Ex-diretor de fundação é suspeito de mandar matar enfermeira por queima de arquivo em Fortaleza

Crime seria 'a solução encontrada para silenciá-la a respeito de informações privilegiadas envolvendo a Fundação Leandro Bezerra de Menezes e o processo em que esta estava sendo investigada na cidade de Juazeiro do Norte', segundo a Justiça Estadual

Escrito por Messias Borges , messias.borges@svm.com.br
Jandra Mayandra da Silva Soares era enfermeira e gerente administrativa de um hospital
Legenda: Jandra Mayandra da Silva Soares era enfermeira e gerente administrativa de um hospital
Foto: Reprodução

Um ex-diretor de uma fundação que administra unidades de saúde no Ceará é investigado pela Polícia Civil do Ceará (PCCE) por suspeita de mandar matar a enfermeira Jandra Mayandra da Silva Soares, de 36 anos, em Fortaleza, em maio deste ano. A informação foi publicada pela 5ª Vara do Júri de Fortaleza no Diário da Justiça Eletrônico (DJE) da última quinta-feira (25). O processo tramita sob sigilo de justiça.

Conforme o DJE, um relatório de investigação apontou "como motivação do crime o cargo que a vítima Jandra ocupava no hospital (Hospital Doutor Osvaldo Cruz), que sua morte, possivelmente, foi a solução encontrada para silenciá-la a respeito de informações privilegiadas envolvendo a Fundação Leandro Bezerra de Menezes e o processo em que esta estava sendo investigada na cidade de Juazeiro do Norte".

O ex-diretor da Fundação Leandro Bezerra de Menezes é investigado como mandante do crime. O documento detalha que a Polícia constatou uma inconsistência no depoimento prestado pelo investigado e cumpriu um mandado de busca e apreensão contra ele. Segundo o DJE, ele "foi o Diretor responsável pela contratação da vítima na Fundação Leandro Bezerra de Menezes como no atual hospital onde esta (vítima) trabalhava". A reportagem não publicará o nome do suspeito porque ele não foi preso nem indiciado, até o momento.

A 5ª Vara do Júri autorizou aos investigadores o acesso ao conteúdo (dados telefônicos, notadamente de agenda, histórico de ligações, mensagens de texto via SMS ou aplicações de bate-papos, arquivos com imagens, áudios e vídeos, e-mails, redes sociais, histórico de navegação de internet e localização) do aparelho eletrônico apreendido com o suspeito.

A reportagem procurou a Fundação Leandro Bezerra de Menezes e o suspeito do crime, através da Ouvidoria do Órgão, para comentar a investigação, mas não recebeu resposta até a publicação desta matéria. Os outros telefones fornecidos pela Organização Social, em seu site, não recebem ligações. A defesa do ex-diretor no processo criminal não foi localizada.

[Atualização: 30/07/2024, às 14h22] Após a publicação da reportagem, a Fundação Leandro Bezerra de Menezes enviou nota em que afirma que "o então diretor mencionado não faz mais parte da instituição desde 2021. A Fundação repudia veementemente qualquer ato de violência e está à disposição da Justiça para colaborar com as investigações. A instituição reforça que não faz a gestão do hospital em que a vítima trabalhava".

"A FLBM segue gerindo outras unidades de saúde com toda a seriedade e comprometimento de seus conselheiros, diretores e colaboradores com um único objetivo: cuidar e salvar vidas", complementa.

A Fundação Leandro Bezerra de Menezes informa, em sua página na rede social Instagram, que está à frente da administração da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Sobral e do Hospital São Raimundo, localizado no Município do Crato. 

E que já administrou as UPAs do Edson Queiroz, Bom Jardim e Vila Velha, em Fortaleza, e dos Municípios de Horizonte, Caucaia, Jaguaribe e Pecém; o Hospital Geral Luiza Alcântara e Silva, em São Gonçalo do Amarante; e sete Centrais de Distribuição de Medicamentos nos Terminais de Fortaleza (CDMT).

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Investigação contra a Fundação

Como revelou o Diário da Justiça Eletrônico, a Fundação Leandro Bezerra de Menezes é investigada pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) por desvios na saúde, no Município de Juazeiro do Norte. O MPCE já pediu à Justiça Estadual, inclusive, para que a Organização Social seja extinta.

