Hospital Universitário cria 'tenda' de proteção para evitar contaminação por Covid-19 em cirurgias

Uma equipe multidisciplinar do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), desenvolveu uma “tenda” capaz de barrar gotículas e gases contaminados durante cirurgias respiratórias.

Escrito por João Lima Neto , joao.lima@svm.com.br
Legenda: Dispositivo ganhou destaque em revista cientifica estrangeira
Foto: Foto: Divulgação/HUWC

Com o avanço da Covid-19 no Ceará, qualquer ideia para evitar a proliferação do coronavírus entre pacientes e profissionais de saúde é bem-vinda. Com essa preocupação, uma equipe multidisciplinar do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), desenvolveu uma “tenda” capaz de barrar gotículas e gases contaminados durante a realização de cirurgias respiratórias. O dispositivo é usado desde março, inicialmente de forma experimental. O equipamento é utilizado em intervenções de pacientes que testaram positivo para a Covid-19 e também naqueles sem a doença. 

De acordo com os cirurgiões de cabeça e pescoço, Márcio Studart e Wellington Alves, e a enfermeira Eliane de Paula, chefe do Centro Cirúrgico e da Sala de Recuperação, o dispositivo, intitulado de Covid-Box, é composto por uma armação de aço inox esterilizável, que é colocada sobre o paciente, posteriormente recoberto com um campo plástico descartável de gramatura alta (90g/m2), também estéril.

“O equipamento forma, portanto, uma caixa transparente estéril. Através de aberturas laterais realizadas pelos próprios cirurgiões, é possível ter acesso ao campo cirúrgico. Dessa forma, tanto ergonomia como segurança são preservados”, explica o cirurgião Márcio Studart. 

Em um dos casos usados, um paciente com infecção bacteriana precisou de uma traqueostomia após várias semanas entubado. Durante a realização da intervenção cirúrgica, o dispositivo foi utilizado. Os médicos realizaram cortes nas laterais do plástico esticado sobre a estrutura de aço. De luvas e com todos a instrumentação desinfectada, eles fizeram a intervenção normalmente.

O médico otorrinolaringologista André Alencar Araripe Nunes, Chefe da Unidade de Cabeça e Pescoço do HUWC, explica que o Covid-Box oferta a mesma mobilidade dos profissionais durante as cirurgias. “As partículas de gás ou gotículas são eliminadas no ar ao realizar, por exemplo, cortes na garganta de um paciente. Com a Covid-Box, ao invés desse material se espalhar dentro da sala de cirurgia, fica retido no plástico. É possível ver as gotas geradas pelo paciente”.

Legenda: Médicos possuem a mesma mobilidade de uma cirurgia sem o dispositivo
Foto: Foto: Divulgaçaõ/HUWC

O cirurgião Wellington Alves explica que a equipe, além de traqueostomias em pacientes infectados, vem também utilizando o dispositivo para outros procedimentos cirúrgicos geradores de aerossóis que ficam em suspensão no ar e sobre superfícies. “Mais recentemente, realizamos uma glossectomia parcial (remoção cirúrgica de parte da língua em função de câncer agressivo) e uma ressecção de osso temporal (tipo de cirurgia de base de crânio) utilizando o protótipo, não havendo prejuízo técnico em virtude da sua utilização”, ressalta o especialista.

Baixo custo

Outro ponto positivo do Covid-Box, apontado pelo otorrinolaringologista André Alencar, é o custo acessível do protótipo. Ele pode ser replicável em outros cenários de hospitais públicos e privados. No HUWC, a produção conta com a apoio de um empresa local que não está cobrando nada para construir as peças de aço. Já o plástico é comprado pelo HUWC e possui um valor muito baixo. Ao mesmo tempo, o médico conta que está buscando parcerias com a indústria local para a produção em larga escala a fim de ajudar outras unidades de saúde do Estado.

O cirurgião de pescoço e cabeça Márcio Studart espera que o dispositivo possa ser replicado por vários hospitais do Brasil e de outros países, já que as peças utilizadas são de baixo custo. "Nosso desejo é que a ideia seja utilizada em países em desenvolvimento. Existe muitos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) no mundo, mas se fala muito pouco da proteção coletiva. Eles são muito mais lógicos e tem uma eficiência muito maior. A Covid-Box serve nesse sentido. Nem toda unidade hospitalar pode ter, por exemplo, uma sala com pressão negativa. O dispositivo ameniza a proliferação da doença”.

Um  artigo sobre o desenvolvimento e aplicação do Covid-Box foi aceito pela revista Auris Nasus Larynx, importante periódico internacional na área de otorrinolaringologia/cirurgia de cabeça e pescoço. A revista liberou um link da prévia da publicação para ajudar pesquisadores e profissionais de saúde na linha de frente da pandemia ao redor do mundo. 

Segurança

A enfermeira Eliane de Paula conta ainda que, no HUWC, foi criada uma força-tarefa intitulada “Time de Vias Aéreas Cirúrgicas – Covid-19”, com o objetivo de oferecer protocolos para realização de traqueostomias em pacientes suspeitos ou confirmados com o novo coronavírus, como também para dar suporte às intubações difíceis que vêm sendo realizadas com frequência. A equipe é formada por cirurgiões gerais, torácicos e de cabeça e pescoço, otorrinolaringologistas e profissionais de enfermagem do Centro Cirúrgico. “O Serviço de Anestesiologia do HUWC também tem usado o covid-box para intubação de pacientes”, acrescenta.

Na avaliação do gerente de Atenção à Saúde do HUWC, Arnaldo Peixoto, “a procura por meios mais acessíveis de proteger o profissional de saúde é extremamente importante, principalmente no contexto atual. O uso de dispositivos de proteção em barreira, como o desenvolvido pela nossa equipe no HUWC, deve ser considerado como método de proteção coletiva, sobretudo em instituições públicas em países como o Brasil”. O otorrinolaringologista André Alencar adianta, inclusive, que está buscando parcerias com a indústria local para a produção em larga escala a fim de ajudar outras unidades de saúde do Estado.

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