Primeiro semestre de 2021 registra queda de 40% na notificação dos casos de HIV no Ceará

No entanto, especialistas destacam que houve redução no número de exames realizados na pandemia, o que gerou uma provável subnotificação dos casos

Escrito por Redação , metro@svm.com.br
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Legenda: Segundo infectologista, a testagem precoce do HIV é muito significativa para manter uma vida saudável aos pacientes.
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

O primeiro semestre de 2021 contou com diminuição de 40,36% nos casos notificados do vírus HIV, no Ceará, em comparação com igual período do ano anterior, passando de 763 para 455 registros. No entanto, especialistas destacam que isso pode ter ocorrido devido à redução das testagens de detecção da doença durante a pandemia de Covid-19.

Os dados do IntegraSUS, portal de transparência da Secretaria da Saúde (Sesa), indicam ainda que 2020 dispôs de um total de 1.401 ocorrências de HIV no Estado. Já neste ano, até o mês de junho, os municípios que mais somaram casos foram Fortaleza (126), Sobral (45), Juazeiro do Norte (18), Maracanaú (11), Itaitinga (10) e Aquiraz (10).

Ainda em 2021, as pessoas que mais se infectaram com o vírus estão na faixa etária de 20 a 29 anos, com 169 casos. Logo após estão as de 30 a 39 anos (126), de 40 a 49 anos (77), de 50 anos ou mais (51) e de 13 a 19 anos (26).

HIV e Covid-19

De acordo com o coordenador estadual da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids (RNP+CE), Vando Oliveira, houve a priorização do tratamento contra o coronavírus nas unidades de saúde da região, o que levou ao esquecimento momentâneo de outras patologias.

“Os ambulatórios foram fechados por conta da Covid-19 e, ainda que a gente compreenda a urgência e a necessidade da pandemia, praticamente o HIV e a Aids foram deixados de lado”, destaca o gestor.

Menos testes

Nesta conjuntura, o infectologista e chefe do Serviço de Controle de Infecção do Hospital Universitário Walter Cantídio, Jorge Luiz Nobre Rodrigues, informa que, durante o cenário pandêmico, possivelmente, houve uma diminuição no quantitativo de testagens para o HIV.

Eu não creio que tenha diminuído [os casos], o que diminuiu realmente foi a testagem dos pacientes, da procura dos pacientes pelo serviço especializado”
Jorge Luiz Nobre Rodrigues
Médico infectologista

Conforme Rodrigues, PhD em Doenças Infecciosas pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a testagem precoce do HIV é muito significativa. “Quando o paciente se infecta, ele vai passar alguns anos sem sintomas até ele adoecer numa fase mais avançada, que dá mais problema pra gente reverter a situação clínica dele”.

Então quanto mais precoce você diagnostica e quanto mais precoce o paciente começar a tomar as medicações antirretrovirais, melhor será a vida dele, ele vai ter uma vida normal, daí porque a importância do tratamento precoce para o HIV”
Jorge Luiz Nobre Rodrigues
Médico infectologista

A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) de Fortaleza informou, no dia 16 de julho, que realiza testes de HIV nos 116 postos de saúde, das 7h às 18h30, de segunda a sexta-feira. "Em 2019, foram realizados 18.819 testes rápidos de HIV na rede municipal. Em 2020, o número foi de 31.172. Em 2021, de janeiro a maio, foram realizados 33.847 testes, entre testes rápidos e convencionais", detalha em nota.

"Caso o resultado do teste seja positivo, o usuário é encaminhado aos Serviços Ambulatoriais Especializados em HIV/Aids (SAE), onde são atendidas mais de sete mil pessoas por mês. Fortaleza dispõe de dez Serviços Ambulatoriais Especializados (SAEs), onde é oferecido atendimento multiprofissional com infectologistas, profissionais de enfermagem, serviço social, psicologia e farmacêuticos", prossegue.

Já a Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) foi acionada pela reportagem sobre o quantitativo de exames realizados no período, mas informou que esses dados não são disponibilizados ao órgão pelas unidades de saúde.

Atendimentos reduzidos

Além disso, Nobre Rodrigues pontua que as circunstâncias da Sars-Cov-2 geraram sérios problemas de adequação de atendimentos nos hospitais. “No Hospital das Clínicas, a gente selecionava os pacientes que teriam que continuar com o atendimento, passava WhatsApp pra eles e eles vinham pra consulta”.

“Aqueles pacientes que já tavam estáveis, que já tinham os exames normais, a gente foi empurrando o retorno deles pra uma época que a pandemia tivesse mais controlada. Então isso foi uma fase ruim, porque nem sempre você conseguia contactar o paciente pra ele vir”, prossegue o médico.

Neste cenário, o gestor da RNP+CE, Vando Oliveira, comunica que muitos pacientes estão sem realizar consultas desde 2019. “Algo absurdo, porque a gente pode viver com HIV e viver bem, mas tem que ter o acompanhamento”.

“E é todo um processo, se você não tem a consulta, você não renova a receita do medicamento. Além disso, o medicamento que a pessoa tá tomando pode não tá tendo mais o efeito devido, o médico teria que avaliar, pedir novos exames e trocar essa medicação. Sem a consulta, o quadro se agrava”, alega Oliveira.

Segundo o coordenador da área técnica de IST/Aids e Hepatites Virais da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Marcos Paiva, em matéria ao Diário do Nordeste em dezembro de 2020, “o próprio Ministério da Saúde recomendou que houvesse uma diminuição de pessoas circulando em serviços especializados. Foi uma redução grande, mas está dentro do esperado para a situação”.

Dessa maneira, os serviços foram adaptados com a priorização de alguns atendimentos. “Quando era uma testagem de urgência, estava acontecendo normal. A população geral que gostaria de fazer teste de rotina, eram orientados a esperar. A partir de junho, a gente começa uma diminuição nos casos de Covid e as pessoas começaram a se sentir mais seguras a procurar o serviço”, detalha o coordenador da SMS.

Referência estadual

O Hospital São José (HSJ), unidade estadual de referência no tratamento do HIV, informou que, entre março e junho de 2020, suspendeu os atendimentos ambulatoriais em conformidade com as recomendações da Secretaria da Saúde (Sesa). “O Ambulatório passou, portanto, a funcionar como Emergência Não Covid no período e as consultas foram desmarcadas”, diz em nota.

Além disso, o HSJ ressalta que, ao longo da pandemia, manteve as consultas para pessoas com primeiro diagnóstico de HIV, bem como a realização de exames e o fornecimento de medicamentos. A emergência da unidade também funcionou normalmente para atender pacientes com intercorrências decorrentes da doença.

Em 2020, o ambulatório da unidade realizou 7.798 atendimentos a pessoas com HIV. Já neste ano, de janeiro a junho, o número foi de 1.350. Na emergência, foram registrados 3.129 atendimentos em 2020 e outros 1.812 de janeiro a 14 de julho de 2021.

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