Após Brumadinho, seis empresas se recusam a auditar barragens da Vale
A situação dificulta o encaminhamento à ANM e à Secretaria de Meio Ambiente de MG dos projetos de descaracterização de oito barragens da mineradora
Pelo menos seis empresas recusaram convites da Vale para auditar as oito barragens em estado de alerta em Minas. A situação revela a dificuldade da empresa para encaminhar à Agência Nacional de Mineração (ANM) e à Secretaria de Meio Ambiente do Estado os projetos de descaracterização dessas estruturas. Esses planos detalhariam como ocorrerá o processamento dos rejeitos e a destinação para outros fins das áreas que ocupam. O risco mantém fora de casa 943 pessoas em cinco municípios.
A informação consta de documento em que o Ministério Público de Minas (MP-MG) pede à Justiça que determine à mineradora que apresente plano de ação à ANM e à secretaria. A Vale quer mais prazo e isenção das multas. A maior parte das companhias citadas no documento não opera no Brasil. A reportagem tentou contato com todas. Nem mesmo a WorleyParsons, única que ainda manteria conversas com a Vale, confirmou a contratação.
Procurada, a mineradora também não confirmou nem a contratação nem a apresentação dos planos. A empresa também não apresentou, até agora, nenhum relatório dos três comitês de assessoramento técnico criados após a tragédia de Brumadinho. Seu custo é estimado no orçamento de 2019 em R$ 15 milhões. A mineradora informou que entregou "pedido de descaracterização" das barragens à ANM e Semad em 22 de março. Mas não esclareceu se apresentou os planos.
Projetos
Cada plano (um por barragem) deve conter o detalhamento técnico do projeto, investimentos e medidas de reparação para os atingidos. Os detalhes permitirão saber se os R$ 5 bilhões previstos para a descaracterização cobrirão os custos. Além dos riscos para fornecedoras, arrolados nas investigações criminais da tragédia de Brumadinho, que deixou mais de 300 mortos e desaparecidos, há uma forte pressão para que a empresa faça a descaracterização com aproveitamento econômico dos depósitos. Esse rejeitos ainda contêm minério aproveitável.
"A Vale já tinha anunciado a descaracterização antes de Fundão (barragem que se rompeu em Mariana em 2015). Em 2013, já se observava movimento de retirada para o Pará, mas o que vai determinar é o fator econômico", afirma Thiago Alves, integrante da coordenação estadual do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
Para o setor de mineração, o aproveitamento econômico representa uma sobrevida para a atividade mineral nos municípios e para muitos fornecedores. Do ponto de vista do Estado é mais interessante, mas tende a custar mais caro para a empresa e demorar mais. "Precisamos analisar as exigências de engenharia, meio ambiente e sociais para chegarmos a uma solução factível. Não podemos paralisar as barragens e o Estado de Minas", disse o presidente da Academia Nacional de Engenharia, Francis Bogossian.
As dez barragens nessa situação de incerteza são: Laranjeiras, Menezes II, Capitão do Mato, Dique B, Taquaras, Forquilha I, II e II, Barragem I e Barragem IV. As duas últimas estão no centro da tragédia de Brumadinho. As outras oito são estruturas semelhantes às de Brumadinho e Fundão.
Todas essas estruturas já tiveram as zonas de autossalvamento esvaziadas, justamente porque a empresa não consegue renovar os laudos de avaliação. Todas constam da lista de estruturas que apresentavam fatores de segurança abaixo dos limites estabelecidos. A informação está em documentos da própria Vale anexados à ação civil pública movida pela força-tarefa formada para apurar as causas do rompimento em Brumadinho.