No Ceará, 9,21% dos idosos não vacinados morreram de Covid-19; entre vacinados, taxa é de 0,07%

Estudo de pesquisadores no Ceará avaliou dados de imunização e óbitos por Covid de pessoas com 75 anos ou mais. Os registros são de janeiro a 11 de maio

Escrito por Thatiany Nascimento , thatiany.nascimento@svm.com.br
vacina idosos
Legenda: Os resultados da pesquisa demonstram que as vacinas são altamente eficazes na redução do número de óbitos por Covid-19 em maiores de 75 anos
Foto: Camila Lima

Entre 17 de janeiro e 11 de maio de 2021, ao menos, 313 mil idosos com 75 anos ou mais tomaram a 1ª dose da vacina contra a Covid-19 no Ceará. E, nesse intervalo, 159 mil tiveram acesso às duas doses. Destes, 111 idosos com o ciclo de imunização completo morreram de Covid. Uma proporção de 0,07% do total. Outros 40,9 mil não foram vacinados, e desses, 3,7 mil também faleceram devido à doença. Uma taxa bem maior, de 9,21%. 

O achado consta em um estudo feito por pesquisadores no Ceará, publicado em julho na revista científica internacional Tropical Medicine and Infectious Disease. No artigo, o grupo evidencia que a taxa de ocorrência de óbitos entre os idosos não vacinados foi 132 vezes maior se comparados aos que receberam duas doses da vacina no intervalo de tempo analisado.  

O artigo conclui que “as vacinas SARS-CoV-2 são altamente eficazes na redução do número de mortes relacionadas à Covid-19 em maiores de 75 anos”.

A pesquisa foi produzida por integrantes da Faculdade de Medicina da Pós-Graduação em Saúde Pública e da Pós-Graduação em Patologia, ambas da Universidade Federal do Ceará (UFC), do Centro Universitário Christus, e da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa). Dentre os pesquisadores está a secretária executiva de Vigilância e Regulação da Saúde do Ceará, Magda Almeida, também vinculada à UFC. 

Veja também

Conforme já mostrado pelo Diário do Nordeste, as vacinas contra a Covid são capazes de reduzir o risco de desenvolver quadros graves da doença, mas não eliminam completamente a possibilidade de contágio, e mesmo após a imunização, independentemente de qual fabricante seja, é possível haver contaminação, internação e até óbito. Contudo, como demonstra o estudo, a frequência de mortes é muito menor do que entre os não vacinados.

Como o estudo foi feito? 

No artigo, os pesquisadores explicam que foram utilizados dados secundários das bases do Sistema Nacional de Mortalidade (SIM) que registra os óbitos ocorridos no Brasil, e do Programa de Imunizações (SIPNI), no qual há a contabilização das doses das vacinas aplicadas, ambos da base estadual. Os dados são referentes aos dias 17 de janeiro a 11 de maio de 2021 e a utilização deles foi autorizada pela Sesa. 

O cálculo usou também o número da população estimada nesta faixa etária para o Estado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que é de 354.269 idosos com 75 anos ou mais.  O número de pessoas não vacinadas, dizem os autores, foi calculado como a diferença entre a população estimada e o número de indivíduos vacinados.

dados pesquisa
Legenda: Dados analisados e apresentados no artigo pelos pesquisadores no Ceará

No tratamento das informações, “as bases de dados foram probabilisticamente relacionadas por meio de nomes de pessoa e respectivas datas de nascimento”, diz a publicação. Isso com o uso de software para essa finalidade. No artigo também consta o tipo de vacina recebida, se Coronavac ou Astrazeneca. 

As vacinas da Pfizer começaram a chegar no Ceará no dia 3 de maio, quando a grande maioria dos idosos da faixa etária pesquisada já estava vacinada por terem sido priorizados no Plano Nacional de Imunização contra a Covid. 

