Governo libera mais de R$ 175 mi em emendas ao Ceará antes de votação da reforma da Previdência
Valores de emendas empenhadas só neste mês representam metade do total pago em sugestões de parlamentares durante todo o ano passado. Emendas mais liberadas até o momento são as coletivas, com destaque para a Saúde
Às vésperas da votação da reforma da Previdência, o Governo Bolsonaro intensificou a liberação de emendas de deputados federais, inclusive da bancada cearense. Levantamento feito pela Consultoria de Orçamento da Câmara Federal, obtido pelo Diário do Nordeste, mostra que, do início de julho até a última segunda-feira (8), mais de R$ 175 milhões foram liberados para parlamentares do Estado, entre emendas empenhadas - ou seja, colocadas nas contas a pagar - e executadas ao Orçamento de 2018 e de anos anteriores que não chegaram a ser pagas.
Para se ter uma ideia do que isso representa, durante todo o ano passado, os representantes cearenses nas duas Casas do Congresso Nacional tiveram R$ 338 milhões pagos em emendas impositivas - pedidos de deputados e senadores para a destinação de verbas do Orçamento a projetos e obras nos estados e municípios, que representam, para todos os congressistas, 1,2% da Receita Corrente Líquida (RCL). Ou seja, apenas neste mês, o valor empenhado pelo Governo Bolsonaro corresponde a mais da metade do que foi pago em 2018.
Quando a referência de comparação são as emendas impositivas ao Orçamento de 2018 que foram empenhadas - cerca de R$476 milhões -, isso representa 36% do total.
Só na segunda-feira (8), o Governo Federal liberou, nacionalmente, R$ 1,13 bilhão em emendas parlamentares voltadas à área da Saúde. Deste montante, em edição extra do Diário Oficial da União, o Ministério da Saúde liberou para o Ceará - e deve efetuar pagamento em breve - um total de R$ 32,1 milhões por meio de emendas parlamentares. Os destinos de parte das verbas são bases eleitorais de deputados que dizem estar indecisos ou ainda não tornaram público posicionamento quanto à reforma.
Municípios
Para Fortaleza, foram liberados na área da Saúde R$ 10,3 milhões. O restante foi destinado a outros 14 municípios cearenses, onde deputados federais alinhados ao Governo Bolsonaro (PSL) estiveram entre os mais votados no pleito de 2018. Para Tauá, reduto eleitoral do deputado federal Domingos Neto (PSD), foi liberado R$ 1,5 milhão. O parlamentar, coordenador da bancada cearense no Congresso, já havia declarado ao Diário do Nordeste que viu com bons olhos o texto da reforma da Previdência aprovado na comissão especial da Câmara.
Outro R$ 1,5 milhão foi liberado para Granja. Para Itapajé, uma das bases eleitorais do deputado federal Antônio José Albuquerque (PP), o Governo Federal liberou R$ 2,5 milhões. Para Viçosa do Ceará, outra base do parlamentar do PP, o Palácio do Planalto deve enviar R$ 1,5 milhão. Ele ainda não decidiu sua posição sobre a reforma.
Na lista dos municípios que deverão receber verbas para a Saúde, em breve, também está Santa Quitéria, onde o deputado federal Pedro Bezerra (PTB) é um dos mais votados. Para Crato, outra cidade em que o parlamentar também teve muitos votos, o Governo Federal liberou R$ 1 milhão. Pedro não decidiu como votará em plenário.
Outras bases
O Governo sinalizou, ainda, emendas para Acaraú, uma das bases eleitorais de Aníbal Gomes (DEM), suplente em exercício do mandato, que também diz estar indeciso. Para o município, foram liberados R$ 5,6 milhões. Aníbal também tem votos em Cascavel, que deverá ser beneficiada em emendas com verba de R$ 500 mil.
O Palácio do Planalto assegurou R$ 1 milhão para Crateús, reduto do deputado federal Genecias Noronha, que é a favor da reforma. Genecias também é bem votado em Quixeramobim, que, igualmente, deverá receber R$ 1 milhão em emendas.
Na lista de pedidos liberados para outras áreas além da Saúde, como Educação e políticas de desenvolvimento, há também casos de emendas pagas a parlamentares cujos votos não devem ser cortejados pelo Governo Federal, visto que não estão mais na Casa.
Como este é o primeiro ano da atual legislatura, as emendas em execução são de autoria não dos deputados atuais, mas dos que estavam em exercício de mandato no ano anterior. Por isso, na lista de empenho, está, por exemplo, Vitor Valim (Pros), que teve cerca de R$ 1 milhão em emendas distribuídas para os municípios de Horizonte, Ipu, Tururu e Ibiapina. Atualmente, ele é deputado estadual. Já Raimundo Gomes de Matos (PSDB), que conseguiu destinar R$ 1 milhão em emendas para investimentos em Saúde em Aracati, não teve sucesso na sua busca pela reeleição.
'Cumprindo a lei'
Outros pagamentos, embora correspondam a sugestões ao Orçamento feitas por deputados reeleitos, não devem influenciar votos favoráveis ao Palácio do Planalto, já que dizem respeito a emendas de parlamentares de oposição. Luizianne Lins (PT), por exemplo, teve uma série de emendas para a área de Saúde empenhadas na quinta-feira (4). No mesmo dia, Leônidas Cristino (PDT) teve mais de R$1,5 milhão empenhado. Seu partido já fechou questão contra a reforma, ou seja, o deputado que votar a favor tende a ser alvo de punições, que podem chegar até mesmo à expulsão da sigla e consequente perda de mandato.
Apesar dos pagamentos individuais, as emendas coletivas da bancada têm liderado na quantidade de sugestões ao Orçamento da União empenhadas pelo Governo Federal nos últimos dias. Foram empenhados R$ 123 milhões da bancada apenas na última sexta-feira (5), quando houve o maior pagamento.
Diante da acusação pela oposição de que o Governo estaria usando a liberação de emendas para obter votos em favor da aprovação da reforma da Previdência, o presidente Jair Bolsonaro disse, ontem, estar "apenas cumprindo o que a lei determina". "Por conta do orçamento impositivo, o Governo é obrigado a liberar anualmente recursos previstos no orçamento da União aos parlamentares e a aplicação destas emendas é indicada pelos mesmos".
Desconfiança
Em meio à cobrança de parlamentares para que o Governo cumpra a promessa de pagar emendas orçamentárias para a votação da reforma da Previdência, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou no início da noite de ontem que a “relação do Legislativo com o Executivo é sempre de desconfiança”.
Expectativa
Apesar de o Governo ter acelerado a liberação de emendas e oferecido um lote extra aos parlamentares, partidos ampliaram a lista de exigências, atrasando o início da votação da reforma da Previdência no plenário da Câmara. As siglas pressionam por um volume maior de empenho de emendas e manifestam desconfiança de que o Governo, passada a votação, vá descumprir a sua palavra. É normal, por exemplo, empenhos ficarem anos na gaveta e serem cancelados sem execução.