Empresário condenado por tráfico internacional é solto no Ceará mesmo com mandado de prisão
O empresário potiguar, condenado a 236 anos na Operação Cardume, foi solto na última quarta-feira (7) da CPPL 3, em Itaitinga, na Grande Fortaleza
Em uma falha do Sistema de Justiça do Ceará, George Gustavo da Silva foi recolocado em liberdade. O empresário potiguar, condenado a mais de 236 anos de prisão no bojo da Operação Cardume - por envolvimento com o tráfico internacional de drogas e com uma facção criminosa paulista - foi solto da Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor Jucá Neto (CPPL 3), em Itaitinga, na última quarta-feira (7), mesmo tendo outro mandado de prisão em vigor expedido contra ele.
A 1ª Vara de Execução Penal (VEP) de Fortaleza, da Justiça Estadual, que expediu o alvará de soltura, reconheceu, em decisão na última sexta (9), "que não fora percebido por este juízo a existência de mandado de prisão expedido pelo Juízo da 12ª Vara Federal de Fortaleza em 22/09/2020".
O magistrado, então, revogou a soltura e expediu, com urgência, mandado de prisão para a recaptura de George Gustavo. A Justiça informou o caso à Delegacia de Capturas e Polinter (Decap), da Polícia Civil do Ceará (PCCE); à Superintendência da Polícia Federal (PF) no Ceará; e à Interpol (Polícia Internacional). A defesa de George não foi localizada pela reportagem, para comentar o assunto.
O Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), em nota, lembrou que o apenado foi beneficiado com uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) e informou que a 1ª Vara de Execução Penal de Fortaleza permitiu a progressão para o regime aberto.
.Contudo, após o reexame do caso, constatou-se que havia um mandado de prisão expedido pela Justiça Federal contra ele.
A Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), responsável pela custódia do preso, confirmou a soltura por decisão da 1ª VEP de Fortaleza e esclereceu que "realizou pesquisa no Banco Nacional de Mandado de Prisão (BNMP) e que não existia nenhum impedimento para a execução do Alvará de Soltura expedido em favor do preso, o que ocasionou sua imediata progressão de regime". A SAP não quis comentar sobre a existência do outro mandado e como ele não apareceu no sistema.
Também questionada, a Justiça Federal no Ceará (JFCE) informou que expediu dois mandados de prisão contra George Gustavo, sendo um cumprido em 25 de setembro de 2019 e o outro em 5 de outubro de 2020. Depois disso, a gerência das ações penais ficaram por conta da Justiça Estadual.
Operação Cardume
Conforme a Operação Cardume, deflagrada pela Polícia Federal em 2015, George Gustavo era um dos líderes da maior quadrilha de tráfico internacional de drogas descoberta no Ceará, junto do também empresário Cícero de Brito. O processo originado pela investigação reuniu 28 réus.
Dentre os réus, 25 foram condenados a mais de 1.300 anos de prisão - se somadas as penas - por crimes como organização criminosa, tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e uso de documento falso, na 11ª Vara da Justiça Federal no Ceará.
George foi sentenciado a uma das maiores penas: 236 anos, 8 meses e 19 dias de prisão. Dois acusados tiveram as penas extintas porque foram mortos e um foi absolvido em primeira instância.
A quadrilha - que reunia membros de uma facção criminosa paulista e empresários do Ceará e do Rio Grande do Norte - trazia a droga dos países Bolívia e Paraguai, passava pelo Ceará e exportava o ilícito em garrafas de cachaça, para a Itália e Portugal, na Europa.
A PF identificou, dentro da organização criminosa, núcleos voltados especificamente para o tráfico internacional de drogas, contrabando de armas, desvio de insumos químicos e lavagem de dinheiro. Os investigadores estimam que, pelo menos, R$ 20 milhões tenham sido "lavados" por 32 empresas registradas no Ceará.
Outros acusados soltos
O outro empresário apontado como líder do esquema criminoso, Cícero de Brito, condenado a 197 anos de prisão, foi solto em 2017, quando foi beneficiado por liminar deferida pelo ministro do STF Marco Aurélio. A decisão liminar foi cassada na análise do mérito do pedido de habeas corpus e, desde então, o empresário está foragido.
Procurada, a defesa de Cícero, representada pelo advogado Hélio Nogueira Bernardino, criticou a Operação Cardume, a qual teria sido baseada em ilegalidades, "algumas delas indicadas na própria sentença em que reconheceu e invalidou a delação premiada". E acrescentou que o cliente "foi alvejado por fatos inverídicos anterior a investigação policial, e ainda sofreu perseguição de ser condenado unicamente por fato julgado na esfera estadual há anos".
A defesa de Cícero reclama ainda da demora dos julgamentos dos recursos do processo. "Existe excesso de prazo gritante que necessita de reconhecimento das autoridades envolvidas no caso", afirma.
"Cícero de Brito, como grito de socorro, almeja tão somente uma oportunidade de responder ao processo em liberdade. Durante todo esse tempo solto, nunca houve nenhum envolvimento em crime de nenhuma natureza".
Já Paulo Diego da Silva Araújo, o 'Dino' ou 'Universitário', também condenado na Operação Cardume e apontado pela Polícia como um chefe de uma facção criminosa paulista, foi solto em 2018, por outra liminar em habeas corpus, deferida pelo STF. Apesar da cassação da liminar, ele segue foragido e, segundo a Polícia Civil do Ceará, voltou a cometer crimes, o que o fez entrar para o Programa de Recompensas da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS).