PM que executou jovem negro pelas costas após roubo de sabão já foi reprovado em exame psicológico

Teste realizado no concurso da PM de 2021 avaliou que Vinicius de Lima Britto apresentava descontrole emocional e impulsividade

Escrito por Redação ,
Execução de Gabriel Renan da Silva Soares
Legenda: Gabriel Renan da Silva Soares foi executado com 11 tiros após furtar sabão em mercado de São Paulo
Foto: Reprodução

O policial Vinicius de Lima Britto, que executou pelas costas um jovem negro em frente a um mercado na Zona Sul de São Paulo, foi reprovado no exame psicológico do concurso da Polícia Militar em 2021, quando tentou ingressar na corporação pela primeira vez. As informações foram divulgadas nesta quarta-feira (4) pelo g1

Gabriel Renan da Silva Soares, de 26 anos, foi atingido com 11 tiros pelas costas após furtar materiais de limpeza do supermercado e sair correndo. O caso aconteceu em 3 de novembro, mas voltou a repercutir essa semana após a divulgação das imagens de câmeras de vigilância do estabelecimento. O PM foi afastado das funções somente um mês após o crime.

Segundo o resultado da avaliação do concurso, Vinicius apresentou "inadequação" aos critérios exigidos no perfil psicológico para o cargo de soldado nos requisitos de: relacionamento interpessoal adequado, capacidade de liderança e descontrole emocional

A avaliação psicológica, de caráter eliminatório para o cargo, é uma das seis etapas do concurso público para o cargo de soldado de 2ª Classe na Polícia Militar de São Paulo. O teste é realizado por uma banca examinadora. 

Reprovado, Vinicius entrou com uma liminar contra a Fazenda Pública de São Paulo para contestar o resultado. A defesa ainda solicitou reintegração ao concurso e a produção de nova avaliação psicológica com um perito. Em agosto de 2022, no entanto, a juíza Lais Helena Bresser Lang, da 2ª Vara de Fazenda Pública, julgou improcedente o pedido e extinguiu o processo. Segundo a magistrada, a exclusão de Vinicius do concurso foi legal, já que ele foi considerado inapto para o trabalho no momento da avaliação.

Na sentença, a juíza explicou que o laudo psicológico que desclassificou Vinicius apresentou metodologia pautada em critérios técnicos e foi produzido por profissionais capacitados. A magistrada ainda ressalta que, no teste, Vinicius apresentou descontrole emocional, impulsividade, "tendendo agir fortemente por meio de condutas instáveis e imprevisíveis" e "podendo agir sem tanta reflexão diante de inesperadas".

Cerca de três meses após a extinção do processo, Vinicius foi aprovado em um segundo concurso para soldado da Polícia Militar. Questionada pelo g1, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo não respondeu sobre os motivos pelos quais Vinicius conseguiu a aprovação. 

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Legítima defesa

Dias após o crime, o assassinato de Gabriel foi denunciado nas redes sociais pelo tio da vítima, o rapper Eduardo Taddeo, do grupo Facção Central. Na publicação, Taddeo denuncia a violência policial contra jovens negros e periféricos e contesta a versão dada pelo PM de que agiu em legítima defesa

No boletim de ocorrência sobre o caso, Vinicius afirma que viu Gabriel roubando produtos do supermercado da rede Oxxo. Ao questionar o jovem, ainda conforme a versão do PM, ele teria dito que estava armado, colocando a mão dentro da blusa, razão pela qual o PM teria atirado.  

As imagens registradas pelas câmeras de segurança contradizem essa versão. O vídeo mostra quando Gabriel entra no mercado, pega quatro pacotes de sabão e tenta deixar o local correndo, mas escorrega próximo à porta e cai já do lado de fora da loja. Vinicius estava no caixa pagando pelas compras e, quando percebe a ação, sacou a arma e atirou contra o jovem, que já corria pela rua. Gabriel morreu no local. Foram identificadas 11 perfurações no corpo dele.

O caso foi registrado como morte decorrente de intervenção policial, resistência e tentativa de roubo no Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP). Um inquérito policial também foi instaurado.

"Está comprovado que a gente estava certo e ele mentiu em depoimento, porque ele diz que apresentou voz de prisão. Porém, quando ele [Gabriel] escorrega, ele já saiu atirando [...] Ele é um assassino", disse, na época, a advogada da família, Fatima Taddeo.

Afastamento

Na última segunda-feira (2), após a repercussão do vídeo, a SSP disse que afastou Vinicius de Lima Britto das funções e que o caso segue sob investigação pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). "As imagens mencionadas foram captadas, juntadas aos autos e estão sendo analisadas para auxiliar na apuração dos fatos", disse a pasta. 

No comunicado, a SSP afirma também que "familiares da vítima foram ouvidos e diligências estão em andamento para identificar e qualificar a testemunha que esbarrou na vítima durante sua fuga do estabelecimento comercial, momentos antes de ser alvejado. A Polícia Militar acompanha as investigações, prestando apoio à Polícia Civil. Caso as apurações apontem para a responsabilização criminal do policial militar, medidas administrativas serão adotadas, incluindo a possibilidade de processo disciplinar que poderá resultar na sua exclusão da Instituição". 

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