Cactus em extinção e protegido pelo Ibama é vendido em Fortaleza

Em feiras de mudas na Capital é possível encontrar planta nativa da Caatinga conhecida como coroa-de-frade. A espécie está em risco de extinção e possui importância ambiental principalmente em períodos de seca

Escrito por Redação , metro@svm.com.br
Legenda: Coroa-de-frade, vendido em Fortaleza, é fonte de frutos carnosos procurados por animais durante a seca
Foto: FOTO: HELENE SANTOS

Trazer verde para dentro de casa dá vida ao ambiente e movimenta as feiras de mudas em Fortaleza. Mas, o gesto pode contribuir para elevar o risco de extinção de algumas espécies nativas da Caatinga. Entre elas está a conhecida como coroa-de-frade, classificada como melocactus, proibida de ser comercializada devido à alta chance de extinção e encontrada pela reportagem do Sistema Verdes Mares em pontos de venda da Capital. A proibição consta em uma portaria do Ministério do Meio Ambiente de 2014. A norma lista as espécies da flora ameaçadas de extinção.

As variações desta espécie levam cerca de 10 anos para esbanjarem a beleza que atrai os consumidores e, na natureza, servem de alimento para a fauna no período da seca, além de desempenharem função na formação do solo.

Na Praça das Flores, na Av. Desembargador Moreira, a vendedora anuncia "Esse é o mais raro que tem. Ele vem do sertão", apontando para a coroa-de-frade comercializada por R$20. Em outro box, o vendedor possui vários exemplares do cactus. "Com a coroa assim já é mais caro. Tem assim (menor) que é R$ 30. Para abrir a coroa tem que estar no sol", explica. O de tamanho maior, com flores de cor rosa no topo, custa R$ 50. "Quanto maior, mais caro ele é, porque demora muito a crescer. São anos. Ele já veio assim para gente", diz.

No Mercado das Flores, na Av. Pontes Vieira, foi procurada a espécie. "Aqui, temos imitação, cabeça-de-frade mesmo é da selva, é proibida a venda. Tem similar que é produzida em cativeiro, mas o original é proibido", conta o vendedor.

Quem encontra nos cuidados de plantas uma forma de se conectar com a natureza tem um motivo a mais para se preocupar com a origem das mudas comercializadas, ressalta Lamartine de Oliveira, professor de agronomia da Universidade Federal do Ceará (UFC). "Quando você encontra uma coroa-de-frade já adulta e florando (é um indício de ilegalidade). Se você compra por R$ 25 não paga o valor dela porque demora muito tempo para chegar aquele tamanho".

Legenda: Tipo de cactus é retirado de forma irregular da natureza onde têm relevância ambiental.
Foto: Helene Santos

Os maiores custos ficam na conta do ecossistema que perde uma fonte de frutos carnosos buscado por animais em período de estiagem e um agente de intemperismo biológico - processo natural de desgaste de rochas relevante para a qualidade do solo. "Mesmo retirada de um indivíduo, no meio de uma população que tem centenas, o desequilíbrio é enorme porque são muitos frutos. São muitas sementes que precisam ser produzidas para um germinar e aí são décadas para se tornar reprodutivo", destaca o professor.

Fiscalização

O documento de origem florestal atesta que o exemplar vendido não foi retirado indevidamente da natureza, destaca Miller Holanda, chefe técnico ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Sobre a fiscalização, ele reforça que o Ibama atua em ações de grande impacto como o transporte irregular. "Essas ações mais pontuais, pela legislação, devem ser atuadas por um órgão local. Quem autoriza tem de fiscalizar".

Questionada sobre a fiscalização, a Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Ceará (Adagri), disse que o órgão monitora o comércio de sementes e mudas, com foco nas espécies frutíferas e ornamentais hospedeiras de pragas quarentenárias. Em caso de comercialização de espécies proibidas, informa a Adagri, as denúncias devem ser encaminhadas à Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace).

Já a Semace, por meio da assessoria, informou que devido à legislação, o órgão não pode atuar em municípios onde há autoridade ambiental. Em Fortaleza, a competência, segundo a Semace, é da Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma). A Seuma repassou a demanda à Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis) que recomendou procurar os órgãos estaduais já mencionados.

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