Grupo cobra prioridade para vacinação contra Covid-19 de pessoas com doença rara no Ceará

Associação estima que cerca de 40 acometidos com amiotrofia muscular espinhal (AME) deveriam ser imunizadas no Estado; Sesa diz que pacientes entram na Fase 3 se tiverem deficiência permanente

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Lucas e Fátima lutam contra a doença degenerativa há quase duas décadas
Legenda: Lucas e Fátima lutam contra a doença degenerativa há quase duas décadas
Foto: Kid Junior

Cerca de 40 pessoas adultas com amiotrofia muscular espinhal (AME) estão aptas a tomar a vacina contra a Covid-19 no Ceará, de acordo com a Associação Brasileira de Amiotrofia Espinhal (Abrame). No entanto, a entidade afirma que, apesar do quantitativo baixo, o grupo ainda não foi atendido. 

A AME é uma doença genética rara que afeta a capacidade do indivíduo de caminhar, comer e até de respirar, atingindo um em cada 10 mil nascidos vivos. Ela é a maior causa genética de mortalidade infantil, de acordo com o Instituto Nacional da Atrofia Muscular Espinhal (Iname).

A diretora presidente da Abrame, Fátima Braga, ressalta que essas pessoas deveriam ser tratadas como prioridade porque são pacientes de altíssimo risco para quadros graves da Covid-19.

As comorbidades que esses pacientes carregam ao longo da vida, como hipertensão arterial, hipertensão pulmonar e pneumopatias, estão todas nos laudos. Não queremos furar fila, mas não podemos esquecer que é uma doença degenerativa que não tem cura”. 

A Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) informou em nota que as pessoas com AME só entram no grupo da 3ª fase da vacinação “se tiverem deficiência permanente, de acordo com o Plano Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde”.

Em nota técnica de setembro de 2020, a própria Sesa incluiu a AME num grupo de pessoas com deficiência propensas a maior risco de desenvolver quadro clínico grave por Covid-19.

“Como uma pessoa com doença degenerativa, que vive em ventilação mecânica, não tem comorbidade?”, ironiza a diretora da Abrame, lembrando que esses pacientes têm imunidade “extremamente baixa” e que, embora a maioria esteja em casa, muitos vivem em "UTIs domiciliares".

PERDAS MOTORAS

Lucas Braga tem 19 anos e seis meses de vida. Pouco depois de nascer, desde os três meses, vem respirando por um orifício na garganta por causa da AME. Com a locomoção restrita, ele ainda não tomou a vacina. A mãe, Fátima, já, por ser hipertensa, mesmo sem uma doença de base.

Lucas e Fátima
Legenda: Desde o início da pandemia, Lucas acumula diversas perdas no desenvolvimento motor e de fala que vinha apresentando com as terapias
Foto: Kid Junior

Desde o início da pandemia, Lucas acumula diversas perdas no desenvolvimento motor e de fala que vinha apresentando com as terapias, já que os encontros com profissionais precisaram ser suspensos para evitar o risco de contaminação. Hoje, quase não tem mais movimentos.

“A gente vive como se estivesse numa corda bamba”, confessa a mãe. “Não sabemos se ficamos, se saímos. Recentemente, ele precisou fazer um procedimento no olho e precisamos levá-lo numa capa transparente, literalmente dentro de uma bolha, para não ter contato”.

No Brasil, quase 5 mil pessoas têm AME, segundo a diretora da Abrame. Dessas, cerca de 30% estão aptas a tomar a vacina, já que a maior parte ainda é formada por crianças e adolescentes.

Segundo o presidente da Sociedade Cearense de Neurologia e neurologista infantil, André Luiz Santos Pessoa, adultos diagnosticados com AME possuem doenças permanentes e têm altíssimas chances de ter comorbidades, sejam elas respiratórias, digestivas, de locomoção e até disfagia, a dificuldade para deglutir. Todas essas condições devem ser levadas em consideração para que sejam vacinados o quanto antes. 

"Esses pacientes com AME na fase adulta têm comprometimento respiratório já estabelecido, que faz com que eles, caso sejam infectados, possam evoluir com formas respiratórias pior e com maior chance de gravidade", destaca. "Me estranha um pouco essa questão de eles não terem sido vacinados", comenta o profissional. 

FASE 3 DE VACINAÇÃO

Conforme o Plano Estadual de Operacionalização para Vacinação contra a Covid-19, pessoas com alguma deficiência permanente são contempladas na Fase 3 dos grupos prioritários, atualmente em curso.

Ao todo, a Sesa estima vacinar 406.137 indivíduos com esse perfil no Estado. De acordo com a plataforma Saúde Digital, 37.867 se cadastraram para receber o imunizante, até esta sexta-feira (14). Destas, 21.035 somente em Fortaleza. 

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