O colunista Inácio Aguiar, do Diário do Nordeste, detalhou, em fevereiro do ano passado, que a Fundação era investigada por possíveis ilegalidades como desaprovação de contas por irregularidades, conflito de interesses na compra de suprimentos, improbidade administrativa e possíveis desvios de recursos do SUS (Sistema Único de Saúde).

Em 2021, a Justiça Estadual decretou intervenção na Fundação e afastou os proprietários das atividades. O Judiciário nomeou um interventor para gerenciar a entidade.

O MPCE divulgou, em setembro de 2020, que "documentos requisitados pelo órgão ministerial demonstram que proprietários de empresas prestadoras de serviços e fornecedoras de bens e produtos hospitalares para a Fundação Leandro Bezerra de Menezes eram, por vezes, procuradores com poderes ilimitados para praticarem atos de gestão na Fundação e no Hospital São Raimundo, firmando contratos consigo mesmos, em evidente conflito de interesses, além de terem contraído empréstimos bancários em nome da FLBM".

Concluiu-se ainda no procedimento que a Fundação Leandro Bezerra de Menezes não presta contas desde 2018 à Curadoria de Fundações de Juazeiro do Norte, tendo ainda procedido a diversas alterações em seu estatuto e à abertura de novas filiais sem a devida autorização do Ministério Público, que, por lei, tem o dever de velar pelo patrimônio e pelo cumprimento das finalidades de fundações privadas."
Ministério Público do Ceará
Em publicação no site oficial

Policiais militares investigados

Quatro policiais militares foram presos por suspeita de participação no assassinato da enfermeira Jandra Mayandra da Silva Soares, em uma investigação da Delegacia de Assuntos Internos (DAI), da Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos da Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD), e do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil do Ceará (PCCE), no dia 6 de junho deste ano. Entretanto, os PMs foram soltos no dia seguinte.

Os policiais investigados, segundo o Diário da Justiça Eletrônico, são Dhoze Rafael Lima Ferreira, Gleidson da Silva Farias, Emanuel Fernandes Lima e Wladmir Cristiano Garcia.

O advogado Walmir Medeiros, que representa os militares Dhoze Rafael e Emanuel Fernandes, alegou ao Diário do Nordeste, após a soltura dos clientes, que "o fato é que quatro policiais acessaram os dados dela (vítima), no sistema policial. Foi uma coisa muito forte prender por causa disso. Nesse caso não tinha nenhum indício, ou indicação, que eles poderiam atrapalhar a investigação, ou fugir".

Policial Militar
Legenda: Equipes da Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE) e da Polícia Militar do Ceará (PMCE) foram ao local do crime
Foto: Paulo Cardoso/SVM

A publicação no DJE revelha que "o homicídio investigado possui características daqueles efetuados por 'assassino profissional', pois o fato de: 'os disparos terem sido efetuados exclusivamente em direção à Jandra Mayandra, e os tiros terem sido agrupados', além do que 'não foram encontrados estojos de munições nas proximidades do local do crime, muito embora as informações colhidas através de populares davam conta que o atirador utilizou uma pistola, arma que extrai os estojos, e com os quais poderiam identificar a origem da munição, rastreando o lote de fabricação e sua distribuição'".

Os autores do crime seguiram a enfermeira desde o seu local de trabalho, o Hospital Doutor Osvaldo Cruz, até efetuarem os disparos contra a vítima, que estava dentro do seu carro. Jandra morreu no local, na Avenida Presidente Castelo Branco, bairro Pirambu, em Fortaleza, na noite de 15 de maio deste ano.

"Há indícios, portanto, de que o crime foi planejado, bem como de que em face do modus operandi houve divisão de tarefas para fins de seu êxito, razão pela qual o acesso a aparelho telefônico se faz imprescindível para fins de obtenção de informações referentes às circunstâncias do crime, e modo de organização dos agentes envolvidos, informações que não poderiam ser obtidas por outros meios, considerando que o planejamento do crime, por certo, alcançou também etapa posterior, qual seja, a de ocultação de elementos relacionados a autoria e participação", concluiu a 5ª Vara do Júri de Fortaleza.

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