Com deficiências, africanos apelam a curandeiros contra a Covid-19

Carente de estrutura de atendimento de saúde, países do segundo continente mais populoso do mundo recorrem à medicina popular para enfrentar coronavírus

Escrito por Redação ,
Legenda: Presidente de Madagascar, Andry Rajoelina, toma bebida fitoterápica feita à base da planta artemísia
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Com 1.223 mortos entre 25.461 infectados pela Covid-19, a África é, junto com a Oceania, um dos continentes menos atingidos pela pandemia. É possível, no entanto, que os números sejam subestimados, diante da falta de testes em massa. O 2º maior e mais populoso continente do mundo, depois da Ásia, reúne 54 países, lar de 1,3 bilhão de habitantes, submetidos à miséria e à falta de infraestrutura de saúde.

Diante desse quadro desolador, chás de ervas, especiarias, frutas ou verduras compõem a lista de remédios alternativos na África para curar a Covid-19, que ganha adeptos em um continente onde a medicina tradicional continua sendo apreciada e respeitada.

O chefe de Estado do Madagascar, Andry Rajoelina, elogiou as qualidades curativas de um chá à base de artemísia - uma planta com eficácia cientificamente comprovada contra a malária -, embora tenha recuado mais tarde e mencionado apenas suas virtudes preventivas, que fortaleceriam o sistema imunológico.

Legenda: Artesímia é usada em Madagascar para supostamente prevenir a Covid-19
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Decano da faculdade de medicina de Toamasina (leste), o doutor Stéphane Ralandison alertou contra os métodos "não muito científicos" em torno deste chá de ervas. Embora reconheça que algumas substâncias podem "aliviar os sintomas" do coronavírus, a Organização Mundial da Saúde (OMS) também lembra que hoje não há "nenhuma evidência" que possa "prevenir ou curar a doença".

Curandeiros

Na ausência de uma vacina ou até de um tratamento eficaz oferecido pela medicina ocidental, os curandeiros tradicionais se mostram como uma opção. É o caso de Gabriel Nsombla, que divulga suas poções em uma rádio da República Democrática do Congo (RDC). "Inalar o vapor de uma mistura de casca de manga, folhas de mamão, gengibre e uma planta cujo nome mantenho em segredo, garante a cura. Todos os que vêm à minha casa saem curados", diz.

Diferentemente de seus colegas chineses, que obtiveram reconhecimento nos países ocidentais, os médicos tradicionais africanos deploram as provocações das quais muitas vezes ainda estão sujeitos.

Legenda: "Garrafada de artemísia" promete "prevenir" Covid-19; OMS não aprova
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O fitoterapeuta sul-africano Makelani Bantu lamenta que seu governo não tenha se dignado a responder sua oferta de testar cientificamente sua culinária. "Não temos sequer a oportunidade de falar. No momento, não possuem solução contra a Covid-19. Poderiam pelo menos testar nossos tratamentos", enfatizou.

Até o momento, as autoridades dos países africanos receberam essas promessas com cautela. O porta-voz do Ministério da Saúde da África do Sul, Pop Maja, diz "respeitar o papel dos curandeiros tradicionais". Mas até certo ponto. "No momento, não há tratamento para a Covid-19, mas todos os dias recebo entre 10 e 15 telefonemas de pessoas que dizem ter encontrado um".

Falta de oxigênio

Enquanto nos hospitais dos países ricos a pandemia provocou um aumento da demanda de respiradores artificiais, os especialistas alertam para a escassez de cilindros de oxigênio, básicos em todas as UTIs, em países africanos, como a Nigéria. “A realidade é que o oxigênio é a única terapia que salvará vidas na África e na Ásia-Pacífico”, declarou Hamish Graham, pediatra e pesquisador do hospital universitário de Melbourne.

“Nos hospitais dos países ricos, o oxigênio é algo considerado certo”, explica Graham. Mas no resto do mundo, “os profissionais da saúde estão perfeitamente conscientes do problema, pois lutam diariamente para poder fornecer oxigênio a seus pacientes”.

Estudos mostram que, menos da metade dos hospitais na África e Ásia-Pacífico dispõem de oxigênio. Os sistemas de saúde na África não investiram em terapias respiratórias.

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