Na véspera da inauguração, delegacia para grupos vulneráveis é impedida de funcionar; entenda o caso

Fonte da Polícia Civil do Ceará fala em demanda reprimida. A SSPDS nega "prejuízo na investigação"

Escrito por Emanoela Campelo de Melo , emanoela.campelo@svm.com.br
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Legenda: O prédio localizado no bairro Papicu, em Fortaleza, foi pensado para suprimir demanda de crimes que têm como vítimas grupos vulneráveis.
Foto: Divulgação

Há quase dois meses, a Delegacia de Repressão aos crimes de Discriminação racial, religiosa ou Orientação sexual ou identidade de gênero, está pronta, mas impedida de abrir as portas para atendimento à população. Estrutura e efetivo capacitado não são suficientes, enquanto a abertura não for autorizada, em pauta de votação na Assembleia Legislativa do Ceará.

O prédio localizado no bairro Papicu, em Fortaleza, foi pensado para suprimir demanda de crimes que têm como vítimas grupos vulneráveis. A reportagem conversou com fonte da Polícia Civil do Ceará que se diz frustrada. A fonte, que terá sua identidade preservada, fala no prejuízo ao público, por o estabelecimento estar fechado.

"Quem fica no prejuízo é a sociedade, é a Segurança Pública. Há muita demanda, muitos casos de homofobia, por exemplo. Enquanto essa delegacia está fechada, esses casos vão parar em distritos, que já estão abarrotados. Se tem equipamento pensado para isso, não faz sentido estar em delegacias distritais", disse.

Em resposta, o Setor Legislativo da Assembleia diz buscar um "entendimento interno antes de levar a matéria à pauta".

A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) diz "que não há prejuízo na investigação dos crimes previstos com base no tipificado na Lei 7.716, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor". 

A Pasta afirma que as denúncias de casos neste perfil são apuradas pelos investigadores das unidades distritais da Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE) "com o apoio do Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis (DPGV)".

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PENDÊNCIA DE VOTAÇÃO

A abertura da delegacia especializada estava em pauta para votação na Assembleia, no último mês de julho. Prestes de ser votada, a deputada estadual dra Silvana (PL) discursou contra a inauguração. A reportagem teve acesso a trechos da fala da deputada, veja a seguir:

“É melhor levar a Segurança Pública a sério e não politizar. Não sei se estão sabendo, mas agora querem criar uma delegacia de crimes religiosos sexuais. O Evangelho do Senhor Jesus não precisa de delegacia. Na nossa Igreja já temos o justo, o juiz que resolve todas as nossas causas. Jesus resolve tudo pra nós”
Deputada Dra Silvana

A fonte da Polícia disse que autoridades chegaram a tentar um diálogo na Assembleia, a fim de explicar a importância do equipamento: "a delegacia está dentro do espaço do Centro Thina Rodrigues. Foi pensada para atender casos de racismo religioso, racismo étnico, segmento LGBTQIA+ e combater a intolerância religiosa. São dois delegados, dois escrivães e seis inspetores. Nossa preocupação é com a população que perde sem esse equipamento".

REGISTRO VIRTUAL

A SSPDS recorda que em 2021, os registros de ocorrência de racismo passaram a ser realizados também de forma virtual, possibilitando o registro de ocorrências sem sair de casa. "Os Boletins Eletrônicos de Ocorrência (BOE) podem ser registrados na Delegacia Eletrônica (Deletron), no site www.delegaciaeletronica.ce.gov.br, em qualquer horário do dia ou da noite", dizem.

A Deletron atende todo o Estado do Ceará. Após o registro, o Boletim é levado para aprovação e a ocorrência transferida para a delegacia responsável, que iniciará as investigações. 

A Polícia destaca que as penas previstas em caso de crimes contra raça, etnia, religião e procedência nacional podem chegar até cinco anos de reclusão.

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