Suposto novo líder de facção em Caucaia é solto pela Justiça

Mardônio Maciel Vasconcelos, o 'MRD', teria assumido o comando do tráfico de drogas na região após a prisão de Cilas e a morte de Darlan, líderes do grupo. Prisão em flagrante não foi homologada ou convertida um mês depois

Escrito por Cadu Freitas , cadu.freitas@svm.com.br

Os dois principais líderes de uma facção de origem carioca, que domina boa parte do território da cidade de Caucaia e gerencia o tráfico de drogas na região, já não podem mais arbitrar como devem ser feitas as movimentações ou decretar quem vive ou morre. O número um, Francisco Cilas de Araújo Moura, o 'Mago', está preso. O número dois, Alban Darlan Batista Guerra, morreu em uma operação policial no Rio de Janeiro. Mas era de se esperar que alguém assumisse a dianteira e começasse a responder pela chefia em seus lugares.

A Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) já o identificou. De acordo com uma denúncia anônima, recebida em 31 de julho deste ano, o novo dirigente da facção em Caucaia responde pela alcunha 'MRD', as primeiras consoantes do primeiro nome de Mardônio Maciel Vasconcelos. Ele foi preso no mesmo dia da denúncia, mas o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) o concedeu liberdade.

A 3ª Câmara Criminal do TJCE decidiu, por unanimidade, no último dia 4 de setembro, confirmar a sua liberdade, após a advogada do suspeito tê-la requerido em razão do excesso de prazo para análise da prisão em flagrante. Isso porque a 2ª Vara Criminal da Comarca de Caucaia, declinou da competência para julgá-lo e enviou à ação à Vara de Delitos de Organizações Criminosas, sem ter homologado a prisão ou convertido-a em preventiva.

"Considerando que a prisão em flagrante se caracteriza pela precariedade, de modo a não permitir-se a sua subsistência por tantos dias sem a homologação judicial, ou sua conversão em prisão preventiva, identifico manifesta ilegalidade na omissão apontada", escreveu o desembargador relator da ação na Câmara Criminal. Segundo o magistrado, "resta configurado o constrangimento ilegal por excesso de prazo da prisão em flagrante".

Em nota, o TJCE afirmou que o juízo de Caucaia seguiu manifestação do Ministério Público do Ceará (MPCE) para declinar da competência "por se tratar de suposto envolvimento com organização criminosa". Segundo o órgão, o entendimento era de que só era preciso fazer a audiência de custódia, que está suspensa em todo o Brasil em razão da pandemia do coronavírus.

Conforme o Tribunal de Justiça, "trata-se de entendimentos diferentes e que podem servir de jurisprudência para outros casos semelhantes. Portanto, não se trata de omissão de magistrado, haja vista que proferiu decisão, mas de entendimento diferente para uma determinada situação".

Histórico

Agora, Mardônio Maciel deve responder ao processo criminal em casa e com tornozeleira eletrônica. Além disso, a Justiça determinou que ele se apresente mensalmente, não frequente bares ou locais com venda de bebidas alcoólicas, não se ausente de Caucaia e fique retido em casa entre 20h e 6h, todos os dias. A questão é que o gerenciamento do tráfico de drogas do grupo criminoso pode ser feito de sua própria residência, conforme a Draco observou no ato da prisão do suposto novo chefe da facção, em julho.

A denúncia anônima encaminhada ao Núcleo de Inteligência da delegacia especializada apontou que Mardônio estava responsável por cuidar dos negócios criminosos de Darlan, inclusive antes da sua ida ao Rio de Janeiro. De acordo com a denúncia, Darlan teria passado a seguinte mensagem aos seus subordinados: "o que for falado pelo 'MRD' é com a minha voz e a do Cilas e vai ser cobrado quem desconsiderar. 'MRD' tem a minha voz na quebrada, não quero 'cabuetagem' e nem 'pirangagem', apenas quero o progresso pelo certo".

Quando foi detido, no mesmo dia da denúncia, Mardônio já estava tornozelado e, em sua casa, foi apreendido um caderno, o qual teria, de acordo com os investigadores, anotações que revelam o controle do tráfico de drogas da região. O caderno apresenta nomes de possíveis intermediadores da venda de entorpecentes, com seus respectivos débitos e créditos nas mãos do suposto novo líder.

Em uma das páginas, havia escrito: "Na terça, Redbull deu um AV de 'milho' R$ 1400; deu um AV do 'café' de R$ 700. Segundo a Polícia Civil, 'milho' e 'café' são termos utilizados na prática de crime de tráfico de drogas para se referir, respectivamente, a cocaína e maconha. As expressões 'amarela' e 'leite' também se referem à cocaína, de acordo com os investigadores. No caderno apreendido, há a relação de, pelo menos, 14 pessoas distintas com respectivos recebimentos de entorpecentes e valores financeiros.

'MRD' também aparece em um outro caderno apreendido pela Polícia Civil quando da prisão do então chefe do grupo na Caucaia, o 'Mago'. Conforme o relatório da Draco, o objeto comprova que Mardônio teria recebido do líder da facção 100 gramas de cocaína em cada uma das duas entradas que aparecem no caderno. Embora seja uma quantidade pequena, na tabela disposta pela Polícia Civil, Mardônio seria um dos que receberam menos do então chefe naquelas duas remessas.

Em depoimento quando foi preso, em 31 de julho, Mardônio Maciel negou ser integrante do grupo criminoso e afirmou que "apenas mora no bairro dominado pela referida facção". 'MRD' ainda ressaltou que não conhece Darlan ou Cilas, não usa drogas e não as vende. De acordo com o indiciado, "as anotações apreendidas na casa já estavam lá", pois ele havia se mudado para lá havia "apenas cinco dias e não limparam o local".

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