Onde estão as sondas Voyager 1 e 2 e como elas ainda se comunicam com a Terra
Elas são as únicas espaçonaves que operam fora da heliosfera
As Voyager 1 e 2 foram construídas pela Nasa e lançadas do Centro Espacial Kennedy, no Cabo Canaveral, Flórida (EUA).
A Voyager 2 partiu primeiro, em 20 de agosto de 1977, e a Voyager 1 seguiu poucos dias depois, em 5 de setembro de 1977.
Segundo Marcelo Zurita, presidente da Rede Brasileira de Observação de Meteoros (Bramon), as sondas funcionam sob o regime de economia de energia, pois os engenheiros que as projetaram acreditam que as Voyagers poderão operar com pelo menos um instrumento, até a década de 2030.
"Mesmo utilizando recursos tecnológicos dos anos 1970, as Voyager estão equipadas com uma série de mecanismos e sistemas que permitem que o controle da missão identifique e solucione os problemas mais comuns a partir da Terra", afirma.
Idênticas em design, as duas sondas são as únicas espaçonaves que operam fora da heliosfera, a bolha protetora formada pelas partículas e campos magnéticos emitidos pelo Sol.
Qual era o objetivo da missão?
O propósito inicial da missão Voyager era explorar os planetas exteriores do Sistema Solar — Júpiter e Saturno — e suas luas. As sondas foram projetadas para operar por cerca de cinco anos, tempo suficiente para estudar esses dois gigantes gasosos.
Mas o desempenho superou as expectativas. Com os instrumentos ainda ativos e a tecnologia resistindo, os engenheiros da Nasa decidiram estender a missão até Urano e Netuno, aproveitando um raro alinhamento planetário.
Assim, as Voyager ultrapassaram todos os objetivos originais e se tornaram exploradoras do espaço interestelar — viajando além da influência direta do Sol.
Hoje, são os objetos mais distantes já construídos pela humanidade, vagando pela Via Láctea e ainda enviando sinais para a Terra.
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Onde estão as Voyager agora?
De acordo com dados mais recentes da Nasa:
- Voyager 1 está a mais de 25 bilhões de quilômetros da Terra, o equivalente a cerca de 168 unidades astronômicas (UA). O sinal de rádio enviado por ela leva aproximadamente 23 horas e 20 minutos para chegar até nós.
- Voyager 2, que seguiu uma rota diferente, atravessou a heliosfera em 2018. Hoje está a cerca de 21 bilhões de quilômetros (ou 140 UA), com o sinal levando quase 19 horas e meia para alcançar o planeta.
Uma unidade astronômica (UA) equivale à distância média, em quilômetros (km) entre a Terra e o Sol
"Mesmo a essa distância, viajando na velocidade da luz, cada comando enviado para elas leva quase um dia inteiro para chegar lá e mais outro para recebermos a resposta", afirma Marcelo.
Em 2012, a Voyager 1 foi a primeira nave a cruzar a fronteira da heliosfera. Seis anos depois, a Voyager 2 fez o mesmo, confirmando que ambas agora navegam pelo espaço interestelar.
Como ainda é possível falar com elas?
A comunicação com as Voyager é feita através do Deep Space Network (DSN) — uma rede global de antenas gigantes mantida pela Nasa.
Essas antenas conseguem captar sinais extremamente fracos, equivalentes a menos de um milionésimo da energia de uma lâmpada comum, e também enviar comandos da Terra para as sondas.
A energia a bordo vem de geradores termoelétricos de radioisótopos (RTGs), que transformam o calor do decaimento do plutônio-238 em eletricidade.
De acordo com Zurita, além de obter dados completos da telemetria de cada instrumento, é possível desligar ou reiniciar instrumentos e subsistemas das sonsas, fazer ajustes de software, alterar configurações dos instrumentos e até mesmo comandar uma troca de computadores (do principal para o redundante) em caso de falhas.
Porém, essa fonte não é infinita: as sondas perdem cerca de 4 watts de potência por ano, obrigando a Nasa a desligar gradualmente instrumentos para economizar energia e manter apenas os mais essenciais ativos.
As descobertas das Voyager
A missão principal foi cumprida entre 1979 e 1989, com uma série de sobrevoos históricos:
- Júpiter (1979): As Voyager registraram mais de 33 mil imagens, revelando detalhes da atmosfera, das luas e da magnetosfera do planeta. A maior descoberta foi o vulcanismo ativo em Io, o primeiro já observado fora da Terra.
- Saturno (1980–1981): As sondas analisaram seus anéis e luas, ajudando a compreender a dinâmica do sistema saturniano.
- Urano (1986): A Voyager 2 revelou anéis escuros e 11 novas luas, além de mostrar que suas principais luas tinham superfícies geologicamente complexas.
- Netuno (1989): Também observada pela Voyager 2, essa foi a primeira e única visita humana ao planeta. A sonda captou imagens detalhadas de Netuno e de sua lua Tritão, encerrando a missão principal com sucesso.
Após essa etapa, ambas seguiram rumo ao espaço interestelar, em trajetórias opostas:
- A Voyager 1 viaja para o norte, a cerca de 3,6 UA por ano.
- A Voyager 2, para o sul, a cerca de 3,3 UA por ano.
O legado científico e cultural
As Voyager transformaram a compreensão do Sistema Solar. Foram as primeiras a explorar Urano e Netuno, registraram imagens inéditas de luas e anéis e ajudaram a entender a transição da heliosfera para o meio interestelar.
Mas o impacto vai além da ciência. Ambas carregam o “Disco de Ouro”, uma cápsula do tempo com sons, imagens e mensagens da Terra — uma saudação simbólica a possíveis civilizações extraterrestres.
Mesmo quando pararem de transmitir, as sondas continuarão viajando silenciosamente pelo espaço.
Segundo estimativas da Nasa, elas podem seguir por milhões de anos, cruzando regiões muito além da influência do Sol — levando consigo um pequeno retrato da humanidade.
Marcelo Zurita tem 46 anos, é microempresário, astrofotógrafo e astrônomo amador. Atualmente é Presidente da Associação Paraibana de Astronomia, Coordenador Nacional do Asteroid Day Brasil e diretor técnico da BRAMON, a Rede Brasileira de Observação de Meteoros. Também é membro da SAB - Sociedade Astronômica Brasileira, da ALPO - Association of Lunar and Planetary Observers e da IMO - International Meteor Organization.