Saiba como evitar que o namoro se transforme em união estável

Ao contrário do namoro, a dissolução de uma união estável pode ensejar a partilha de patrimônio. Contrato de namoro é opção para protegê-lo

Legenda: A coabitação não é requisito necessário à configuração da união estável
Foto: Shutterstock

É namoro ou união estável? Quando um casal resolve compartilhar a vida, é tênue a linha que divide esses dois tipos de relacionamento.  

Por isso, quem deseja evitar que o próprio namoro venha a configurar uma união estável no futuro, almejando, sobretudo, proteger o seu patrimônio, deve estar a par do que diferencia cada uma dessas relações.  

Conforme o Artigo 1.723 da Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002, a união estável se caracteriza pela convivência pública, contínua e duradoura. Ao contrário do namoro, é estabelecida com o objetivo presente de constituição de família.  

“Para o Superior Tribunal de Justiça, o casal [em uma união estável] tem que querer constituir a família hoje. Ou seja, ser visto pelas pessoas e já se entender como uma família, como companheiros, e não como um mero casal de namorados”, distingue a advogada de Família, professora de Direito de Família e mestre em Direito,‎ Emília Lopes.  

O namoro, acrescenta ela, “não constitui família. É uma relação afetiva, mas não caracteriza uma relação familiar. Quando acaba, cada um vai pro seu lado”. Logo, como não há família, não se pode falar em partilha de bens. 

Nos casos em que o par de namorados tem um relacionamento prolongado, consolidado, mas planeja casar e ter filhos somente no futuro, ambos vivem o que é chamado de namoro qualificado, uma relação intermediária entre o namoro simples e a união estável. 

Coabitação   

Não é porque vive há anos sob o mesmo teto que um casal de namorados vai estar, automaticamente, mantendo uma união estável. A coabitação não é requisito necessário à configuração deste tipo de união. Inclusive, é possível mantê-la mesmo morando em casas separadas.

Entre 1994 e 1996, a união estável no Brasil chegou a se configurar a partir da convivência por um prazo mínimo de cinco anos. Mas, hoje, não há mais prazo mínimo na legislação. 

Assim como a coabitação, a convivência com filhos de relações anteriores e a divisão de um mesmo planejamento financeiro não são pressupostos capazes de determinar, individualmente, se a união é estável ou não. 

“Se um casal de namorados estiver financiando um imóvel ou tem uma conta conjunta, isso, por si só, não vai ter força suficiente para configurar a união estável. Pode ajudar? Pode. Mas vai depender de todos os outros elementos de prova que eu vou ter”, afirma Lopes. 

Caso os namorados morem juntos e acabem tendo um filho, também não é obrigatoriamente estabelecido o regime de união estável, pois é preciso que se cumpram na relação todos os requisitos previstos em lei, citados anteriormente. 

Contrato de namoro  

Formalização de um contrato de namoro
Legenda: O contrato de namoro é um contrato entre duas pessoas, registrado em cartório, em que elas afirmam ter apenas um namoro. E tem por objetivo afastar a incidência da união estável e proteger os bens das partes que forem adquiridos ao longo do namoro
Foto: Shutterstock

Uma opção “segura” e palpável para proteger o patrimônio de um casal é o contrato de namoro, indica a advogada do Direito das Famílias, doutora em Direito Constitucional e professora de Direito na Universidade de Fortaleza, Dayse Braga Martins. 

O documento tem validade jurídica e prazo determinado pelas próprias partes. A partir dele, o casal confirma o vínculo emocional, mas deixa claro que não pretende constituir família ou dividir os bens, em caso de término da relação.

Pode servir, portanto, como prova para evitar o reconhecimento da união estável e seus efeitos. Isso, claro, se alguma das partes vier um dia a alegar que vivia uma união estável, quando o relacionamento se resumia apenas a um namoro. 

Para Martins, o contrato é o "caminho mais seguro", especialmente para pessoas mais velhas, com patrimônio já constituído, e que desejam preservá-lo para seus filhos de relações anteriores.

“No namoro vou me proteger de [pagar] uma pensão alimentícia [a um(a) ex-companheiro (a)], de uma partilha de bens e não vai ter efeito sucessório. O contrato de namoro é feito por uma escritura pública e nele você deve dizer exatamente o que quer. Se quiser, ainda pode incluir alguma cláusula”, orienta Martins. 

Segundo a advogada, cresceu o número de casais que recorrem aos contratos de namoro. No entanto, por conta do desconhecimento e por ser uma medida preventiva interpretada como "medida de desamor", sua utilização ainda é "incipiente". 

Para formalizar o documento, o casal pode pedir o auxílio de um advogado especialista em Direito de Família ou ir diretamente ao cartório de notas, onde um tabelião vai lavrar a escritura pública.

Limitações jurídicas

Legenda: O contrato de namoro é válido, mas tem limitações jurídicas
Foto: Shutterstock

Embora o contrato de namoro tenha validade, ele também possui limitações jurídicas que podem anular os seus efeitos práticos. 

Se, ao longo do tempo, o casal que fez o contrato publiciza o relacionamento e passa a ser visto como uma família, mantendo uma convivência duradoura, contínua, se vendo como companheiros e com desejo atual de ter filhos, o namoro vai inevitavelmente configurar uma união estável. 

Por consequência, o documento perderá sua eficácia. "A configuração da união estável está prevista em lei e isso vai ser sim superior ao que está naquele contrato. O juiz não vai poder afastá-la porque é uma situação que está presente", endossa Emília Lopes.

A união estável, ressalta a advogada, é uma norma de ordem pública e, por isso mesmo, "tem que ser cumprida independentemente da vontade das partes". E o contrato de namoro, por sua vez, "não é garantia de que vai ser possível afastar a união estável".