MP pede que Governo do Ceará pague R$ 2 milhões por torturas contra jovens em centro socioeducativo

A Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo diz que envolvidos já foram responsabilizados e que denúncias são de 2022

Escrito por Matheus Facundo , matheus.facundo@svm.com.br
Em visita a adolescentes apreendidas, entidades ouviram relatos de violências físicas, psicológicas e sexuais contra as meninas
Legenda: Em visita a adolescentes apreendidas, entidades ouviram relatos de violências físicas, psicológicas e sexuais contra as meninas
Foto: Reprodução/Relatório de Visita de Inspeção ao Centro

O Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) quer que o Governo do Ceará pague R$ 2 milhões em indenização por danos morais por conta de torturas cometidas contra adolescentes internas no Centro Socioeducativo Aldaci Barbosa, em Fortaleza. Conforme o órgão, agentes "castigavam" as jovens e as mantinham trancadas por dias. 

Em nota enviada ao Diário do Nordeste, a Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo (Seas) informou que não foi notificada da Ação Civil Pública e diz que já houve "responsabilização de envolvidos" no início de 2023. 

"As denúncias apresentadas pelo Ministério Público são de 2022, com procedimentos de apuração e responsabilização pela Corregedoria da Seas, que instaurou o procedimento administrativo de sindicância na época, são de 2022", diz a Pasta. 

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Adolescentes algemadas

Conforme o MPCE, as violências foram relatadas em um Inquérito Civil Público instaurado após uma visita ao Centro Socioeducativo em 15 de dezembro de 2022. A titular da Promotoria de Infância e Juventude, um assessor jurídico e duas psicólogas foram ao local e colheram depoimentos de oito adolescentes. As menores de idade eram algemadas em grades de dormitórios e permaneciam na Ala Disciplinar (chamada “Tranca”) por um período maior que sete dias. 

Sobre as práticas descritas pelo MPCE, a Seas informou que publicou uma Instrução Normativa que regulamenta o uso de algemas dentro do sistema socioeducativo.

A Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE), o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca) e o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH) corroboraram as denúncias.

Segundo os documentos, "os fatos eram praticados por sete socioeducadores, com apoio dos coordenadores de segurança e aval da diretoria e equipe técnica, que tinham ciência dos fatos e justificavam as práticas hediondas como forma de disciplinar as jovens". 

Assédio sexual e torturas 

Segundo a Seas, as denúncias são relativas a 2022, mas em 2023 um Relatório de Visita de Inspeção elaborado por entidades de defesa dos direitos humanos e divulgado no dia 30 de outubro em Audiência Pública, aponta que as adolescentes continuaram sofrendo torturas, além de assédio sexual durante banhos, por exemplo. Consta no documento uma série de irregularidades que estariam acontecendo no equipamento, ocupado por 37 adolescentes de 12 a 19 anos, entre elas meninas cis e transexuais e meninos transexuais. 

No dia 5 de maio de 2023, dias após um princípio de rebelião, autoridades conversaram com internas. Foram coletados relatos de práticas institucionais que representavam risco à integridade física e psicológica das internas. 

No decorrer da inspeção, foram localizadas adolescentes sem colchão e sem acesso às atividades socioeducativas. As meninas dizem que a violência "faz parte da ambiência da unidade socioeducativa, seja através de xingamentos, violência física por parte dos/as socioeducadores/as e de práticas institucionais que geram risco à integridade delas. Existe ainda uma naturalização de punições que se configuram como práticas de maus tratos”.

O relatório expondo as denúncias foi lançado em audiência pública na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece), tendo sido elaborado pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (CEDDH), Comitê de Prevenção e Combate à Tortura (CEPTC) e Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Alece (CDH-Alece).

Na nota desta sexta-feira (24), a Seas pontuou em nota que o "Centro Socioeducativo Aldaci Barbosa Mota tem se destacado em relação à aplicação de metodologias integrativas, com foco em processos restaurativos, investindo na qualificação dos atendimentos prestados para a garantia de direitos, sendo atualmente uma unidade referência na execução de medidas socioeducativas". 

Leia a nota da Seas na íntegra:

A Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo informa que ainda não foi notificada em relação à ação pública. Contudo, as denúncias apresentadas pelo Ministério Público são de 2022, com procedimentos de apuração e responsabilização pela Corregedoria da Seas, que instaurou o procedimento administrativo de sindicância na época, finalizando no início de 2023 com a responsabilização de envolvidos.

Após a notificação do Ministério Público sobre o caso, a Seas publicou Instrução Normativa que regulamenta o uso de algemas no âmbito do sistema socioeducativo do Ceará. O Centro Socioeducativo Aldaci Barbosa Mota tem se destacado em relação à aplicação de metodologias integrativas, com foco em processos restaurativos, investindo na qualificação dos atendimentos prestados para a garantia de direitos, sendo atualmente uma unidade referência na execução de medidas socioeducativas.

 

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