Essa vitória não é só das Mães do Curió, é dos nossos jovens, diz mãe de vítima da Chacina do Curió

Edna Carla Souza lembra que a luta não terminou, pois ainda faltam outros acusados serem julgados.

Escrito por Beatriz Irineu ,
chacina curió
Legenda: Edna Carla Souza (centro) disse que a sentença traz um sentimento de Justiça
Foto: Fabiane de Paula

Uma das principais vozes na luta por Justiça pelas vítimas da Chacina do Curió, Edna Carla Souza Cavalcante, mãe do jovem Álef Souza Cavalcante, morto aos 17 anos, afirmou que a vitória pela condenação a mais de 1.100 anos dos quatro policiais militares réus, não é "exclusivamente" do movimento Mães do Curió. "Essa vitória é da nossa periferia, é do nosso povo periférico, é dos nossos jovens. É libertar os jovens das mortes, é libertar esses jovens das mortes."

Apesar do sentimento vitorioso, Edna lembrou que a luta não terminou. "Ainda não está tudo resolvido porque tem os outros (policiais) né? Mas sim é uma alegria. É uma alegria sim porque a gente não quer o mal da polícia. A gente quer apenas a condenação de quem praticou um crime bárbaro com onze pessoas e deixou sete feridos."

Veja também

AS VÍTIMAS MORTAS NA CHACINA

  • Álef Souza Cavalcante, 17 anos
  • Antônio Alisson Inácio Cardoso, 16 anos
  • Francisco Elenildo Pereira Chagas, 40 anos
  • Jardel Lima dos Santos, 17 anos
  • Jandson Alexandre de Sousa, 19 anos
  • José Gilvan Pinto Barbosa, 41 anos
  • Marcelo da Silva Mendes, 17 anos
  • Patrício João Pinho Leite, 16 anos
  • Pedro Alcântara Barroso do Nascimento Filho, 18 anos
  • Renayson Girão da Silva, 17 anos
  • Valmir Ferreira da Conceição, 37 anos.

PRÓXIMOS JULGAMENTOS

Outros dois júris com réus da Chacina do Curió ainda devem acontecer neste ano. No dia 29 de agosto de 2023 mais oito acusados também irão a julgamento. A terceira sessão está prevista para 12 de setembro de 2023, quando outros oito réus devem ser julgados.

JUSTIÇA

A mãe de Alef também agradeceu ao Ministério Público, pelo trabalho incansável, à Defensoria Pública, por meio da Rede Acolhe, e a todos os movimentos sociais. Ela disse ainda que a sentença traz um sentimento de Justiça. "Isso é Justiça, é Justiça", reforçou.

"Pela primeira vez dentro do estado do Ceará a gente vê policiais condenados e saindo presos e também sendo exonerados dos seus cargos. Era isso que a gente gritava".
Edna Carla Souza
Mãe do adolescente Álef Souza, uma das vítimas da Chacina do Curió

Durante sua fala, Edna lembrou do choro diário pelos filhos que tiveram os "sonhos enterrados", assim como as mães e familiares. "A gente chorava porque os nossos filhos, todos os sonhos deles foram enterrados e os nossos sonhos também foram enterrados. E não era justo a gente continuar pagando, não é justo a gente continuar pagando a bala que matou nossos filhos. Não é justo a gente continuar pagando pessoas que a gente confia, ou seja, eu confiava. E eu acredito que todas as mães confiavam (na Polícia), todos os familiares confiavam antes e fizeram esse crime bárbaro".

Por fim, reforçou que a condenação dos réus não é somente pelas 11 vítimas, mas por toda a periferia. "É de vocês, é de vocês, é da nossa periferia, é do nosso povo. Nosso povo periférico precisava disso. Eles precisavam dessa resposta. É do movimento Mães da Periferia, também, a qual eu sou co-fundadora", concluiu.

Ministério Público

O procurador geral de Justiça, Manuel Pinheiro, destacou a dedicação e o trabalho dos promotores em todo o caso, assim como nos últimos cinco dias. Pinheiro também falou sobre o que achou da condenação. “A justiça foi feita no caso concreto, com uma condenação bem fundamentada na prova dos autos. Essa sentença é a realização da justiça, é a resposta civilizada para a barbárie que foi a Chacina do Curió. A justiça não apaga a dor dessas famílias, mas ela traz paz, paz no presente e paz no futuro para essas comunidades que viveram tanto tempo sob os signos da incerteza e do medo”, destacou.   

Veja as penas dos PMs: 

  • Wellington Veras Chaves: 275 anos e 11 meses de prisão por 11 homicídios; três tentativas de homicídios e quatro crimes de tortura. Regime: inicialmente fechado. Prisão decretada: não poderá recorrer da decisão em liberdade. Condenado também a perda do cargo de policial militar
  • Ideraldo Amâncio: 275 anos e 11 meses de prisão por 11 homicídios; três tentativas de homicídios e quatro crimes de tortura. Regime: inicialmente fechado. Prisão decretada: não poderá recorrer da decisão em liberdade. Condenado também a perda do cargo de policial militar
  • Antônio José de Abreu Vidal Filho: 275 anos e 11 meses de prisão por 11 homicídios; três tentativas de homicídios e quatro crimes de tortura. Regime: inicialmente fechado. Prisão decretada: não poderá recorrer da decisão em liberdade. Condenado também a perda do cargo de policial militar. Caso tenha desertado, fica prejudicada essa decisão. Como está nos Estados Unidos com a esposa,  os juízes determinaram que ele seja incluído na lista de difusão vermelha da Interpol.
  • Marcus Vinícius Sousa da Costa: 275 anos e 11 meses de prisão por 11 homicídios; três tentativas de homicídios e quatro crimes de tortura. Regime: inicialmente fechado. Prisão decretada: não poderá recorrer da decisão em liberdade. Condenado também a perda do cargo de policial militar

Defensoria Pública

A defensora pública Elisabeth Chagas destacou o papel da Defensoria Pública no caso desde o início e afirmou que a atuação como assistente da acusação foi também em defesa da vida. "A Defensoria acompanha esse caso desde o início, desde o momento da entrega dos laudos (cadavéricos). Cada vez que as mães precisavam de respostas, nós estávamos ali para agilizar aquelas entregas. A gente atuou como assistente de acusação em defesa da vida, em defesa desses sobreviventes, em defesa dessas pessoas que se foram, em defesa dessas mães que lutam todos os dias pra ter respostas a respeito do caso delas".

A defensoria espera que essa condenação seja um símbolo pra que fatos como a Chacina do Curió não aconteçam novamente. "Pra que esses corpos negros e das periferias sejam respeitados", afirmou.

Defesa

Os advogados Alberto Duarte. Talvani Moura, Abedias Carvalho, representantes do réu Ideraldo Amâncio afirmaram que a condenação é um erro judicial que deve ser reparado com o recurso. "A decisão dos jurados, embora a gente respeite ela contrariou a prova dos autos", afirmaram.
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