CNJ recomenda 'fim dos castigos coletivos' e apuração das denúncias de tortura nos presídios do CE
A Secretaria da Administração Penitenciária do Ceará rebateu que 'atua dentro das diretrizes da transparência e compromisso público'
Após visita ao Sistema Penitenciário cearense e elaboração de relatório, o Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, na última terça-feira (8), recomendações para a "superação de graves irregularidades" identificadas nos presídios deste Estado, como o 'fim dos castigos coletivos' e a apuração das denúncias de tortura, segundo o Órgão. A Secretaria da Administração Penitenciária do Ceará (SAP) rebateu que "atua dentro das diretrizes da transparência e compromisso público".
Conforme a publicação do CNJ, "as mudanças mais urgentes e abrangentes se referem ao fim dos castigos coletivos, à fiscalização das unidades prisionais, à implementação de procedimento adequado ao tratamento de denúncias de tortura e violações de direitos e ao aprimoramento do controle processual por parte da magistratura. Por meio de procedimentos administrativos, o CNJ vai apoiar o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) no enfrentamento a desafios do sistema carcerário local".
O TJCE prometeu, por nota, que, "em parceria com os demais órgãos públicos, a Justiça estadual cumprirá os prazos estabelecidos e seu papel de oferecer prestação jurisdicional com total garantia de direitos".
O CNJ e a Corregedoria Nacional de Justiça realizaram inspeções em 26 unidades penitenciárias e nas Varas de Execução Penal do Ceará, entre os dias 16 e 19 de novembro do ano passado, após denúncias de 11 irregularidades. A Força-Tarefa confirmou a superlotação de presos e o tratamento "cruel e degradante" no Sistema Penitenciário cearense, além de problemas no fluxo de processos, na Justiça Estadual, entre outras irregularidades, em dezembro seguinte.
Durante a 346ª Sessão Ordinária, que aprovou as recomendações ao TJCE e à SAP, no último dia 8 de março, o presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, destacou que “a Constituição Federal determina que todo preso tem direito inalienável à manutenção da sua integridade física e moral”.
O Conselho Nacional de Justiça recomendou ainda à Presidência e à Corregedoria-Geral do TJCE que procure a Secretaria de Administração Penitenciária do Ceará para revogar, em 30 dias, os atos normativos que originaram o quadro em questão. "De acordo com o relatório das inspeções ao sistema prisional cearense, há relatos de maus-tratos e tortura contra presos por parte da polícia penal. Castigos seriam aplicados sem representar resposta a um ato de indisciplina de um preso, cela ou ala do presídio", aponta o Órgão.
Em nota, a Secretaria da Administração Penitenciária do Ceará respondeu que "repudia qualquer ato que atente contra a dignidade humana e nega que exista atos de tortura ou implementação de castigos coletivos em suas unidades prisionais". E ressaltou que "o sistema prisional cearense recebe fiscalizações e inspeções rotineiras do Poder Judiciário e do Ministério Público".
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O Conselho Nacional de Justiça recomendou também que o TJCE apoie a criação de uma Ouvidoria específica para o sistema penitenciário local, que deve ser um canal independente, confiável e sigiloso de tratamento de denúncias relativas à atuação de servidores e à situação das pessoas presas; e acione o Ministério Público do Trabalho (MPT) para que acompanhe, continuamente, as condições de trabalho de profissionais do sistema prisional, principalmente no que diz respeito às situações de adoecimento mental e de tratamento das denúncias de assédio e impedimento da atuação sindical.
Em resposta, a SAP informou que "já conta com uma Ouvidoria atuante e premiada que, nos últimos 3 anos, recebeu aproximadamente 3.500 demandas com mais de 98% de resolubilidade. Esta Ouvidoria tem diversos canais de interação com o público de forma gratuita e tem o sigilo das pessoas preservado".
Outro ponto destacado pelo CNJ foi de que o Tribunal de Justiça do Ceará deve estabelecer, junto às autoridades prisionais do Estado, no prazo de 30 dias, novos procedimentos para as visitas sociais nos presídios. Segundo o Conselho, "o objetivo é aumentar o tempo de contato entre a pessoa presa e familiares, que está comprometido pelas regras da administração prisional para reduzir o do risco de disseminação da pandemia da Covid-19. Segundo o relatório, as visitas sociais ocorrem a cada 21 dias, com duração máxima de 30 minutos, incluído o tempo dos procedimentos de identificação, revista pessoal, entre outros".
A Secretaria da Administração Penitenciária, por sua vez, rebateu que a publicação do CNJ "erra ao afirmar que a visitação social dura meia hora. A visita social dos familiares voltou a ser de 4 horas de duração desde o dia 19 de fevereiro e assim permanece. O retorno desse tempo foi possível com a melhora dos índices da Covid-19 e as novas recomendações das autoridades de saúde que nos permitiram a flexibilização das normas vigentes de visitação".
Dentro de 45 dias, o CNJ espera ainda, junto do TJCE, definir "um cronograma de ações para regularizar a documentação civil de pessoas presas, tanto as que ingressaram via audiências de custódia, quanto as que já se encontram presas".
Segundo a SAP, o seu setor de Serviço Social, em parceria com instituições como Secretaria de Proteção Social e o próprio Tribunal de Justiça, conseguiu inserir mais de 9 mil pessoas no Cadastro de Pessoa Física da Receita Federal, em três anos. "Esse esforço possibilitou a aplicação da vacina nas pessoas que não tinham a documentação necessária. Além disso, nos últimos 3 anos, a SAP também conseguiu emitir RGs para mais de 300 pessoas privadas de liberdade", completou.
Por fim, o CNJ recomenda "uma revisão de tratamento dispensado a públicos específicos do sistema prisional, como LGBTQIA+, mães, gestantes e lactantes". E afirma que "há demandas relacionadas a demandas básicas da população carcerária, como acesso a água potável, atendimento de saúde, além de material de higiene pessoal e limpeza das instalações físicas. Há queixas de falta de oportunidades de estudo e trabalho dentro das unidades prisionais, com os respectivos benefícios, ao contrário do que prevê a Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84)".
A SAP também rebate essa recomendação, ao informar que o "atendimento de saúde de internos e internas tem uma realidade superior a quase todos os municípios e Estados nacionais. 100% da população privada de liberdade do Ceará possui atendimento médico e odontológico. São mais de 190 mil atendimentos médicos em 3 anos, 130 mil atendimentos psicológicos e 180 mil atendimentos odontológicos".
"São mais de 12 mil internas e internos capacitados em cursos realizados em instituições como o Senai. Cerca de 6 mil pessoas privadas de liberdade em atividades laborais. 13 empresas instaladas nas unidades prisionais com geração de emprego para internos e renda para as famílias. Mais de 5 mil internos e internas em salas de aulas nos cursos regulares de alfabetização, ensino fundamental e médio", acrescenta.
A Secretaria conclui dizendo que, em três anos da da atual gestão, ocorreram apenas dois homicídios dentro do Sistema Penitenciário durante a onda de ataques criminosos de janeiro de 2019 e um, em 2021, que está sob investigação. Enquanto, entre 2009 e 2018, ocorreram 210 assassinatos de pessoas privadas de liberdade nos presídios cearenses.