A fome como política

Escrito por Jonael Pontes ,

Legenda: Jonael Pontes é sociólogo e pesquisador da UFC
Foto: Arquivo pessoal

Caro leitor, há uma realidade que precisa ser discutida pela sociedade: a fome. Hoje, 41% da população brasileira está em condição de insegurança alimentar, isto é, 84,9 milhões de pessoas não sabem se comerão algum alimento todos os dias, de acordo com os dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE.

Nesse contexto, falácias emergem no senso comum e em discursos políticos, relacionando a fome com quantitativo de alimentos produzidos e na “preguiça de trabalhar” dos que tem assistência do Estado. Para este debate, retomo teses septuagenárias – que se mostram atualíssimas – do geógrafo Josué de Castro. Em “Geografia da Fome: A Fome no Brasil”, 1943, o médico demoliu crenças de que a miséria resultava do contingente populacional, produção insuficiente de alimentos ou carência de recursos naturais, apresentando o primeiro mapa da fome no Brasil.

Contribuiu para explicar, a época, que a fome não nasce da escolha individual de ociosos (argumentos muito difundidos no presente), nem de fatores naturais, mas sim, de decisões políticas e má distribuição das riquezas – concentração de renda e desigualdade social.

A pandemia é um agravante, mas sozinha não justifica o que vivenciamos. Constata-se, por exemplo, algumas escolhas do governo Bolsonaro: Extinção do CONSEA; Desmonte do Programa de Aquisição de Alimentos; Abolição dos estoques estratégicos de arroz; Descontinuidade do Programa de Cisternas; Paralisação total da reforma agrária e o descontrole da Inflação (a lista é extensa). Decisões políticas que impactam na vida daqueles 41% mencionados acima. Paradoxalmente, nosso país é o terceiro maior produtor de alimentos do mundo, na retaguarda apenas da China e dos Estados Unidos, todavia, somos um celeiro de famélicos.

Demagogia político-ideológica não aplaca a agonia da fome, esse mal deve ser combatido através de políticas de distribuição de renda, fortalecimento de redes de apoio a seguridade alimentar e geração de empregos, objetivos que parecem não ser prioritários para o governo vigente.

Jonael Pontes é sociólogo e pesquisador | jonaell@hotmail.com

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.