Senadores aprovam novo marco regulatório do saneamento básico
Com relatoria do senador cearense Tasso Jereissati, a proposta aprovada, ontem, no Senado, segue para a promulgação pelo presidente Jair Bolsonaro. Texto prevê a participação da iniciativa privada na prestação do serviço
Os senadores aprovaram, ontem, o novo marco regulatório do saneamento básico. A proposta, aprovada em dezembro do ano passado pela Câmara dos Deputados, não sofreu modificações na passagem pelo Senado e segue agora para a promulgação pelo presidente Jair Bolsonaro.
O Projeto de Lei 4.162/2019 foi aprovado, ontem, por 65 votos a 13. Com relatoria do senador cearense Tasso Jereissati (PSDB), a proposta prevê licitações para a contratação de empresas para gerir o setor, com a facilitação da privatização de estatais, e prorroga o prazo para o fim dos lixões. O tucano recomendou a aprovação do projeto sem alterações, o que foi acatado pelos senadores, apesar da divergência entre os parlamentares. Tasso rejeitou a única emenda apresentada pelo senador Lasier Martins (Podemos), por entender que o texto do projeto já contempla essa possibilidade.
O novo marco regulatório do saneamento básico extingue o modelo atual de contrato entre os municípios e as empresas estaduais de água e esgoto. Pelas regras em vigor, as companhias precisam obedecer critérios de prestação e tarifação, mas podem atuar sem concorrência.
O novo marco transforma os contratos em vigor em concessões com a empresa privada que vier a assumir a estatal.
O texto também torna obrigatória a abertura de licitação, envolvendo empresas públicas e privadas.
Pelo projeto, os contratos que já estão em vigor serão mantidos e, até março de 2022, poderão ser prorrogados por 30 anos. No entanto, esses contratos deverão comprovar viabilidade econômico-financeira, ou seja, as empresas devem demonstrar que conseguem se manter por conta própria - via cobrança de tarifas e de contratação de dívida. Os contratos também deverão se comprometer com metas de universalização a serem cumpridas até o fim de 2033: cobertura de 99% para o fornecimento de água potável e de 90% para coleta e tratamento de esgoto. Essas porcentagens são calculadas sobre a população da área atendida.
Regulação
A Agência Nacional de Águas, a ANA, deverá assumir uma nova atribuição com a sanção do projeto pelo presidente Jair Bolsonaro. O órgão será o responsável pela supervisão das relações entre as empresas de saneamento e os municípios, que têm a atribuição de regular o serviço.
A agência solicitou ao Governo 166 novos servidores e um orçamento extra de R$ 7 milhões a R$ 10 milhões por ano.
Diretora-geral da agência, Christianne Dias, reconhece restrições orçamentárias do Governo Federal, mas diz que a estrutura atual não é a necessária para assumir as novas funções. "O grande mote do projeto é criar um ambiente em que o investidor se sinta seguro para entrar e trazer o seu dinheiro", disse Dias.
"Que ele saiba onde está entrando, qual o risco que assume e que as regras não vão ser alteradas de forma arbitrária no meio da concessão".
As novas atribuições vão desde propor modelo de funcionamento de agências reguladoras estaduais e municipais a estipular normas para cálculo de tarifas e metas de universalização do acesso a água e esgoto. As metas ou regras contratuais para caducidade dos contratos ainda serão definidas e devem respeitar especificidades regionais, afirma Dias. A ANA vai estabelecer padrões para o funcionamento das agências reguladoras locais, como tempo de mandato e critérios técnicos para a escolha dos diretores.
Investimento
Ainda em março, o Senado recebeu um ofício assinado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, colocando a matéria como uma das prioridades para o Governo Federal durante a pandemia da Covid-19.
"Trata-se de matérias infraconstitucionais que estão em tramitação e que são extremamente relevantes para resguardar a economia do País, aumentando a segurança jurídica para os negócios e para atrair investimentos", afirmou Guedes no documento.
A estimativa do Governo de que o novo marco legal do saneamento possa gerar cerca de 1 milhão de empregos nos próximos cinco anos transformou o setor em uma das principais apostas para estimular a retomada da economia após a crise e conseguiu um feito raro nos dias atuais: colocar Executivo, o Legislativo e o setor privado do mesmo lado.
O relatório de Tasso prevê investimentos de R$ 700 bilhões para universalizar os serviços em um prazo de 12 anos. O Ministério da Economia fala em R$ 600 bilhões. O projeto abre espaço para a iniciativa privada atuar na exploração do setor e institui um regime de licitações. "O relatório não é de privatização, é de universalização. Ninguém é obrigado a privatizar nada, nenhum governador, nenhum prefeito. Quem quiser privatizar, privatiza. Quem quiser dividir... É de somar todos os recursos que possam estar disponíveis, públicos ou privados, para alcançar essa meta, que devia ser a meta nº 1 do nosso País hoje", disse Tasso.
Diagnóstico
No Brasil, 100 milhões não têm acesso a coleta de esgoto, o que corresponde a metade da população, enquanto 35 milhões não têm água tratada.
Além disso, o País perde 38% de toda água potável, tratada e pronta para ser distribuída. Isso representa R$ 12 bilhões, o equivalente a todo investimento anual do setor.
No Ceará, existe uma ampla cobertura da rede de água, com 92% tendo água tratada em casa, mas a coleta de esgoto ainda é inferior a 40% com apenas 39,6% da população tendo acesso ao serviço. O número, no entanto, não é equivalente ao atendimento da população no setor, que é de 74% e 33%, respectivamente.
Prorrogação
A lei em vigor previa que os lixões deveriam acabar em 2014. O projeto estende os prazos da Política Nacional de Resíduos Sólidos para que as cidades encerrem os lixões a céu aberto. O novo prazo é de 2021 para capitais e suas regiões metropolitanas. Em cidades com até 50 mil habitantes, o prazo prorrogado é de 2024.
O senador Cid Gomes (PDT-CE) votou a favor da proposta, mas avaliou que, sem subsídio público e financiamento do Governo Federal, o objetivo não vai ser atingido, e o acesso à água e ao esgotamento sanitário não chegará aos mais pobres. Ele destacou que o Ceará é 100% atendido por empresas públicas. E que setor privado sozinho não tem como resolver o problema.