Pandemia de Covid-19 suspende planos programados e sonhos precisam ser reinventados

Três distintas trajetórias de vidas compartilham a interrupção inesperada dos planos feitos para 2020. Casamento, viagens e estudos foram adiados em meio ao aumento do contágio do novo coronavírus no mundo.

Escrito por Redação ,
Legenda: Apesar de precisar adiar o casamento e as preparações do nascimento de sua primeira filha, a professora universitária vê alegria em poder estar mais próxima da família neste momento
Foto: Arquivo Pessoal

O caminho a ser seguido em 2020 havia sido planejado com cuidado por Beatriz, Otávia e Didier, mas, com a mesma rapidez que o coronavírus se espalhou ao redor do mundo, os sonhos e planos também foram subitamente modificados. Alguns puderam ser apenas suspensos, repensados e reestruturados para algum dia no futuro próximo, mas no caso da professora universitária, Otávia Marques de Farias, que esperou cinco anos para uma licença capacitação, os meses de estudos na França tiveram que ser cancelados.

 

Otávia estava em Lyon há somente duas semanas quando o presidente Emmanuel Macron decretou o Lockdown no país estrangeiro, no dia 12 de março. Em sua viagem, planejada com cuidado, buscava aprender a língua francesa. Agora, mesmo com o fim da pandemia, ela não teria como retornar os estudos

“Não tem como, porque minha licença tinha sido aprovada de 1 março até 29 maio, 90 dias. Quando eu voltei, eu fiz alguns cursos virtuais, então eu só tive 30 dias de licença, o resto eu precisei fazer virtualmente e os outros 60 dias, foram cancelados”. A recordação da rapidez dos acontecimentos ainda lhe surpreende.

“Para muita gente foi um susto, para mim também foi. Foi muito rápido. Quando eu cheguei na França, as pessoas falavam do coronavírus ainda como algo muito longe do cotidiano delas. Duas semanas depois já estava enorme, as fronteiras estavam fechando e a Itália estava no auge do caos”, compartilha.

Legenda: Otávia Marques, professora universitária, fazia um curso na França e precisou voltar para o Brasil após o surgimento da pandemia
Foto: Arquivo pessoal

No começo, a chateação foi um sentimento que predominou, principalmente porque havia tido muitos gastos financeiros para a viagem. Porém, após conseguir retornar ao Brasil e reencontrar o marido, sentiu o incômodo diminuir. “Pelos menos eu estou em casa, com meu marido, dá para respirar. Dos males o menos”, afirma. 

Conforme a psicóloga Roselany Varela, o cenário da pandemia é um momento único para todas as pessoas, independente do país em que se encontrem. Para ela, é “perfeitamente possível” pensar em planos e sonhos para o futuro, ainda que em meio à tantas incertezas no presente. 

“Lidar com as interrupções abruptas dos planos vai requerer uma mudança de perspectiva, um reajuste, levando em conta os recursos que a tecnologia pode proporcionar para a gente nesse momento”. 

Em sua visão, é importante ser considerado o período em que estamos vivendo e as mudanças trazidas pelo contexto da pandemia. “Não pode esquecer o que está vindo de positivo no sentido social e individual. As pessoas percebem agora que elas podem viver e trabalhar de formas diferentes, elas podem considerar também outros ideais”, afirma. 

Saudades

Para o estudante Didier Té, 35 anos, natural do país africano Guiné-Bissau, o maior desejo é retornar para terra natal. Há 7 anos sem ver a família, aguardava somente o recebimento do título acadêmico de mestre, conquistado após os anos de estudo no Brasil, para poder rever a família. Porém, com a pandemia de coronavírus, não somente tem encontrado dificuldade em receber o diploma, como também em conseguir uma passagem de retorno através do projeto de mestrado a qual se aplicou. 

Legenda: Didier Té, há 7 anos sem ver a família, precisou adiar seu retorno para casa

A entrada no processo de recebimento do título foi realizada logo após a defesa da dissertação, no dia 9 de abril. No entanto, como as universidades estão fechadas e com atividades reduzidas devido à pandemia, Didier explica que esse setor permanece inoperante. “Talvez eu não consiga levar o meu diploma de mestrado. Eu não tenho como esperar nessa situação de incerteza, até porque preciso voltar para pelo menos estar em meu país, ter uma condição financeira lá, porque aqui já não tenho como me manter”, afirma. 

Sua mãe e seus três irmãos, que aguardavam sua chegada para o começo de maio, agora se sentem inquietos com a espera e a angústia. “Tudo o que eles querem é que eu volte para casa. Lá eu fico mais tranquilo. Em tempos de tempestade, quanto mais a gente estiver perto da família, isso faz mais o bem para nossa saúde emocional e psicológica”, explica o estudante.  

Sendo o primeiro da família há conseguir um diploma de ensino superior, Didier optou por vir ao Brasil e fazer graduação e especialização na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), em Redenção, no Ceará. Seu mestrado foi feito na mesma instituição, no campus da Bahia. Dentre as muitas dificuldades vividas ao longo de sua estadia no Brasil, as questões financeiras foram os maiores desafios do estudante estrangeiro. 

Eu me sinto herói da minha própria história, um vitorioso. Sempre sonhei em me formar, atingir um curso superior. A gente tinha uma missão para cumrprir, um objetivo a perseguir e a alcancar. Acabamos abrindo mão de muitas coisas. Uma boa alimentação e outros tipos de cuidados vitais para podermos conseguir aquilo que não só eu, mas que colegas também conseguiram”, finaliza.

Reinventar planos

O casamento da professora universitária Beatriz Alencar, 37 anos, marcado para 18 de abril, precisou ser adiado para o dia 5 de julho após o crescente número de casos de pessoas contaminadas pela Covid-19. Apesar da surpresa e da interrupção de seus planos, conseguiu encontrar alternativas para fazer o sonho acontecer.

“Tinha planejado o casamento, almoço de família, lua de mel. Tivemos que desmarcar tudo”, explica. O vestido também precisou ser mudado, porque a gravidez de seis meses já trouxe uma outra mudança para o corpo da professora. 

“A barriga estava bem pequenininha e cresceu demais. Ao invés de um almoço, a gente teve que se adaptar para um bolo com champanhe. Mas eu estou feliz, mesmo tendo planejado e contratado serviços. Eu sei que pode ser super clichê, mas eu noto que o que realmente importa é a questão do amor”, comenta. A comemoração, que antes contaria com a presença de amigos e familiares, agora deve ser feita a três. Beatriz, sua mãe e o marido.

Alguns fatores entristeceram bastante a professora, como não poder realizar as compras presenciais de sua bebê, organizar o quarto, participar de rodas de gestantes e ter o contato direto com sua doula, mulher responsável por lhe ajudar em um parto humanizado.

“Em um primeiro momento foi frustrante, mas a gente tem que se reinventar. Não vou alimentar essa tristeza não. Vou seguir, tive contato virtual com uma mãe e ai ela teve o bebê dela e está sobrevivendo. Reorganização total”, compartilha Beatriz.

De tudo isso, um ponto positivo que também fica é o estreitamento de sua relação com o marido, Hadson. “Essa convivência aumentou os nossos laços e o que fica é o essencial, que duas pessoas querem socializar, estar juntas”, finaliza.

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