Aras quer que STF declare inconstitucional foro privilegiado de defensores públicos do Ceará

O foro especial para membros da Defensoria Pública foi acrescentado à Constituição do Estado com a Emenda Constitucional 80, de 2014

Legenda: Na ação, Aras também pede que a norma seja suspensa imediatamente, até que o caso seja julgado
Foto: Lula Marques

O procurador-geral da República, Augusto Aras, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra o dispositivo da Constituição do Ceará que atribui foro por prerrogativa de função aos membros da Defensoria Pública no Estado.  

O texto cuja constitucionalidade é questionada por Aras está no artigo 108, inciso VII, onde está normatizado que compete ao Tribunal de Justiça processar e julgar, originariamente:  

a) Nos crimes comuns e de responsabilidade, o Vice-Governador, os Deputados Estaduais, os Juízes Estaduais, os membros do Ministério Público, os membros da Defensoria Pública, os Prefeitos, o Comandante Geral da Polícia Militar e o Comandante Geral do Corpo de Bombeiros Militar, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral; 

O foro especial para membros da Defensoria Pública foi acrescentado à Constituição do Ceará com a Emenda Constitucional 80, de 2014.  

Na ação, Aras também pede que a norma seja suspensa imediatamente, até que o caso seja julgado. Apesar de considerar a expressão “os membros da Defensoria Pública” inconstitucional, o PGR quer que os efeitos da inconstitucionalidade só ocorram a partir da decisão que julgar a procedência das alegações, para não violar a segurança jurídica, segundo ele. 

A ADI, cuja relatoria ficou com a ministra Cármen Lúcia, foi protocolada no dia 4 de agosto e tem como parte requerida a Assembleia Legislativa do Ceará (AL-CE). Procurada, a assessoria do legislativo estadual informou que o órgão só se manifestará após ser notificada.

"Prerrogativas não são privilégios", diz associação

A Associação dos Defensores Públicos do Ceará (Adpec) vê a ação de Aras como “equivocada” porque o foro privilegiado seria inerente à responsabilidade e independência exigidas pelo cargo. “Prerrogativas não são privilégios”, afirma a presidente da instituição, a defensora pública Amélia Rocha.

Amélia acredita que a Emenda Constitucional 80/2014 torna mais compreensível o papel da Defensoria Pública e questiona o que Aras entende por “simetria”. “Essa simetria precisa ser vista sistemicamente. A Constituição do Ceará é plenamente constitucional”, assegura.

Quem tem foro especial 

Na ADI, Aras argumenta que a Constituição estabelece o foro por prerrogativa de função para presidente e o vice-presidente da República, deputados federais e senadores, ministros do STF, dos tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União (TCU), procurador-geral da República, ministros de Estado, advogado-geral da União, comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, chefes de missão diplomática de caráter permanente, governadores, magistrados, conselheiros dos Tribunais de Contas, membros do Ministério Público e prefeitos.  

Pelo princípio da simetria, essas autoridades são a referência para que as constituições estaduais indiquem os seus equivalentes. Como os membros da Defensoria Pública da União não têm o foro especial, não cabe, conforme o PGR, o mesmo aos defensores públicos no Estado. 

A Defensoria Pública do Ceará se manifestou, em nota, argumentando que os estados têm autonomia para, por meio da Assembleia Legislativa, conceder foro por prerrogativa de função aos defensores públicos. Declarou ainda que o foro “não se constitui como benesse, mas como forma de proteção do cargo de um agente político que se transformou nas últimas décadas, exercendo função de defesa de direitos das mais variadas concepções”.

Estados não podem inovar em Direito processual 

Além da ADI questionando o dispositivo na constituição cearense, Aras também protocolou outras 16 ações do mesmo tipo no STF, todas questionando a atribuição do foro privilegiado a autoridades que não são listadas na Constituição Federal, como delegados, procuradores, auditores militares, presidentes de entidades estaduais e reitores, além de defensores públicos. 

Segundo o procurador-geral, os estados não podem inovar nessa área, pois a União tem a competência exclusiva para legislar sobre Direito Processual. A seu ver, as constituições estaduais, ao prever o foro por prerrogativa de função a ocupantes de cargos que não constam da Constituição Federal, violam o princípio da isonomia, pois atribuem tratamento desigual, pois todos os servidores públicos, quando não qualificados como agentes políticos, são processados e julgados no primeiro grau de jurisdição. 

O que é o foro privilegiado 

O foro especial por prerrogativa de função, conhecido por muitos como foro privilegiado, é um mecanismo legal que dá a seus beneficiados a prerrogativa de ser julgado por tribunais superiores em casos de ações penais. 

Outras ADIs 

As ações ajuizadas pelo procurador-geral questionando a constitucionalidade do foro especial são as seguintes: ADIs 6501 (Pará), 6502 (Pernambuco); 6504 (Piauí); 6505 (Rio de Janeiro); 6506 (Mato Grosso); 6507 (Mato Grosso do Sul); 6508 (Rondônia); 6509 (Maranhão); 6510 (Minas Gerais); 6511 (Roraima); 6512 (Goiás); 6513 (Bahia); 6514 (Ceará); 6515 (Amazonas); 6516 (Alagoas); 6517 (São Paulo); e 6518 (Acre). 

Os ministros Celso de Mello, relator das ADIs 6505, 6506, 6507 e 6509, e Edson Fachin, relator das ADIs 6512 e 6513, adotaram o rito previsto no artigo 12 da Lei 9.868/1999, que autoriza o julgamento da ação diretamente pelo Plenário, sem a necessidade de análise prévia do pedido de liminar. No caso da ADI conta a AL-CE, a ação aguardava manifestação da ministra Cármen Lúcia até a publicação desta matéria.  



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