Pesquisa aponta oito unidades de conservação ambiental no CE atingidas por óleo
<MC>Num artigo publicado em revista internacional, estudiosos indicam que, pelo menos, 59 unidades de conservação ambiental brasileiras foram afetadas pelo petróleo cru; áreas têm relevância ecológica, econômica e social
Aglomerados de um material denso e de cor preta surgem no litoral brasileiro, onde a vida marinha é tão complexa quanto desconhecida, chegando até os banhistas no dia 30 de agosto do ano passado. Do desastre ambiental, de dimensões incalculáveis, constatou-se que, pelo menos, oito Unidades de Conservação (UCs) foram alcançadas pelo material identificado como petróleo cru, no Ceará. O Estado é o segundo maior em localidades impactadas, ao lado de Pernambuco - também com oito - e atrás apenas da Bahia, com 15 unidades.
Operações de limpeza de praias, realizadas de setembro a dezembro de 2019 no litoral cearense, conseguiram coletar 40 toneladas de resíduos, entre petróleo cru, areia, sedimentos, dentre outros, segundo informou a Secretaria do Meio Ambiente do Ceará (Sema). As UCs cearenses atingidas pelo óleo foram: Parque Nacional Jericoacoara, Parque Estadual do Rio Cocó, Parque Municipal das Dunas da Sabiaguaba, Reservas Extrativistas da Prainha do Canto Verde e do Batoque, Áreas de Proteção Ambiental do Lagamar do Cauípe, do Rio Pacoti e das Dunas do Litoral Oeste. No Brasil, pelo menos 59 UCs foram identificadas.
Esse levantamento foi realizado por pesquisadores brasileiros em um artigo publicado na Marine Policy, revista especializada em estudos oceânicos, no dia 28 de fevereiro. Eles tiveram como base os boletins e notas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) com dados disponíveis desde o surgimento do óleo. Participaram professores de universidades federais das áreas da ciências do mar, biologia, botânica, direito, química, além de ambientalistas.
Organizar os impactos ambientais, econômicos e sociais em um artigo científico cria uma base para futuras pesquisas, sendo o motivo da iniciativa dos pesquisadores. “A gente fez um apanhado de tudo que se sabia com essa questão do derrame de óleo para ter isso registrado em um periódico científico e possa ser usado por outros pesquisadores como referência”, ressalta Luís Ernesto Arruda, professor do Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da Universidade Federal do Ceará (UFC).
São consideradas Unidades de Conservação os espaços e seus recursos ambientais com características naturais relevantes, como consta na Lei Federal 9.985/2000. Essas unidades fazem parte do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), que tem como alguns objetivos proteger as espécies ameaçadas de extinção, contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas e proteger os recursos naturais necessários à subsistência de populações tradicionais.
Prejuízos
“Essas unidades de conservação são criadas porque existe ali uma importância ecológica e econômica em torno daquela área. Quando você tem algum tipo de impacto nessas unidades de conservação, a coisa fica um pouco mais complicada porque você está impactando uma região que é única”, explica o professor Luís Ernesto.
Luís ressalta que no Batoque<CW-5>, no Aquiraz, e na Prainha do Canto Verde, em Beberibe, as comunidades locais são formadas por pescadores e marisqueiros, por exemplo, que encontram sustento nas riquezas naturais. “Em desastres com derramamento de óleo, mais importante do que a quantidade de óleo que vaza, é aonde esse óleo chega. Se a locais muito pobres ou afeta áreas onde tem comunidades que dependem daquela região para viver, isso torna a coisa muito pior”.
Em nota, a Sema disse que as ocorrências de óleo foram “esparsas e pontuais”. Quanto às unidades de conservação estaduais Parque do Cocó, Dunas do Litoral, Lagamar do Cauípe e Rio Pacoti, a Sema “articulou a criação de um grupo de trabalho (GT de Combate às Manchas de Óleo), envolvendo vários órgãos, universidades e secretarias estaduais”. Também foram atualizados os critérios de balneabilidade da água.
As amostras recolhidas identificaram gotículas do poluente em micro-organismos conhecidos como plânctons, que são a base da cadeia alimentar e produzem oxigênio. Esse dano também tem relevância porque os peixes se alimentam desses animais e, assim, as substâncias do petróleo cru chegam aos seres humanos por meio da alimentação.
Outros animais prejudicados são as tartarugas e os peixes-bois, como acrescenta a ambientalista Alice Frota, participante do Instituto Verdeluz, que contribuiu para a elaboração do artigo. “O óleo que chegou às dunas se espalhou e isso a longo prazo pode causar a intoxicação da fauna submersa na areia e de outros animais que ali se alimentam. É difícil medir os impactos quando é algo que se espalha assim fácil”, acrescenta.
Mesmo depois que as imagens do recolhimento de petróleo cru deixaram de ser comuns, os impactos ambientais continuam a acontecer no nível molecular porque as substâncias continuam na água e nas areias. “Isso precisa ser monitorado a longo prazo, tanto a parte da biota quanto das comunidades que foram e que, provavelmente, serão afetadas ainda por um tempo. Precisa ter estudos de longo prazo para saber que tipo de consequência isso vai ter”, avalia Luís Ernesto.
Pesquisa
Foram selecionados 12 projetos universitários para estudar e combater o derramamento de óleo nas praias brasileiros, em janeiro deste ano, pelo programa Entre Mares, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Para a iniciativa, foram submetidas 278 propostas.
Devem ser atendidas sete áreas temáticas, como avaliação dos impactos ambientais e socioeconômicos, biorremediadores, dispersão do óleo, processamento de resíduos, tecnologia aplicada à contenção do óleo e saúde coletiva. Para cada uma foi destinado o valor de até R$100 mil, com bolsa de mestrado a ser implementada até junho de 2020. Ao todo, o Entre Mares dispõe de R$ 1,3 milhão.