Família de empresária Jamile de Oliveira diz que recebeu ligações com ameaças
A empresária completaria 47 anos ontem. Ela morreu no último dia 31 de agosto, com um tiro no peito. Em celebração, parentes disseram que receberam ameaças. A Polícia Civil continua ouvindo testemunhas do caso
A morte misteriosa de Jamile de Oliveira Correia se descortina a cada depoimento, exame e imagem, e a investigação da Polícia Civil avança para concluir se o que houve foi feminicídio ou suicídio. O namorado dela, o advogado Aldemir Pessoa Júnior, é suspeito de efetuar o tiro.
Ontem, dia que Jamile completaria 47 anos, amigos e familiares dela se reuniram em uma missa e, em seguida, saíram em manifestação pedindo por Justiça. Durante a celebração, parentes da mulher contaram que nos últimos dias, desde que o caso foi noticiado pelo Sistema Verdes Mares, pessoas próximas a Jamile vêm recebendo ameaças de um homem, mandando que eles não falem sobre o caso.
“São ligações estranhas. Eles dizem: ‘A família da Jamile vai pagar por isso’. A gente está abrindo o bocão, dizendo tudo que sabe. O que queremos é Justiça”, disse uma familiar da empresária. Outra parente de Jamile corroborou a informação sobre haver ameaças e destacou que tem uma amiga da empresária sofrendo intimidação diariamente.
“Não foi ele (Aldemir) diretamente quem ameaçou, foi um amigo dele que sempre está no nosso meio, se passando de amigo do marido falecido da Jamile. Esse homem até disse para a amiga da Jamile que o Aldemir disse que ia dar um jeito de estar presente na missa sem que nem a gente visse. Ninguém aqui vai fazer nada contra ele, o que nós queremos é Justiça. A Polícia e Deus, primeiramente, podem fazer Justiça”, contou a entrevistada, que não terá sua identidade revelada.
Por volta das 18h, logo após a celebração, o único filho da empresária, um adolescente de 14 anos, chegou ao local ao lado dos tios maternos e acompanhou o grupo em caminhada até o entorno da Avenida Beira-Mar, sob gritos de: “Justiça, Jamile... Covarde e foi feminicídio”.
Além da missa e da manifestação, o dia ontem também foi de depoimento de testemunhas do caso.
Versão
A reportagem apurou que uma enfermeira que atendeu a mulher no Instituto Doutor José Frota (IJF) afirmou aos policiais civis do 2º DP (Aldeota), ontem, que Jamile chegou ao hospital assustada. O termo de depoimento, obtido pelo Sistema Verdes Mares, revela que a enfermeira (identidade preservada) “disse que Jamile estava assustada, parecia que estava com muito medo de alguma coisa, e tinha um olhar vago”.
Entretanto, a testemunha, ao ver o tiro no peito da mulher, “perguntou se tinha sido um assalto, e a paciente respondeu: ‘não, fui eu’”. Jamile chegou ao IJF no início da madrugada de 30 de agosto deste ano e foi direto para a Sala de Reanimação, onde permaneceu por cerca de 20 minutos. Em entrevista concedida também ontem, a enfermeira revelou que a empresária estava acordada e consciente, durante esse tempo. Depois, a paciente precisou ser transferida para o Centro Cirúrgico.
A equipe de enfermagem separou a roupa e os outros pertences da mulher para devolver à família, que estava fora da sala. A testemunha conta que Aldemir estava nervoso, mas não chorava. O homem teria perguntado a uma enfermeira como a companheira estava e depois se ela tinha “chance de escapar”. Enquanto isso, o filho da paciente, também presente, chorava muito pelo pátio do hospital. Mais dois integrantes da equipe do hospital também prestaram depoimento, ontem.
Laudo
O laudo cadavérico da Perícia Forense do Ceará (Pefoce), obtido pelo Sistema Verdes Mares, reforça a interpretação do médico cirurgião do IJF, Jamil Zarur, que estranhou se tratar de um suicídio, ao passo que o projétil entrou no corpo da empresária de cima para baixo. “Colhido e enviado para setor de balística um (01) projetil de arma de fogo encontrado na região do hipocôndrio direito, denotando que o trajeto deste se deu de cima para baixo, ântero-posteriormente e da esquerda para direita”, detalha o perito.
O laudo foi concluído no dia 3 de setembro deste ano. O perito responsável pela análise concluiu que Jamile morreu por uma “hemorragia intra-abdominal por lesão hepática por projétil de arma de fogo”. A tentativa dos médicos do IJF de salvar a mulher prejudicou um detalhe da análise pericial, “não sendo possível determinar a distância do tiro pois o orifício foi modificado cirurgicamente”.
Na última terça-feira (17), o médico Jamil Zarur também prestou depoimento ao 2º DP e, em entrevista, informou que estranhou a trajetória da bala no corpo da mulher, não sendo comum em casos de suicídio. “Achei estranha a trajetória do projétil. Ela estava consciente, mas não falou nada”, pondera.
Já o médico plantonista Janio Cordeiro Barroso, primeiro a atender a empresária, ouviu uma confissão da mulher e revelou à Polícia. “O depoente botou a mão na cabeça dela e perguntou: ‘O que houve?’; ela respondeu: ‘Isso foi um tiro que eu mesma dei em mim’”, redigiu um policial civil, no termo de depoimento prestado pelo médico.
Investigação
Jamile foi baleada no peito, na sua residência, na noite de 29 de agosto deste ano, e chegou ao IJF como se tivesse tentado suicídio. Na manhã do dia 31, ela morreu. Porém, a investigação da Polícia Civil apontou para uma reviravolta: feminicídio cometido pelo companheiro da vítima.
Ao menos seis testemunhas prestaram depoimento no 2º DP, nos dois últimos dias. Entre elas, o filho de 14 anos da mulher, que também estava na residência com o casal no dia fatídico. Os depoimentos revelam um relacionamento abusivo, com histórico de agressões.
O advogado de Aldemir Pessoa, Giovanni Santos, afirmou que o ferimento no rosto que Jamile apresentava quando chegou ao IJF aconteceu quando no caminho para casa a mulher teria tentado abrir a porta do carro. Uma pessoa teria puxado a porta de volta e batido no rosto dela. Giovanni destacou que seu cliente não administra a fortuna da empresária e nem tem direito a nenhum bem dela. Os advogados também disseram que a empresária se trancou no closet, e o Aldemir chegou a arrombar a porta e se deparou com ela já com a arma na mão dizendo que ia se matar. “Ele tentou, mas, não conseguiu evitar que ela atirasse”, disse a defesa.