Racismo na Zara: um mês depois, 10 pessoas foram ouvidas e inquérito está em fase de conclusão
Dentre os depoimentos colhidos estão o da vítima, o do suspeito e os de testemunhas. O inquérito deve chegar ao Poder Judiciário nos próximos dias
Por volta das 21h30 do dia 14 de setembro de 2021 a delegada Ana Paula Barroso entrava em uma loja da Zara, em Fortaleza. Dias depois, a ida da diretora-adjunta do Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis (DPGV) ao estabelecimento estava nas manchetes dos jornais. O que houve de diferente naquele dia, conforme a policial, foi um episódio de racismo. A ordem de um funcionário do estabelecimento para que a mulher se retirasse do local repercutiu e o fato passou a ser investigado. Um mês depois, o inquérito acerca do caso está próximo de ser finalizado e deve chegar ao Poder Judiciário cearense a qualquer momento.
A reportagem apurou que nos últimos dias 30 dias a Polícia Civil do Ceará, por meio da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Fortaleza analisou diversas imagens das câmeras de segurança da loja e ouviu 10 pessoas. Dentre os depoimentos colhidos estão o da vítima, o do suspeito e os de testemunhas presentes naquela noite, como exemplo os seguranças do shopping que acolheram Ana Paula instantes após ela ser retirada da loja.
Veja também
Em paralelo ao inquérito, consta na Justiça do Ceará uma ação civil pública protocolada pelas entidades Educafro (Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes) e o Centro Santo Dias de Direitos Humanos contra a Zara devido a este mesmo caso. As partes requerem R$ 40 milhões de indenização por dano moral coletivo.
Na última semana, o Ministério Público do Ceará (MPCE) se pronunciou afirmando estar ciente da realização de audiência de conciliação acerca da ação. As entidades pedem que a indenização seja revertida ao fundo destinado à reconstituição dos bens lesados e destaca que a reparação integral de um dano dessa magnitude deve ir além da esfera indenizatória. A Zara até então não se posicionou nos autos sobre o pedido protocolado.
"ELA FOI COLOCADA PARA FORA DA LOJA"
A delegada Anna Nery, que estava a frente da investigação do caso nos primeiros dias, detalhou que a vítima registrou um Boletim de Ocorrência Eletrônico (BOE) no mesmo dia do ocorrido. Segundo o relato, Ana Paula chegou à loja consumindo um sorvete. Contudo, ao tentar entrar, foi barrada por um segurança do estabelecimento. Ela questionou se o motivo seria o sorvete, mas não obteve resposta.
Fora da Zara, a delegada chamou um segurança e questionou novamente se o sorvete seria o motivo para ter o acesso travado. O homem disse que não e solicitou a presença do chefe de segurança do shopping no local. O novo agente reconheceu a delegada porque já havia trabalhado com a mesma em outra oportunidade.
Em entrevista à imprensa, Ana Paula disse que: "o medo que eu estou vivenciando é o de muitas vítimas: medo da impunidade, porque tô lutando pra provar que o outro errou; da revitimização, porque falar é sofrer o mesmo dano; medo do descrédito. Às vezes, a vítima acha melhor ‘deixar pra lá’. E é por isso que essas ações estão sendo perpetuadas".
Os vídeos das câmeras do estabelecimento foram recolhidos pelas autoridades
À imprensa, a Zara afirma que a abordagem à delegada Ana Paula Barroso em uma das unidades do empreendimento em um shopping de Fortaleza não foi racismo. Segundo a loja, o motivo foi a mulher estar sem máscara enquanto consumia um sorvete.
A delegada Anna Nery foi afastada da DDM Fortaleza a pedido da Justiça do Ceará, após o MPCE expor envolvimento dela em um esquema de extorsão ocorrido em outra delegacia nos anos de 2016, 2017 e 2018. Agora, o inquérito está nas mãos de outras delegadas que permanecem na Delegacia da Mulher.