Conversa de Bolsonaro causa indignação em governadores do NE

Antes de conceder entrevista coletiva a jornalistas, presidente conversa com ministro Onyx Lorenzoni e critica, de forma pejorativa, o governador do Maranhão, que recebe solidariedade dos colegas da região

Escrito por Redação ,
Legenda: Em conversa com Onyx Lorenzoni, antes de entrevista a jornalistas, Bolsonaro criticou governador do Maranhão, de forma pejorativa
Foto: Foto: PR

Um dia após a cerimônia em que comemorou 200 dias de Governo, o presidente Jair Bolsonaro se envolveu, nesta sexta-feira, em uma série de polêmicas devido a declarações dadas em público. Uma delas gerou uma reação coletiva dos governadores do Nordeste devido ao uso da expressão pejorativa “paraíba”.

O vídeo que provocou a reação dos governadores mostra a chegada do presidente a um café da manhã com jornalistas da imprensa estrangeira, nesta sexta. Segundos antes de o ato efetivamente começar, os microfones da mesa captam trechos de uma conversa entre Bolsonaro e o ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil).

Há ruídos no áudio, captado pela equipe da TV Brasil que filmava o encontro, mas é possível ouvir que Bolsonaro faz críticas a gestores da região e pede para restringir repasses a um dos representantes dos nordestinos.

É possível detectar que o presidente usa a expressão “governadores de Paraíba” e, em seguida, afirma que “o pior (inaudível) é o do Maranhão”.

O chefe do Executivo estadual do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), publicou, na noite de sexta, em sua página no Facebook, uma nota intitulada “Carta dos Governadores do Nordeste”, fazendo referência ao vídeo.

“Nós, governadores do Nordeste, em respeito à Constituição e à democracia, sempre buscamos manter produtiva relação institucional com o Governo Federal.

Independentemente de normais diferenças políticas, o princípio federativo exige que os governos mantenham diálogo e convergências, a fim de que metas administrativas sejam concretizadas visando sempre melhorar a vida da população”, cita a nota divulgada por Flávio Dino, em sua rede social. 

“Recebemos com espanto e profunda indignação a declaração do presidente da República transmitindo orientações de retaliação a governos estaduais, durante encontro com a imprensa internacional. Aguardamos esclarecimentos por parte da Presidência da República e reiteramos nossa defesa da Federação e da democracia”, finaliza.

Desde o início do ano, os governadores do Nordeste buscam mostrar união, promovendo encontros regulares, no “Fórum dos Governadores do Nordeste”, em Brasília, onde discutem uma pauta de reivindicações em comum para o diálogo com o Congresso e o Governo Bolsonaro. 

Em agosto, com a chegada da proposta de reforma da Previdência ao Senado, após a aprovação pela Câmara neste mês, serão travadas uma nova rodada de negociações políticas para a inclusão de estados e municípios nas mudanças das regras da aposentadorias. Nos últimos meses, não houve acordo para fazer isso no texto analisado na Câmara.

Legenda: Fórum dos Governadores do Nordeste divulga nota repudiando fala de Bolsonaro

‘Perseguição’

Além de postar a nota conjunta no Facebook, o governador maranhense usou sua conta oficial no Twitter para se manifestar sobre um vídeo postado no Youtube em que Bolsonaro aparece conversando com seu ministro.

“Como conheço a Constituição e as leis do Brasil, irei continuar a dialogar respeitosamente com as autoridades do Governo Federal e a colaborar administrativamente no que for possível. Eu respeito os princípios da legalidade e impessoalidade (art 37 da Constituição)”, tuitou o governador do Maranhão.

Sobre a fala do presidente, Dino escreveu no Twitter: “Neste vídeo, ouvi mais claramente o que disse o presidente da República. Parece chamar todos os nordestinos de ‘paraíba’ e me ameaça, com estranha raiva. Lamento e espero explicações, pois isso é algo realmente inédito e incompatível com a Constituição”, ressalta.

O governador do Maranhão classificou a fala de Bolsonaro captada no vídeo como um sinal de perseguição. “Independentemente de suas opiniões pessoais, o presidente da República não pode determinar perseguição contra um ente da Federação. Seja o Maranhão ou a Paraíba ou qualquer outro Estado. ‘Não tem que ter nada para esse cara’ é uma orientação administrativa gravemente ilegal”, escreveu Flávio Dino.

Até o fechamento desta edição, o Palácio do Planalto não tinha se manifestado oficialmente sobre a reação dos governadores do Nordeste. Na eleição passada, o Nordeste foi a única região do País em que o então candidato do PSL não conseguiu obter a maioria dos votos.

Fome

A declaração sobre os governadores do Nordeste não foi a única controvérsia do presidente Jair Bolsonaro, nesta sexta. Durante o mesmo evento com os jornalistas estrangeiros, ele disse que não existe fome no Brasil. “Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira. Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora, passar fome, não”, disse em café da manhã com correspondentes internacionais.

“Você não vê gente mesmo pobre pelas ruas com físico esquelético como a gente vê em alguns outros países pelo mundo”, disse o presidente, sem citar nominalmente as nações que mencionou na declaração.

A fala foi uma resposta do presidente a uma representante do jornal espanhol El País, em Brasília, que disse que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, havia manifestado preocupação com a desigualdade no Brasil e quis saber que trabalho o Governo tem realizado para reduzir a pobreza no País.

Mais tarde, ao final de um evento em comemoração ao Dia Nacional do Futebol, o presidente amenizou a fala e reconheceu “alguns passam fome” e afirmou que era inadmissível isso ocorrer num país com as características naturais do Brasil.

Questionado se estava recuando sobre a afirmação de que não havia fome no Brasil, Bolsonaro se irritou. “Ah, pelo amor de Deus, se for para entrar em detalhes, eu vou embora. Eu não tô vendo nenhum magro aqui [entre os jornalistas]. Temos problemas no Brasil, temos, não é culpa minha, vem de trás. Vamos tentar resolver”, afirmou.

“O que tira o homem e a mulher da miséria é o conhecimento, não são bolsas e programas assistencialistas. Nós temos que lutar nesse sentido, nessa linha, para dar dignidade ao homem e à mulher brasileira”.

Nas redes sociais, um dos filhos do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro, criticou o encontro do pai com os correspondentes. “Por que o presidente insiste no tal café da manhã semanal com ‘jornalistas’? Absolutamente tudo que diz é tirado do contexto para prejudicá-lo”.