Inquérito no STF: Qual a situação de Pazuello e o que ocorre a partir da investigação?
O ministro da Saúde será alvo de investigação no Supremo e, apenas após colhidas as informações pela Polícia Federal, poderá ser denunciado pela Procuradoria Geral da República
O ministro de Saúde, general Eduardo Pazuello, é alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeita de conduta omissiva na crise por falta de oxigênio na rede municipal de saúde de Manaus.
A Capital do Amazonas entrou em colapso no dia 14 de janeiro, quando as unidades de saúde ficaram sem oxigênio e pacientes chegaram a morrer asfixiados. Médicos e acompanhantes se mobilizaram para transportar cilindros com o gás nos próprios carros, enquanto anônimos e celebridades se mobilizaram para tentar enviar insumos para a cidade.
A investigação autorizada na segunda-feira (25) irá se debruçar sobre a conduta do ministro da Saúde quanto à crise. Segundo a Procuradoria Geral da República (PGR), que realizou o pedido, Pazuello tinha o "dever legal e possibilidade de agir para mitigar os resultados" e que uma eventual omissão seria passível de responsabilização cível, administrativa ou criminal.
Confira todos os passos que levaram ao inquérito contra Pazuello:
O que motivou o inquérito?
O ministro Eduardo Pazuello teria sido alertado em diferentes ocasiões sobre o quadro em Manaus e o risco de falta de oxigênio - inclusive quatro dias antes de ela ocorrer. O ministro foi avisado por integrantes do governo do Amazonas e pela empresa que fornece o produto.
Além disso, convocada pelo ministro para atuar na cidade, a Força Nacional do SUS também fez relatórios dia após dia da evolução da crise de escassez de oxigênio na capital do Amazonas. Documentos dos dias 8, 9, 11, 12 e 13 de janeiro registram com detalhes o tamanho do problema, inclusive com previsão exata de quando ocorreria o colapso.
Os relatórios da Força Nacional do SUS mostram que o ministro também estava municiado com informações detalhadas de um grupo de técnicos, convocados para atuar em caráter de urgência.
Além disso, também é citada a demora para o deslocamento de pacientes para outros entes federativos, que viria a ocorrer apenas no dia 15 de janeiro, e a entrega de 120 mil unidades de hidroxicloroquina como medicamento para tratamento de Covid-19, mas sem informar quais documentos técnicos serviriam de base para a orientação.
Quando foi feito o pedido?
O pedido para abertura de inquérito foi feito no dia 23 de janeiro, pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, após representações feitas por partidos políticos no órgão. Nos documentos, a alegação era de conduta omissiva do ministro e de seus auxiliares na crise que se instalou na rede hospitalar do Amazonas, principalmente nas unidades de saúde da capital.
Antes disso, a Procuradoria Geral da República (PGR) já havia dado um prazo de 15 dias para que o ministro explicasse porque não agiu para garantir o fornecimento aos hospitais de Manaus. Acompanhado de técnicos, o ministro esteve no dia na PGR para fazer um relato da situação.
A partir desses dados e "atento à situação calamitosa de Manaus, o procurador-geral considerou necessária a abertura de inquérito para investigar os fatos", informou a Procuradoria, em nota à imprensa, divulgada no sábado.
A decisão do STF
O ministro Ricardo Lewandowski autorizou a abertura de inquérito após o pedido da PGR. Ele determinou o encaminhamento dos autos à Polícia Federal para a instauração de inquérito, que deverá ser concluído em 60 dias. O depoimento de Pazuello deve ocorrer até cinco dias após a intimação - sendo autorizado que o general combine local, hora e dia.
Lewandowski foi designado relator do caso por já ser responsável por outras ações que questionam a atuação do Ministério da Saúde na compra de vacinas, no planejamento do plano nacional de imunização contra a Covid-19, dentre outros pontos.
O ministro virou réu?
A abertura de inquérito é considerada a fase pré-processual, quando são colhidas provas e esclarecimentos quanto à acusação feita contra Pazuello. A Polícia Federal pode, inclusive, adotar outras medidas cautelares durante a investigação. Após os 60 dias de investigação, a PF envia relatório para a PGR com as informações colhidas. O procurador Augusto Aras é a autoridade judicial que irá decidir se apresenta ou não denúncia ao STF. Apenas neste caso, Pazuello irá virar réu.
A resposta do ministro
Em evento na manhã desta terça-feira (26), o ministro Pazuello atribuiu a situação em Manaus a "gargalos de décadas" e a uma diferença na contaminação possivelmente causada pela nova variante do coronavírus identificada na cidade.
"Tivemos salto da contaminação, triplicando o número de contaminados. Foi uma situação completamente desconhecida para todo mundo. Foi muito rápido", argumentou.
Medidas adotadas pelo governo
Antes da abertura do inquérito no Supremo, o ministro viajou a Manaus sem "voo de volta a Brasília" para acompanhar a situação na cidade. A viagem foi sugerida pelo Palácio do Planalto, que tenta diminuir o desgaste de imagem do chefe da pasta da Saúde.
Pazuello ressaltou medidas que, segundo ele, têm sido adotadas pela pasta, como a contratação de mini usinas geradoras de oxigênio e revisão da rede de gases dos hospitais. Além disso, até o momento, cerca de 300 pacientes já foram transferidos para outros estados por meio de aviões da Força Aérea. Segundo Pazuello, o objetivo da pasta é chegar a 1.500.
Reações do Planalto
A decisão de Lewandowski de acatar o pedido de abertura de inquérito já era esperada pelo Palácio do Planalto. O Supremo tem efetivado sucessivas derrotas ao governo Bolsonaro quanto a medidas de enfrentamento à pandemia de Covid-19 no país.
Fontes próximas ao presidente admitem o desgaste, principalmente quando já existia pressão pela saída de Pazuello do cargo, e o processo pode fortalecer essa pretensão de áreas do governo. Contudo, por enquanto, o presidente Jair Bolsonaro permanece firme na decisão de manter o ministro.
Insatisfação das Forças Armadas
Militares das Forças Armadas estariam insatisfeitos com a manutenção de Pazuello como titular do Ministério da Saúde - ele é general da ativa do Exército. Com todo o desgaste causado pelas falhas da pasta na obtenção de vacinas e distribuição das doses no País, além da crise causada pela falta de oxigênio em Manaus, militares consideram que a situação poderia afetar a imagem das Forças Armadas.
Com a abertura do inquérito, a insatisfação da cúpula tende a crescer dentro da instituição - inclusive para que Pazuello vá para a reserva, a exemplo de outros ministros do governo Bolsonaro. Contudo, o general reluta em se aposentar.
Existe a possibilidade de haver desdobramentos na Justiça Militar. O código penal militar estabelece, por exemplo, que um militar condenado a pena acima de 2 anos deve ser excluído da Força.