Moro, principal expoente da Lava Jato. O cenário de crise econômica muda as prioridades e motivos de decisão de voto dos eleitores e o próprio fato de Bolsonaro estar no poder também altera a dinâmica do jogo.

Em seu 4º ano de mandato, o presidente já enfrentou diversos escândalos, bem como celebrou alianças com políticos investigados e até condenados por malfeitos, o que gera desgastes e faz do tema corrupção um terreno delicado agora também para o bolsonarismo. O desgaste de ser governo cobra seu preço, deixa-se de ser pedra para ser vidraça. Por fim, lembremo-nos que a eleição não é hoje, mas daqui a 4 meses, e a campanha eleitoral ainda nem começou oficialmente, assim, os dados atuais, longe de nos mostrar um cenário definitivo, nos servem como indicadores para entendermos o momento atual e as prováveis tendências daqui para frente.

Pedro Barbosa é cientista político e diretor técnico do Instituto Opnus de Pesquisa