Congresso quer acelerar votação que prevê prisão em 2ª instância

Câmara dos Deputados e Senado Federal iniciam a tramitação das propostas de emenda à Constituição. A possibilidade de mudar cláusulas pétreas entram em discussão. A Suprema Corte pode ser provocada sobre o assunto

Escrito por Carol Curvello , politica@verdesmares.com.br
Legenda: O acesso à Esplanada dos Ministérios será interditado em razão de reunião dos Brics
Foto: Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que proibiu prisão a condenados em segunda instância, congressistas se mobilizam para mudar o entendimento do tema na Constituição Federal nos próximos dias. Os entraves para a pauta são que a prioridade, em Brasília, nesta semana, é o encontro da cúpula do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), que ocorre a partir de amanhã e se estende até quinta, no Palácio do Itamaraty. Com a reunião, o acesso à Esplanada dos Ministérios, onde fica a sede do Congresso, será interditado e as sessões ocorrerão somente até esta terça-feira.

Com o prazo curto, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na Câmara decidiu dar celeridade à Proposta de Emenda à Constituição 410/18, que prevê a possibilidade da prisão após condenação em segunda instância.

A discussão da proposta começou nesta segunda-feira (11). A oposição, com a obstrução, tenta barrar a tramitação da proposta.

Na avaliação do deputado federal Eduardo Bismarck (PDT), o STF tomou uma decisão correta, porque a prisão em segunda instância não guarda amparo na Constituição. Ele alegou que o certo agora é o Congresso legislar sobre o assunto.

"Votaremos a admissibilidade da PEC na CCJ. Eu votarei pela admissibilidade, mas eu não acho que esse seja o caminho ideal, o melhor seria uma reforma no Código do Processo Penal", explicou.

Bismarck propõe que o ideal seria "reduzir o número de recursos para que o processo seja mais célere e preferencialmente que prisão ocorra quando do julgamento do recurso no STJ, ou pelo menos quando da admissibilidade".

O deputado José Guimarães (PT), membro da CCJ, reforçou que o momento é para comemorar a liberdade do ex-presidente Lula e não pensar em mudanças na Constituição. "Se projetos de prisão em segunda instância entrarem na pauta da Câmara, a gente analisa com mais calma. Mas vamos tentar barrar", disse.

Uma proposta semelhante à da Câmara também começou a ser discutida na CCJ do Senado, a PEC 5/19, de autoria do senador Oriovisto Guimarães (Podemos/PR). O texto insere o inciso XVI no art. 93 da Constituição Federal para permitir a possibilidade de execução provisória da pena, após a condenação por órgão colegiado.

A PEC tem como relatora na comissão a senadora Juíza Selma (Podemos-MT), que deu parecer favorável à aprovação do texto. Em seu relatório, a senadora explicou que a proposta é simples, definindo que a "decisão condenatória proferida por órgãos colegiados deve ser executada imediatamente, independentemente do cabimento de eventuais recursos". E ressaltou que a PEC não viola cláusula pétrea da Constituição.

De acordo com o senador Eduardo Girão (Podemos), a prisão em segunda instância se tornou uma causa nacional. "Estamos discutindo a melhor estratégia para aprovar o mais rápido possível a PEC que regulamenta a prisão após julgamento em segunda instância", disse.

Hoje, a Constituição diz que o réu só pode ser considerado culpado após o trânsito em julgado, ou seja, após o esgotamento de todos os recursos em todas as instâncias da Justiça. Até semana passada, o STF adotava um entendimento que permitia a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância. O método se tornou regra na Lava Jato.

Cláusula pétrea

Na avaliação do consultor político de relações governamentais da BMJ, Lucas Fernandes, a PEC da segunda instância tem mais chances de avançar no Senado do que na Câmara, devido ao rito de tramitação especial. Segundo ele, vai depender do STF sobre o entendimento se a proposta interfere ou não na cláusula pétrea.

"A chance de judicialização é altíssima porque existe uma divergência entre os ministros, então mesmo sendo aprovada, vai ter que passar pelo crivo do STF que pode invalidar, mas isso poderá prejudicar ainda mais a imagem do STF que já está altamente desgastada com o último julgamento", explicou.

O cientista político Rócio Barreto defende que a mudança do entendimento da Suprema Corte só pode ser feita com nova Constituição.

"Há uma dicotomia no Congresso e com relação a essa PEC a gente vê que é algo que está fora do controle porque é uma cláusula pétrea e não pode ser mudada a questão da presunção de inocência. Isso só mudaria com uma nova Constituição. Não há o que se discutir, o STF só tornou constitucional o que já estava escrito na Constituição", declarou o pesquisador.

Cearenses

O deputado federal Heitor Freire (PSL) considerou "lamentável" a decisão dos ministros em desconsiderar a prisão em segunda instância, e alegou que o Congresso vai ter que fazer a sua parte.

"Trata-se de uma cobrança da própria sociedade. É lamentável que o Brasil ainda tenha uma péssima reputação em torno da impunidade soberana para alguns privilegiados", disse o parlamentar.

Para o deputado Capitão Wagner (Pros), a decisão do Supremo "não foi acertada e é incoerente" com as decisões anteriores. Ele reforçou que o Congresso vai ter que evitar "brechas" na Constituição sobre o assunto.

"Cada ministro deveria manter seu posicionamento. Como já foi argumentado, uma condenação em segunda instância já permitiu que o condenado tivesse direito de defesa em diversas circunstâncias, além dos recursos. Agora cabe ao Congresso Nacional fazer a parte dele", informou o deputado federal.

Maia ressalta respeito à Constituição

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 410/18) que prevê a prisão de condenado após o julgamento de uma segunda instância deve seguir os ritos normais de tramitação na Casa após votação da admissibilidade pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mas ressaltou que a Câmara deve respeitar os direitos fundamentais e não descaracterizar cláusulas pétreas.

Atualmente, a Constituição estabelece que o réu só pode ser considerado culpado após o trânsito em julgado, ou seja, após o esgotamento de todos os recursos em todas as instâncias da Justiça. 

Na semana passada, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) derrubaram a possibilidade, modificando um entendimento que vinha sendo adotado pelo Tribunal desde 2016.

Cláusula pétrea

Segundo Maia, há outros dispositivos na Constituição que permitem que a morosidade da Justiça seja enfrentada, sem desrespeitar as cláusulas pétreas.

“Espero que a Câmara não caminhe para descaracterizar uma cláusula pétrea, existem outros caminhos para se chegar ao resultado que se quer, de acabar com a morosidade do Judiciário, para que as pessoas não usem os atrasos em benefício dos que cometeram crime, mas crime maior seria desrespeitar e mudar o artigo 5º da Constituição”, destacou Maia.

“Tem caminhos por lei, caminhos por outros artigos, que são boas ideias, que poderão ter riscos de judicialização posterior, mas não vão contra a Constituição brasileira”, disse.

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