Saiba como empresários e PMs comandavam esquema de casas de jogos de azar ilegais em Fortaleza

O MP acusou os militares de receberem propinas e fazerem segurança dos estabelecimentos. Atualmente, todos os policiais alvos das operações estão em liberdade

Escrito por Redação , seguranca@svm.com.br
bingo centro
Legenda: Dezenas de casas de jogos de azar foram fechadas na capital nos últimos anos
Foto: José Leomar

O grupo de policiais militares acusado de participar ativamente de um esquema de corrupção que envolvia casas de apostas ilegais, como jogo do bicho, bingos e caça-níqueis no Centro de Fortaleza, vai a audiência. No próximo dia 10 de fevereiro, os PMs devem ser interrogados durante dessão que acontecerá por videoconferência. Todos estão em liberdade atualmente.

Todos os servidores foram alvos da Operação Jericó, deflagrada pelo Ministério Público do Ceará (MPCE), no ano de 2020. A reportagem teve acesso a documentos que detalham como se dava a participação dos agentes da Segurança Pública Estadual na quadrilha que "praticou diversas infrações penais para proteger sua atividade principal, a exploração de jogos de azar", conforme o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco).

Os militares Wladimir Gomes Bezerra, Abdoral de Sousa Aguiar, Antônio Marcos Moura de Oliveira, Francisco José Barbosa, Roberto Paulo da Silva, Geldson Coelho de Araújo, João Bosco da Costa Filho e Francisco Flávio Cosme Campos foram denunciados pelo órgão acusatório por supostamente receberem propina de empresários e, por vezes, serem responsáveis pelo forte aparato de segurança que envolvia a organização criminosa.

Para o MPCE, os áudios captados por meio de interceptação telefônica autorizada pela Justiça demonstram uso de fraude por parte da organização criminosa com relação às máquinas de jogos,  já que os resultados dessas apostas deixam de depender exclusivamente da sorte ou da habilidade do jogador, porque são adulteradas. 

A partir da Operação Jericó foi descoberta uma rede de policiais corruptos e o Ministério Público conseguiu deflagrar uma segunda operação, denominada como 'Bet'.


Consta na denúncia que os líderes das casas de jogos de azar foram identificados como: João Júnior Rocha, Antônio Vamberto de Oliveira, Sandro Tavares Silva e Rogério Freitas de Aguiar. "Eles possuíam uma rede de colaboradores composta por técnicos e programadores de máquinas, cambistas, seguranças, informantes, caixas, além de policiais civis e militares que mediante recebimento de propinas mantinham a atividade ilegal fora de qualquer fiscalização ou embaraçamento por parte das autoridades competentes".


"A exploração destes jogos de azar tem como principais clientes uma parcela mais vulnerável da população, em sua grande maioria idosos e viciados em jogos, que empregam muitas vezes toda sua renda mensal nessas jogatinas"
Gaeco

A participação de PMs neste tipo de negociata vem se repetindo nos últimos anos. Na última semana, dois militares chegaram a ser detidos sob suspeita de fazerem segurança para um empresário envolvido com casa de jogo de azar em Fortaleza. Além da dupla, um guarda municipal foi capturado e levado à Delegacia de Assuntos Internos (DAI). 


PARTICIPAÇÕES DETALHADAS

Os investigadores passaram meses acompanhando a rotina dos PMs suspeitos das Operações 'Jericó' e 'Bet'. Em uma das investidas do policial Wladimir para recebimento de propina, agentes da Coordenadoria de Inteligência (Coin) o acompanharam e capturaram imagens de Wladimir saindo do local onde supostamente foi receber propina. 

bingo pms
Legenda: A imagem foi anexada ao processo
Foto: Reprodução

As ligações interceptadas pelas autoridades fomentaram a investigação. De acordo com a denúncia, foi percebido que no caso de Abdoral, especificamente, para além do recebimento de propinas ele se revelou homem de confiança para outras questões, "como no dia que policiais civis bateram na porta do bingo e pediram para Abdoral resolver".

Conforme a acusação, no caso de Roberto Paulo da Silva foi comprovada a sua função de abastecer o grupo liderado pelos donos do bingo com informações privilegiadas, acerca de possíveis operações policiais que viessem a atrapalhar as negociatas. O MP localizou conversa na qual Roberto avisa Anderson acerca de um momento ruim, aconselhando que ele fica atento porque a polícia está "indo em cima de tudo".

Já sobre os outros denunciados, os promotores concluíram que eles recebiam propinas para manter os estabelecimentos em funcionamento e longe dos "olhos do Estado".


ONDE ESTÃO OS MILITARES ATUALMENTE

Nos meses de maio e junho do ano passado, o Judiciário expediu alvará de soltura para os agentes acusados. Todos continuam afastados das suas funções dentro da Corporação, de acordo com a Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD).

O advogado Manuel Micias, que representa os policiais Abdoral, Francisco José, João Bosco e Francisco Flávio pontua que a acusação, a princípio, é de certa gravidade por se tratar de uma conduta que não se espera dos agentes de Segurança Pública. No entanto, segundo a defesa, não há provas suficientes para levar os agentes à condenação.

"Apesar de todo o auê do Ministério Público, não há uma única testemunha que aponte particpação direta ou indireta, mínima que seja, dos policiais nesta tramoia dos jogos de azar no centro da cidade", acredita a defesa.

"O interrogatório é o último ato e ao caminhar da carruagem não resta outro caminho a não ser a absolvição dos meus clientes e dos demais, porque não vejo acusação com certa força que legitime decisão no sentido de condená-los"
Manuel Micias
Advogado de defesa

Marcus Luna, responsável pela defesa do policial Wladimir Gomes, também diz que "a defesa se mantém confiante que a justiça será realizada, e que todos serão inocentados das equivocadas acusações imputadas".

Por nota, a CGD também informou que instaurou processos disciplinares para devida apuração na seara administrativa, estando estes, atualmente, em fase de instrução. 

Veja também

 

 

Assuntos Relacionados