Apostas online, educação offline

Apesar da atmosfera de surpresa, os dados apenas confirmam o que já empurramos ladeira acima há anos: a pedra continua rolando de volta, e Sísifo, cansado, segue fingindo espanto a cada descida

Escrito por
Davi Marreiro  producaodiario@svm.com.br
(Atualizado às 06:21)
Consultor pedagógico e professor

Se já não bastassem as barreiras econômicas, sociais e os transtornos emocionais, que historicamente sabotam o acesso de muitos jovens brasileiros ao ensino superior particular, eis que surge mais um empecilho digno de tragicomédia nacional. Projeções para o primeiro semestre de 2026 apontam que quase 1 milhão de potenciais universitários pode ficar de fora das salas de aula, não por falta de vagas, mas por já estarem financeiramente matriculados nas promessas vazias dos sites de apostas online. A promessa de lucro fácil virou vestibular da desesperança.

Apesar da atmosfera de surpresa, os dados apenas confirmam o que já empurramos ladeira acima há anos: a pedra continua rolando de volta, e Sísifo, cansado, segue fingindo espanto a cada descida. Segundo levantamento da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) com a Educa Insights, 14% dos alunos do ensino superior privado já atrasaram mensalidades ou trancaram o curso por causa dos gastos com apostas online. Sim, a universidade perdeu mais uma batalha, e agora a pedra não rola apenas ladeira abaixo, mas gira, desorientada, numa roleta de cassino online onde o esforço já não garante sequer o jogo.

Sejamos francos: o utilitarismo, claro, assiste isso satisfeito: estudar custa caro, exige tempo, disciplina e, na maioria das vezes, não rende ostentações. Para quem já vive na rotina exaustiva de empurrar a própria existência montanha acima, apostar não é vício, é só substituir a pedra por um celular e deixar o destino decidir quando ela despenca. Afinal, perder com um clique exige menos esforço do que o risco de fracassar com um diploma.

Segundo dados apresentados em Sessão Deliberativa Ordinária no Senado, na última terça-feira, a pedra ficou mais pesada ou mais lucrativa, dependendo de quem a empurra e de quem coleta os “escombros” da descida. Se nada mudar, o Brasil pode encerrar 2025 com R$ 270 bilhões escorrendo pelas fissuras das apostas. Se as apostas reguladas fossem um ministério, seu orçamento superaria o da educação básica no país. Apostar não forma pessoas, mas os números revelam claramente os interesses predominantes do mercado.

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