O furto que entrou para a história

Cerca de 30 homens levam R$ 164,7 milhões do Banco Central em Fortaleza. Tem início a grande caçada

Escrito por Redação ,

No princípio, só se via um buraco. Era o ponto final do que teve no dia 5 de agosto de 2005 o momento mais intenso e esperado, após três meses de planejamento e escavações.  Três dias depois, o 8 de agosto tornou-se a segunda-feira histórica sobre o abalo à caixa-forte mais forte de todas. Do ralo que se criou no cofre do Banco Central de Fortaleza foram levados R$ 164 milhões e ninguém para contar a história. Só estava começando.

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O buraco rompia 1,10 metro da caixa-forte e levava a um túnel cruzando, a três metros de profundidade, a Avenida Dom Manuel. Mais de 900 escoras de madeira, argamassa, davam no quintal da casa de número 1071, já na Rua 25 de Março, 75 metros distante de quando começou.

Uma fachada apontava falsa empresa de grama sintética. Dentro da casa, muita areia acumulada em sacos nos quartos e compactada em falsas paredes. Soltas pelo chão, notas de R$ 50 reais verdadeiras e retiradas de circulação, não-rastreáveis, pareciam alguns trocados distantes do que somente dias depois se teve dimensão: era o maior furto a banco da história do Brasil. Um troco viria depois.

Policiais iniciam as buscas com duas perguntas: o que a casa pode lhes dizer e para onde teriam ido seus "moradores" com 3,5 toneladas de cédulas de R$ 50? Foram de carro? A Polícia Civil procura nas concessionárias de veículos de Fortaleza quem poderia ter feito compra à vista com notas de R$ 50. E mais: solicitando veículos com placas de outros Estados. Foram de avião? A Federal vai ao aeroporto com os registros de identidade de passageiros que compraram bilhetes à vista e com iguais cédulas.

'Grandes bandidos'

"Um crime dessa magnitude envolveu gente de fora", afirma o delegado federal Francisco Bonfim, a essa altura já ajudado pelo colega Antônio Celso, o 'casca grossa' responsável pela elucidação de outros crimes, que desembarca de Brasília e logo assume as investigações.

No dia seguinte à descoberta do túnel já se sabe que um caminhão cegonha com aproximadamente 11 carros corta o País vindo de Fortaleza, saído da loja Brilhe Car, dos irmãos Dermival e José Elizomarte Fernandes. Sem saber do que se tratava, o motorista era acompanhado do dono da Transportadora JE, Charles Machado de Morais. Numa das paradas na estrada observou notas de R$ 50 caídas no chão de um dos veículos. Estranhou também a ansiedade do patrão, inclusive, em ligações que fazia nos orelhões pela rodovia. A essa altura, Antônio Celso já seguia os passos de Charles, monitorado em cada posto rodoviário. Num posto da PRF entre Curvelo e Sete Lagoas, em Minas Gerais, o motorista chama a atenção dos policiais para algo que estaria errado. Tem fim ali o caminho de R$ 3,1 milhões do Banco Central. Falta mais.

Charles é irmão de Marcos Rogério "Bocão", ambos de Boa Viagem tanto quanto um já conhecido da Polícia exatamente pelos crimes contra instituições financeiras: Antônio Jussivan dos Santos, o "Alemão". Esse nome não só permanece na lista dos principais suspeitos como leva a muitos outros. Ganha fôlego a caça às onças do Banco Central.

Em três dias, parte do bando já estava identificada pela Polícia Federal, tentando trabalhar em silêncio por meio das interceptações telefônicas, retrato falado e cruzamento de dados. Enquanto isso, na primeira segunda-feira após a descoberta do furto, cinco metros do buraco que davam na caixa-forte do Banco Central são fechados com concreto em toda sua extensão. As escutas telefônicas levam a Antônio Edimar Bezerra, que leva a uma casa no bairro Mondubim onde havia movimentação suspeita de carros com placas de Fortaleza, Santana de Parnaíba (SP) e Mossoró (RN).

Estavam enterrados R$ 12,5 milhões em canos PVC. O dinheiro seria distribuído entre parte dos envolvidos. Não foi mais. Mas era preciso procurar muitos outros milhões.

Cobiça

Estima-se que cerca de 30 homens eram divididos em três grupos, cada um, ficando com pouco mais de R$ 50 milhões, o que daria R$ 5 milhões para cada. A cobiça posterior à primeira, da quadrilha, foi grande e determinante do que os criminosos encontrariam pelo caminho.

Enquanto eram caçados pela Polícia Federal, outros bandidos (incluindo policiais corruptos) extorquiam os milionários escavadores. Dois meses após o furto, Fernando Pereira, o Fê, apontado como um dos líderes, é sequestrado em São Paulo. Dois dias depois, a família paga R$ 2 milhões de resgate. "Fê" é encontrado morto em Camanducaia (MG) - crime cometido por policiais civis. O irmão de 'Alemão' também foi sequestrado.

Houve novos sequestros pelo menos nos três primeiros anos após o grande furto. Em casos como de Fernando, o Fernandinho ou 'Fê' e Deusimar Neves, as extorsões findaram em morte - no caso de Neves, o caso foi tratado como suicídio pela Polícia.

Foram 133 pessoas denunciadas e 94 condenados, com 2 acusados mortos e a maior parte presa. São números que se somam aos "164 milhões". Um dinheiro que mudou suas vidas.

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