Escalada da violência doméstica no Ceará: aumenta em 25% número de mulheres vítimas e 35% as prisões

Além da violência sexual e física, também podem ser denunciadas as psicológica e patrimonial.

Escrito por Emanoela Campelo de Melo , emanoela.campelo@svm.com.br
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Legenda: A reportagem analisou as estatísticas e viu que na maior parte dos casos, a raça das vítimas consta como 'não informada'. Quando registradas, a maioria delas se diz parda ou preta.
Foto: Unidade de Arte/DN

Mais mulheres vêm formalizando denúncias contra agressores, no âmbito da Lei Maria da Penha. No Ceará, há uma média de 66 vítimas de violência doméstica, a cada dia. O dado vem a partir de registros da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). Só neste ano de 2023, até setembro, foram 17.800 pessoas do gênero feminino que se encaixam como vítimas de Violência Registrada na Lei nº 11.340/2006.

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Quando comparado a igual período do ano passado, o número aumentou 25,6%. Como consequência, mais suspeitos foram presos em 2023: 2.526 detidos em flagrante por crimes tipificados nesta lei. 35% a mais de prisões do que de janeiro a setembro de 2022. 

Apesar de índices altos, a subnotificação dos episódios violentos permanece como problema histórico: até que ponto mais mulheres passaram a sofrer violência ou o dado é reflexo do aumento das denúncias?

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De janeiro de 2022 a setembro de 2023, no Ceará, conforme a SSPDS 

A titular do Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher (Nudem) da Defensoria Pública do Ceará, defensora pública e associada da ADPEC, Anna Kelly Nantua, garante: "os números crescem de forma assustadora", e acrescenta que a subnotificação se deve, em parte, a que "muitas mulheres demoram a pedir ajuda e a reconhecer a necessidade, mas que elas vêm se encorajando cada vez mais a denunciar".

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A reportagem analisou as estatísticas e viu que na maior parte dos casos, a raça das vítimas consta como 'não informada'. Quando registradas, a maioria delas se diz parda ou preta.

PROBLEMA SOCIAL

O pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV/UFC) e do Laboratório de Estudos da Conflitualidade e Violência (COVIO/UECE), Alisson Rodrigo de Araújo Oliveira, alerta a complexidade de "tratar sobre o fenômeno da violência contra a mulher, que possui diversas causas".

Para o estudioso, os dados são alarmantes e precisam ser usados como "ponto de partida para entendermos a realidade social".

"Uma mulher que é vítima de violência não denuncia imediatamente. Em regra, ela sofre violência reiteradamente até ela romper o ciclo da violência a qual está inserida. Mas, de fato, houve avanços a partir da Lei Maria da Penha, que mostra a essas mulheres que existe uma rede de apoio, de proteção e equipada"
Alisson Araújo
Pesquisador

Anna Kelly recorda que durante a pandemia, a Defensoria percebeu que os números caíram, porque "os casos não chegavam até nós com facilidade". Quando desenvolvidas outras formas de atendimento e retomado acolhimento presencial, as denúncias voltaram a alavancar.

"Sempre trabalhamos a temática que é falar da violência doméstica. Elas precisam saber aonde buscar ajuda. Qualquer mulher que tenha sofrido violência no contexto da Lei Maria da Penha pode procurar o Nudem", disse a titular do Núcleo.

Além da violência sexual e física, também podem ser denunciadas as psicológica e patrimonial.

"São outras tipologias que, às vezes, as mulheres não conseguem se identificar enquanto vítimas. De fato, o acesso à informação ficou muito mais facilitado, isso é inegável. A rede de amparo e de atuação é muito mais ampla do que se tinha em décadas passadas, mas é preciso criar uma cultura de avaliação de políticas públicas", destaca Alisson.

MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA

A Secretaria destaca como política adotada a criação de um sistema para a solicitação da medida protetiva de urgência. "A novidade entrou em vigor em agosto de 2023, por meio do endereço eletrônico: mulher.policiacivil.ce.gov.br. Após a conclusão do preenchimento do sistema, a Polícia Civil recebe e já encaminha ao Poder Judiciário, para que este possa analisar e deferir as medidas", segundo a Pasta.

"A SSPDS lembra que, em razão das campanhas de conscientização, mais mulheres recorrem aos órgãos de segurança para formalizar suas denúncias. Os registros, inclusive, podem ser feitos em qualquer uma das dez unidades das Delegacias de Defesa da Mulher (DDMs) em Fortaleza, Maracanaú, Caucaia, Pacatuba, Crato, Iguatu, Juazeiro do Norte, Icó, Sobral e Quixadá, ou em qualquer outra unidade da Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE). Na Capital, a unidade está instalada na Casa da Mulher Brasileira (CMB). Em Juazeiro do Norte, Sobral e Quixadá, a delegacia especializada fica na Casa da Mulher Cearense (CMC), equipamento estadual nos moldes da CMB. Outras unidades da CMC são construídas em Iguatu, Crateús e Tauá. Em agosto, o Governo do Ceará e o Ministério das Mulheres anunciaram a criação de mais três CMBs nos municípios de Itapipoca, Limoeiro do Norte e São Benedito, totalizando uma rede com dez equipamentos, estaduais e federais", destacam.

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