Ressocialização comprometida: Em Fortaleza, não há vagas em centros para infratores sentenciados

O Diário do Nordeste teve acesso a um ofício sigiloso, no qual foi exposto que o percentual de internação está em 114%

Escrito por Emanoela Campelo de Melo , emanoela.campelo@svm.com.br
centro socioeducativo
Legenda: Em janeiro deste ano, a Justiça determinou a internação de um jovem (de nome preservado) suspeito de ato infracional análogo ao roubo, mas ele não pode ser internado por falta de vagas
Foto: Emanoela Campelo de Melo

Os índices de infrações protagonizadas por adolescentes permanecem superiores aos números de vagas ofertadas aos infratores dentro dos centros socioeducativos no Ceará. As filas de espera para a internação se estendem e, quando juízes proferem sentenças é preciso haver um tipo de 'arranjo' para que a determinação seja cumprida.

A reportagem teve acesso a um ofício sigiloso que comprova a preocupação com a atual condição do Sistema Socioeducativo no Estado. Conforme o documento com informações da Central de Regulação de Vagas da Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo (Seas), existem 266 vagas de internação para adolescentes infratores sentenciados do sexo masculino, na Capital. No entanto, há um excedente de 36 jovens, o que resulta em uma taxa de 114% de internação.

Desde 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) proíbe superlotação em unidades do sistema socioeducativo em todo o país. Com a ausência de equipamentos suficientes em Fortaleza, para onde vão os adolescentes que recebem internação como sentença?

De acordo com o juiz Manuel Clístenes, titular da 5ª Vara da Infância e Juventude de Fortaleza, e o promotor Léo Junqueira, da Justiça da Infância e da Juventude de Fortaleza, os infratores sentenciados atualmente precisam ser deslocados para espaços formulados para contemplar apenas internações provisórias. No ponto de vista do promotor, a medida preocupa, já que estes são equipamentos onde não há estrutura para uma internação a longo prazo.

"Os centros de internação provisória não são adequados porque não há a estrutura necessária para a ressocialização. Neles não há cursos. A Seas precisa assumir urgentemente esta situação e tomar providências desde agora. É melhor planejar, do que se omitir, porque a tendência é piorar ainda a médio prazo"
Léo Junqueira
Promotor

 

NA FILA DE ESPERA

Em janeiro deste ano, a Justiça determinou a internação de um jovem (de nome preservado) suspeito de ato infracional análogo ao roubo. O crime, que aconteceu com a existência de ameaça, levou o adolescente a ser capturado e levado à 2ª Vara da Infância e Juventude de Fortaleza.

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Quando foi decidido que ele deveria ser ressocializado por meio da permanência em um centro socioeducativo, o magistrado foi surpreendido com a informação da indisponibilidade de vaga. Com base na determinação do STF, a Seas comunicou ao Judiciário que o garoto foi incluído em uma fila de espera "não excluindo a possibilidade de restituição de sua liberdade na hipótese de o Centro Socioeducativo alcançar sua capacidade de vagas".

Para Manuel Clístenes, o caso mostra que é preciso "assumir um problema e esclarecer os fatos". O juiz afirma perceber que, hoje, a fila de espera já é capaz de lotar dois novos centros com capacidade para 60 pessoas, cada, se fossem entregues imediatamente à população.

"Não tem vaga sobrando, e a prova disso é essa fila de espera. A recusa de internações provisórias também é alta. Se nós não tomarmos medida de avaliar a regressão dos adolescentes periodicamente, vai chegar o dia que um vai cometer latrocínio e não tem vaga para ser internado", alerta o magistrado.

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