O Dia do Índio e a vitória dos Tremembé

Escrito por Babi Fonteles | Acrísio Sena ,
Babi Fonteles é músico, antropólogo e professor da Universidade Federal do Ceará
Legenda: Babi Fonteles é músico, antropólogo e professor da Universidade Federal do Ceará

Neste Dia do Índio temos sim o que comemorar. Embora os povos indígenas no Brasil estejam atravessando uma conjuntura desfavorável, de ameaças aos seus direitos consagrados na Constituição Federal de 1988, por parte do (des)governo federal atual, o Povo Tremembé obteve uma conquista que se tornou um marco histórico na sua luta por autonomia e respeito à sua perspectiva de educação diferenciada.

Trata-se de uma mudança na legislação que rege os processos seletivos para professores temporários no Estado: Lei Complementar nº 22, de 24/07/2000, em voga, portanto, há mais de 20 anos!, uma lei genérica, que não respeitava os modos próprios de escolha de docentes para as escolas indígenas. Contrapondo-se aos Editais nº 002 e 004/2021, de “Seleção Pública para Composição de Banco de Recursos Humanos”, de responsabilidade das CREDEs 2 e 3 / SEDUC, os Tremembé de Acaraú, Itarema e Itapipoca construíram um edital próprio, fundamentado em seus direitos específicos e processos culturais tradicionais, os quais, para serem efetivados, interpuseram uma mudança no Art. 8º da referida lei, o qual passou a determinar que a seleção de professores para as escolas indígenas “observará as perspectivas e as especificidades da educação escolar indígena, inclusive pedagógicas, bem como o princípio da autodeterminação dos povos, no que se diz respeito à identidade sociocultural das etnias, de modo a ensejar a efetiva participação e contribuição dos povos indígenas no planejamento e na condução do processo seletivo”.

Esta significativa conquista, fruto de uma luta dos Tremembé com o apoio de alguns parceiros, beneficiará, ora em diante, todos os povos indígenas desta terra. Constitui-se também como marco a inspirar e balizar a “lição de casa” que o Ceará ainda precisa fazer para que a educação diferenciada indígena supere as carências atuais e seja tratada com a mesma atenção e dignidade com que o Estado vem tratando outras modalidades e níveis de educação pública e que fazem do nosso Estado uma referência no Brasil e no mundo.

Já imaginaram, quando o Ceará constituir um sistema de educação diferenciada indígena específico, com legislação, financiamento e gestão própria, a cargo dos indígenas? Aí, sim, teremos mais razões para comemorarmos o Dia do Índio e celebrarmos nossos feitos na educação pública no Estado. Os Tremembé de Almofala, em particular, têm mostrado que, mais do que um sonho, isso é possível. E urgente.


Babi Fonteles é músico, antropólogo e professor da Universidade Federal do Ceará.

Acrísio Sena é deputado estadual e vice-presidente da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Ceará