Evidência de proteção da vacina

“Para essa população (pessoas com 75 anos ou mais), as vacinas trouxeram uma elevada proteção para o óbito. Mas esse valor só foi alcançado após a aplicação das duas doses. Com apenas uma dose o valor de proteção foi de apenas 19,3 vezes maior", ressalta o professor do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da UFC, Carlos Henrique Alencar, um dos integrantes da pesquisa. 

O artigo é assinado também pelos pesquisadores Luciano Pamplona, Patrícia Pereira Lima, Kellyn Kessiene de Sousa, Déborah Nunes de Melo, Bruno Cavalcante Fales e Jorg Heukelbach.

O professor Carlos Henrique acrescenta que esses valores são fundamentais para "comprovar que a vacinação contra a Covid realmente salva vidas e é necessário que todas as pessoas busquem pelas duas doses”. 

No artigo, os pesquisadores abordam a taxa de proteção, que, segundo Carlos, indica quantas vezes a proteção para o óbito foi maior no grupo vacinado se comparada aos não vacinados.

“Nossos resultados mostraram que uma pessoa entre 80 e 89 anos de idade vacinada com apenas uma dose tem uma proteção 35 vezes maior para o óbito se comparado a uma pessoa dessa mesma faixa etária não vacinada”. 
Carlos Henrique Alencar
Professor do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da UFC

Mas, esclarece ele, esse valor pode ser aumentado em pelo menos 100 pontos se a pessoa for vacinada com as duas doses. 

Outro ponto é a taxa de proteção atribuível que, explica Carlos, “representa a proporção de pessoas que seriam salvas caso toda a população tivesse recebido a vacina”. Nesse caso, “se todas as pessoas acima dos 75 anos fossem vacinadas, haveria uma redução em 99,2% no número de óbitos por Covid-19”, diz o professor. 

Além disso, os valores evidenciam que as taxas de proteção constatadas para os dois imunizantes avaliados são semelhantes. “Esses dados indicam que as duas vacinas tem elevada proteção para redução de óbitos, não havendo necessidade de ‘escolha’ de vacina”, garante.

Continuidade da pesquisa

Questionado se haverá alguma continuidade de análise dos dados com esse foco nas demais faixas etárias da população do Ceará, o professor diz que a equipe está “organizando a base e dados para seguir com as análises para outras faixas etárias e, mais importante ainda, ter dados mais robustos para as outras vacinas utilizadas, como a Pfizer e Jansen”. 

vacina idosos
Legenda: A taxa de proteção abordada no artigo indica quantas vezes a proteção para o óbito foi maior no grupo vacinado se comparada aos não vacinados
Foto: Camila Lima

Além dos óbitos, os pesquisadores, informa ele, também irão trabalhar com os dados de internação e falha vacinal. Ele ressalta que houve o apoio da Sesa e “essa parceria tem trazido ganhos para a sociedade, pois consegue levar informações mais detalhadas a todos e a continuidade deste estudo poderá direcionar as políticas de saúde no nosso Estado”.

População acima de 90 anos

Uma das ponderações quanto à pesquisa, explica o professor, é que ela tem limitações devido ao uso de dados secundários. “Além disso, neste estudo não foram realizados testes sobre a resposta de anticorpos dentre os vacinados.

No entanto, "o fato de se ter usado dados populacionais de uma parcela da população que, na época, estava com maior cobertura vacinal faz com que os resultados sejam robustos ao nível populacional”, acrescenta. 

Outro fator é que a população de pessoas vacinadas acima de 90 anos foi superior à população estimada pelo IBGE para essa faixa etária. Isso, diz o artigo, se deve ao último censo ter sido realizado em 2010.

“Utilizou-se a projeção populacional para o ano de 2021, mas ainda havia uma diferença de mais de 1.900 pessoas vacinadas na população com mais de 90 anos de idade. A população estimada foi ajustada à população vacinada e, portanto, os dados devem ser interpretados com cuidado”, afirmam no estudo. 

 

Assuntos Relacionados